18/11/2013

"Recall" e os Direitos do Consumidor


         Primeiramente, é importante destacar a responsabilidade do cultor do Direito perante a sociedade no que se refere ao caráter informador referente a determinados institutos jurídicos, inclusive pouco conhecidos.

         Adentrando diretamente sobre o tema, anúncios publicitários informando sobre o “recall” de diversos produtos são mais que comuns. Porém, surge uma indagação, afinal, o que é “recall”?
        
         “Recall” provém da língua inglesa, no qual tem diversos significados para a língua portuguesa, como recordar, lembrar, relembrar, rememorar, cancelar, etc. Quaisquer empregos destas palavras teriam o mesmo significado, quando estamos apontando para o instituto no Código de Defesa do Consumidor. Aliás, o “recall” é muito comum em países de Primeiro Mundo.

         No Código de Defesa do Consumidor (Lei n. 8.078/90), o “recall” encontra-se previsto no artigo 10, § 1, “in verbis”

“Art. 10 - O fornecedor não poderá colocar no mercado de consumo produto ou serviço que sabe ou deveria saber apresentar alto grau de nocividade ou periculosidade à saúde ou segurança”

“§ 1º - O fornecedor de produtos e serviços que, posteriormente à sua introdução no mercado de consumo, tiver conhecimento da periculosidade que apresentem, deverá comunicar o fato imediatamente às autoridades competentes e aos consumidores, mediante anúncios publicitários”.

         Nesta senda, o fornecedor de produtos e serviços, quando colocados a circulação de mercado determinado produto ou serviço e tomando conhecimento da periculosidade apresentada deverá comunicar a todos, portanto, as autoridades competentes como também seus consumidores por meio de anúncios publicitários.

         Cumpre mencionar que, por meio deste instrumento, a norma protecionista pretende que o fornecedor impeça ou procure impedir, ainda que tardiamente, que o consumidor sofra algum dano ou perda em função de vício que o produto ou serviço tenham apresentado após sua comercialização. P. ex. um amortecedor que saiu da montadora, apresentou problemas de funcionamento e por ter origem do mesmo lote advindo do seu fabricante, tem maiores probabilidades de repetir o problema nos automóveis já colocados no mercado, daí que os veículos já vendidos deverão ser “chamados de volta”.

         Ainda, a divulgação em anúncio publicitário deve ser ampla e geral, ou seja, capaz de atingir a população num todo, utilizando-se em quaisquer meios eficazes, aplicando-se ao princípio da publicidade ao consumidor.
        
         Apesar do fornecedor de produtos e serviços retirar de circulação, surge uma dúvida: E mesmo agindo desta forma conforme a lei exime-se de responsabilização? A resposta é negativa. Eis os argumentos.

         A responsabilidade do fornecedor dos serviços ou dos produtos é objetiva, pois o Código de Defesa do Consumidor prescreve neste sentido:

“Art. 12. O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos”

Conforme o artigo acima, todos aqueles elencados respondem, quanto sua responsabilidade, independente de culpa, devendo reparar eventuais danos causados aos seus consumidores. No caso do “recall”, fora constatado um defeito de fabricação em que o fornecedor de produtos e ou serviços retira de circulação para evitar prejuízos, ainda que saiba, segundo a lei, possa responsabilizar-se de eventuais prejuízos durante o tempo em que estiver em circulação.

Neste sentido, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul deu seguimento a Primeira Instância no  Recurso Cível n. 71003384989: 

“RESPONSABILIDADE CIVIL. INDENIZAÇÃO. DANOS MATERIAIS E MORAIS. ACIDENTE COM MOTOCICLETA. POSTERIOR RECALL. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. FATO DO PRODUTO. DEVER DE REPARAR OS DANOS MATERIAIS E MORAIS.
1. Complexidade da causa inocorrente. Inexiste qualquer complexidade na causa a ensejar a incompetência do JEC para o julgamento da lide. Não é necessária a realização de prova pericial, no caso concreto, haja vista que o conjunto probatório acostado ao feito, especialmente o comunicado de “recall” para substituição do corpo do acelerador, leva à conclusão de que o defeito implicou no acidente ocorrido com o autor.
2. Tendo o autor sofrido acidente com a moto alguns meses após a compra, em decorrência de queda por não responder a motocicleta aos comandos de aceleração, e tendo recebido comunicado da fabricante, após o acidente, sobre a identificação de problema consistente no “retorno lento do acelerador, podendo levar à perda de controle da motocicleta com eventual queda”, evidenciada está a causa do acidente.
3. Trata-se de responsabilidade pelo fato do produto, que é objetiva, conforme previsão do art. 12 do CDC. Desse modo, demonstrados os danos decorrentes de defeito na motocicleta, que ocasionaram o acidente sofrido pelo autor, evidenciado o dever de indenizar os prejuízos sofridos.
4. No que se refere aos danos materiais, demonstrados os prejuízos decorrentes dos danos na motocicleta, cujo menor orçamento alcança o valor de R$ 2.685,00, despesas médicas no valor de R$ 366,00 e utilização de serviços de terceiro para atividade profissional por três meses, no valor de R$ 2.700,00, totalizando R$ 5.751,75.
5. No que tange aos danos morais, evidenciado o sofrimento do autor, em decorrência da violação à sua integridade física. Quantum indenizatório fixado em R$ 3.000,00, que não comporta minoração.
Sentença mantida pelos próprios fundamentos.
RECURSO DESPROVIDO”


         Por certo, a indenização por danos materiais, assim como os danos morais devem ser avaliados caso a caso, sendo neste último caso poderia aplicar o princípio do dever de confiança, já que consumidor optou por contratar ou comprar determinado produto não somente pelo preço como também pela notoriedade demonstrada.

04/11/2013

AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO TRIBUTÁRIO: ASPECTOS RELEVANTES

Conceito

Indébito provém do latim indebitu, que significa aquilo que não é devido, segundo o Dicionário Aurélio. Tal significado, para a seara tributária decorre materialmente uma situação em que congrega dois elementos: a) pagamento: promovido pelo contribuinte ou seu responsável tributário com documentos que o atestem; b) indevido: se reveste na procedência e acolhimento das alegações produzidas pelo contribuinte nos autos da ação de quaisquer espécies na relação jurídica tributária que implicou o recolhimento do tributo.

Natureza Jurídica

Ação de repetição de indébito tributário, de rito ordinário (CPC), fundamenta-se no art. 165, do Código Tributário Nacional, in verbis:

O sujeito passivo tem direito, independentemente de prévio protesto, à restituição total ou parcial do tributo, seja qual for a modalidade de seu pagamento, ressalvado o disposto no § 4° do art. 162, no seguintes casos:
           
 I – cobrança ou pagamento espontâneo de tributo ou maior que o devido em fase da legislação tributária aplicável, ou da natureza ou circunstâncias materiais do fato gerador efetivamente ocorrido;

II- erro na edificação (identificação) do sujeito passivo, na determinação da alínea aplicável, no calculo do montante do débito ou na elaboração ou conferência de qualquer documento relativo ao pagamento;
           
III – reforma anulação revogação ou rescisão da decisão condenatória.”

Momento para ação

O momento para o surgimento da repetição de indébito deve ser observado por uma condicionante factual antecedente na via material, ou seja, de ter havido o fato do pagamento por parte do sujeito passivo, seja na forma da cobrança administrativa ou judicial, assim, o sujeito passivo deve ter recolhido o tributo de forma indevida par aque nasça o direito de repetir tais valores pagos.

O instrumento material (norma primária) é o recolhimento do tributo pelo sujeito passivo da relação jurídica tributaria, porém, por alegações produzidas pelo sujeito passivo, nasce a relação jurídica processual aplicando de instrumento processual (norma secundária) para que a tutela (administrativa ou judicial) retorne ao sujeito passivo com uma resposta, se possível a restituição do indevido ou não, tudo a depender do caso concreto.

Cumpre assinalar que os fundamentos de validade podem ser materiais ou processuais. Os fundamentos de validade materiais estão comportados por vícios (inconstitucionalidade, ilegalidade) pelo pagamento:

a)      Espontâneo de tributo indevido: por exemplo, o contribuinte recolhe, após ter recebido o carnê, mas sem prévia cobrança da administração, de forma espontânea por esta, o IPTU no valor de R$ 6.000,00. Entretanto, este tributo foi instituído via decreto do Prefeito municipal, configurando por indevido, já que há ofensa ao princípio da legalidade;

b)      Espontâneo de tributo a maior: por exemplo, o contribuinte recolhe o IPTU pelo mesmo valor de R$ 8.000,00, mas na verdade seria R$ 2.000,00 a menos do que deveria ter sido pago, sem prévia cobrança da administração, de forma espontânea. Neste caso não há qualquer vício na lei (ilegalidade ou inconstitucionalidade) apenas o tributo foi pago pelo contribuinte ou responsável tributário a maior do que era devido;

c)      Cobrança de tributo indevido: por exemplo, o contribuinte ou responsável tributário recolhe o tributo e após ter recebido a notificação de cobrança e inscrição em dívida ativa caso não pagasse. Conforme este prospecto fático, o tributo foi instituído por decreto ofendendo o princípio da legalidade;

d)     Cobrança de tributo maior do que devido: por exemplo, o contribuinte ou responsável tributário, após ter recebido notificação de cobrança e inscrição em divida ativa caso não pagasse o valor a maior do que devido. Não há nenhuma ilegalidade ou inconstitucionalidade nisso, apenas uma situação em que o sujeito passivo do tributo recolhe além do valor estabelecido e exigido pelo Fisco.

Em qualquer destes casos expostos, configuram os fundamentos de validade materiais, pois há o fato do pagamento indevido, haja vista que deve provar o autor da ação de repetição de indébito para que este obtenha êxito na sua devolução. Pode-se afirmar ainda como pressupostos fáticos, ou seja, elementos delineadores da norma individual e concreta promovida pelo caso concreto, desde que provado como dito.

Além disso, na seara processualística, existem pressupostos consubstanciados na existência jurídica, a saber:

a)      Petição inicial: instrumento da demanda em que o autor exerce o direito de ação e invoca a prestação da tutela jurisdicional, conforme o artigo 262, do Código de Processo Civil. Cumpre-se observar que, nem pela petição inicial se pode afirmar quanto a sua validade. Damos como exemplo, na petição inicial que não preencher os requisitos exigidos pela lei para que o processo possa validamente dar o “ponta pé inicial”, caso contrário a petição será inepta (art.295, parágrafo único do CPC);

b)      Jurisdição: o autor deve formular o seu pedido a um órgão investido de seus poderes inerentes a sua função estatal.

c)      Citação: Sem uma citação não haverá validade para esta ação, eis que o Fisco como parte ré, deve manifestar-se a respeito, em consonância do princípio do contraditório e a ampla defesa;

d)     Capacidade postulatória: é aptidão de praticar atos técnicos dentro do processo.

Há também, os pressupostos processuais de validade em que se resume por desenvolvimento válido e regular do processo, por:

a) petição inicial apta, como vinculação com os pressupostos de existência, servindo de canal condutor do pedido de tutela estatal em que a norma prevê;

b) Órgão jurisdicional competente e juiz imparcial, insere-se os mesmo moldes quando tratado sobre os pressupostos existenciais, porém, a aptidão está atrelada a lei processual (norma secundária) decorrente as regras de organização judiciária, para que o órfão do Poder Judiciário exerça a jurisdição (dizer o Direito) em determinado caso in concreto, assim como imparcialidade do julgador, não podendo desequilibrar totalmente a ‘balança da justiça’ sem um motivo justo e claro;

c) capacidade de agir, é o que o sujeito passivo material tem perante a justiça tributária assumindo direitos e obrigações;

d) capacidade processual, estar em juízo fazendo valer o seu direito material amparado pela norma e, sobretudo na solução ao caso concreto. Podemos observar ainda, os pressupostos processuais negativos, como a litispendência (existência de dois ou mais processos concomitantes, com as mesmas partes, pedido e causa de pedir, como prevê o art. 301, inciso V, §§ 1° e 2°, do CPC); coisa julgada (fenômeno processual que torna firme e imutável a pare decisória da sentença).

Cumpre assinalar que, o pedido de repetição do indébito tributário alternativo com pedido de compensação é caso de cumulação de ações, pois esta questão deve estar explicita no pedido do autor para que tenha efetividade da tutela jurisdicional e, de modo uma compensação concorrente pode ser prejudicial ao contribuinte, pois podem ocorrer gravames ainda maiores quando aos créditos a compensar. Nesta posição, advém um efeito importante das relações jurídico tributárias como forma de extinção do credito tributário. Mas, para que o sujeito passivo possa valer-se deste instituto, expõe o mestre Paulo de Barros Carvalho (2009 – p.463), quanto à existência de quatro elementos , são eles:

1)      Reciprocidade das obrigações;
2)      Liquidez das dívidas;
3)      Exigibilidade das prestações;
4)      Fungibilidade das coisas devidas (art. 369, CC)

Em nosso sistema jurídico tributário, não podemos nos olvidar, quanto a existência do deste instituto que encontram-se nos artigos 170 e 170A, do Código Tributário Nacional, in verbis:

“A lei pode, nas condições e sob as garantias que estipular, ou cuja estipulação em cada caso atribuir à autoridade administrativa, autorizar a compensação de créditos tributários com créditos líquidos e certos, vencidos ou vincendos, do sujeito passivo contra a Fazenda pública”. (Vide Decreto nº 7.212, de 2010)

Parágrafo único. Sendo vincendo o crédito do sujeito passivo, a lei determinará, para os efeitos deste artigo, a apuração do seu montante, não podendo, porém, cominar redução maior que a correspondente ao juro de 1% (um por cento) ao mês pelo tempo a decorrer entre a data da compensação e a do vencimento.

Art. 170-A. É vedada a compensação mediante o aproveitamento de tributo, objeto de contestação judicial pelo sujeito passivo, antes do trânsito em julgado da respectiva decisão judicial”
A grande novidade legislativa é o artigo 170-A, exposto acima. Este artigo cria um critério proibitivo de compensação por aproveitamento de tributo, objeto de contestação judicial pelo sujeito passivo (contribuinte ou responsável tributário), mesmo que antes de sentença transitada em julgado da decisão, portanto, para que seja compensado o tributo deverá passar pelo estágio posterior com sentença transitada em julgado para que surta seus efeitos jurídicos prospectivos.

Contagem do prazo nos tributos sujeitos a lançamento por homologação

Trata-se de uma questão importante, diante deste cenário quando o assunto é tributos sujeitos ao lançamento por homologação e, principalmente, a data em que se considera a extinção de tais créditos. Conforme artigo 150, § 4°, 156, VII, do CTN, a extinção do crédito tributário inicia-se com a homologação, seja expressa ou tácita, pela autoridade administrativa.

Ocorre que muitas vezes que esta homologação da autoridade administrativa de forma tácita, gerando prazo de cinco anos após a ocorrência do critério material, sem manifestação por parte do fisco. Para preencher este vácuo, de quando se inicia o prazo prescricional pelo lançamento tributário por homologação que, a doutrina e a jurisprudência criou a tese dos 10 (dez) anos para a restituição do pagamento indevido, portanto, em vez de iniciarmos a contagem da data do pagamento indevido conta-se o inicio do prazo da efetiva homologação.

Esta tese dos 10 (dez) anos, de forma pragmática, foi acolhida pelo STJ, que poderia ser pleiteada a devolução do pagamento dos tributos cujo critério material ocorreram nos dez anos anteriores à propositura da ação. Entretanto, com a LC n. 118/ 2005, que considerou como regra prescricional, a data da extinção do crédito tributário no lançamentos por homologação e a antecipação do pagamento, vejamos o art.3°, da referida Lei Complementar, in verbis:

“Para efeito de interpretação do inciso I do art. 168, da Lei n. 5.172, de 25 de outubro de 1966 – CTN, a extinção do crédito tributário ocorre, no caso de tributo sujeito a lançamento por homologação, no momento do pagamento antecipado de que trata o § 1° do art. 150 da referida lei”

Após este dispositivo legal exposto acima vigorar, decaiu por ‘terra’ a tese dos dez anos, eis que o prazo para a propositura da ação de repetição de contar-se-á a partir do pagamento antecipado e não mais da homologação, passando, assim, a contar como data limite para as ações de repetição de indébito para tal critério material ao prazo de cinco.


Validade, vigência, eficácia técnica, eficácia jurídica e eficácia social: apontamentos estruturantes da Ciência do Direito





Delinear conceitos para distingui-los é uma tarefa complexa. Por mais que façamos um estudo avançado à imprevisibilidade da Ciência do Direito ostenta caldos mais esparsos do que usual devido o percentual dogmático.

Para tanto, cumpre nos apresentar os ensinamentos de Rafael Bielsa[1]:

“Todo exame do vocabulário jurídico que contribua a aclaração e a depuração dos conceitos de estimar-se como útil em algum grau. Se há uma disciplina no qual convém a empregar a palavra adequada ou própria, ela é o Direito. Tanto em ordem legislativa como judicial – e no digamos o administrativo – esta precaução é indispensável eis que só seja para evitar controvérsias ou discussões que surgem precisamente da confusão e da dúvida sobre um termo”

Tendo como norte seu espírito cientifico, apontaremos as lições de renomados doutrinadores sobre os institutos validade, vigência, eficácia (técnica, jurídica e social), tecendo nossas considerações.

Partiremos ab inicio aos ensinamentos do mestre Paulo de Barros Carvalho (Direito Tributário – Fundamentos Jurídicos de Incidência, 9° ed. Saraiva 2012): “O sistema é formado por um conjunto de normas válidas”. Logo, as Normas Jurídicas, localizada dentro do sistema ‘S’ são proposições prescritivas que tem valência própria, ou seja, se são válidas ou inválidas. Neste ponto, se uma norma é válida significa que mantém pertinência com o sistema ‘S’, além disso, foi lhe posta por um órgão legitimado a produzi-lo.

Nas devidas proporções, a validade tem seu vinculo estabelecido entre a proposição normativa e o sistema ‘s’, portanto, sua existência implica reconhecer sua a pertinência de sua validade em face de determinado sistema jurídico.

Preconizo com que expôs Hans Kelsen[2], quando tratado sobre a validade, afirmando:
           
Não há qualquer conduta humana que, como tal, por força de seu conteúdo contrariar o de outra norma que não pertença à ordem jurídica cuja norma fundamental é o fundamento de validade da norma em questão”

Ainda, Paulo de Barros Carvalho[3] leciona neste sentido:

“A ponência de normas num dado sistema serve para introduzir novas regras de conduta para os cidadãos, como também modificar as que existem ou até para expulsar outras normas, cassando-lhes a juridicidade. Uma regra, enquanto não ab-rogada por outra, continua pertencente ao sistema e, como tal reveste-se de validade”

Atentando-se na complementação do presente estudo, Tárek Moysés Moussallem[4] afirma a existência de um conteúdo preenchedor do functor relacional de pertinência, sendo analisado sob três prismas lingüísticos. O sintático, que compõe frástica de acordo com as regras do idioma, juntamente com a relação de subordinação, coordenação e derivação entre normas jurídicas. O semântico pode ser resumido na seguinte forma em dois aspectos, segundo o autor: a) a linguagem do direito positivo deve operar sobre a linguagem dos fatos e das condutas possíveis; b) relação de subordinação material, inerente ao seu conteúdo entre duas normas, mas contraposta a subordinação formal, sendo esta referente à competência e procedimento. A pragmática tem contornos à teoria do discurso e dos atos de fala no direito. 

A questão vigência transporta o entendimento próprio do regramento jurídico em propagar seus efeitos, que ocorram no mundo fático, os eventos descritivos. Para que a norma esteja apta para qualificar fatos e determinar efeitos adere-se uma limitação espacial e temporal. Salienta-se que, Tércio Sampaio Ferraz Junior faz uma distinção marcante entre vigência e vigor. Segundo este autor, vigência é o intervalo de tempo em que a norma atua, podendo ser invocada para produzir efeitos; vigor é a força vinculante que a norma tem ou mantém mesmo não sendo vigente. Discordamos do primeiro posicionamento (vigência), pois está atrelada a pertinência do sistema ‘S’ e também por um órgão legitimado. Quanto ao segundo posicionamento do autor, concordamos para tanto, já que se emprega o valor semântico. No mesmo sentido, Tárek Moysés Moussallem explica que “mesmo após ter perdido sua vigência (para o futuro), mantém seu vigor (para o passado) sobre fatos ocorridos sob sua égide”

A eficácia pode ter diversas acepções, como proveniente da possibilidade de produzir efeitos; a própria produção de efeitos; sua incidência; observância por seus destinatários, com bem expõe Tárek Moysés Moussallem. Nas devidas proporções, acordo com este autor, assim com Paulo de Barros Carvalho, e citando Tércio Sampaio Ferraz Junior, há três conceitos básicos de eficácia: técnica, jurídica e social.

Eficácia técnica resumi-se na qualidade que a norma ostenta para descrever fatos que, ocorridos, tenham  a aptidão de irradiar efeitos, já removidos os obstáculos materiais ou as impossibilidades sintáticas.
Eficácia jurídica é característica dos fatos jurídicos de desencadearem as conseqüências que o ordenamento prevê.

Eficácia social é a produção concreta dos resultados na ordem dos fatos sociais.






[1]  Rafael Bielsa, Los Conceptos Jurídicos y su Terminologia, 3° ed., Buenos Aires, Depalma, 1987, p. 9.
[2] Teoria Pura do Direito, p.221
[3] V. Direito Tributário, linguagem e método, 5° ed., Noeses, 2013, p. 451.
[4] V. Revogação em matéria tributária, 2° ed.,Noeses 2011, p.147.

28/10/2013

Estudos sobre o Imposto sobre Produtos Industrializados - IPI

 Antes de iniciarmos ao estudo em tela, deveremos primeiramente expor ao atributo previsto constitucional da competência do IPI, no artigo 153, IV, da Carta Magna de 1988, que logo diz: “produtos industrializados”, ao passo que, faz a força motriz quanto ao alcance deste tributo, como:

a) onera a industrialização de produtos;
b) grava a importação de produtos industrializados;
c) colhe a arrematação de produtos industrializados levados a leilão, por terem sido apreendidos ou abandonados (ou qualquer motivo).

A regra-matriz de incidência tributária do IPI comporta em três vertentes, que assim pode-se resumir em: “produtos industrializados”, “produtos industrializados do exterior” e “nos casos de arrematação de produtos industrializados levados a leilão por terem sido apreendidos”. Faremos uma breve construção de cada uma delas, conforme abaixo:

PRODUTOS INDUSTRIALIZADOS

Hipótese

Critério material:      industrializar       produto
                                   (verbo)      + (complemento)

Critério espacial: em qualquer lugar do território nacional

Critério temporal: a partir da saída do produto do estabelecimento industrial

Critério de conseqüência

Critério pessoal:
a) sujeito ativo: União

b) sujeito passivo: titular do estabelecimento industrial ou que lhe seja equiparado;

Critério quantitativo:
a)      base de calculo: é o preço da operação na saída do produto
b)      alíquota: percentagem constante da tabela

PRODUTOS INDUSTRIALIZADOS DO EXTERIOR

Hipótese

Critério material:      industrializar       produto do exterior
                                   (verbo)      + (complemento)

Critério espacial: em repartições alfandegárias do país

Critério temporal: no momento do desembaraço aduaneiro

Critério de conseqüência

Critério pessoal:
a) sujeito ativo: União

b) sujeito passivo: importador

Critério quantitativo:
c)      Base de calculo: é o valor que servir de base de calculo dos tributos aduaneiros, acrescidos do montante e dos encargos cambiais devidos pelo importador;
d)     Alíquota: percentagem constante na tabela e correspondente ao produto importado

ARREMATAÇÃO DE PRODUTOS INDUSTRIALIZADOS LEVADOS A LEILÃO POR TEREM SIDO APREENDIDOS OU ABANDONADOS

Hipótese

Critério material: arrematar em leilão, produto industrializado apreendido ou abandonado
                                   (verbo)      + (complemento)

Critério espacial: em quaisquer repartições alfandegárias ou outro lugar em que realizam leilões de produtos industrializados apreendidos ou abandonados

Critério temporal: no momento da arrematação, documentado em nota de venda do leiloeiro oficial

Critério de conseqüência

Critério pessoal:
a) sujeito ativo: União

b) sujeito passivo: arrematante

Critério quantitativo:
e)      base de calculo: é o preço do valor arrematado
f)       alíquota: percentagem fixada em lei.

Natureza Jurídica

Em Terra Brasilis, a relação jurídica gérmen do direito ao crédito do IPI deve-se por a alusão ao princípio da não-cumulatividade pelo sistema de creditamento. Subsume com a aquisição do insumo tributado, portanto, o industrial se credita pelo montante, deduzindo-o, a posteori, do que vier dever quando da saída dos seus próprios produtos industrializados. Assim, o creditamento independe do efetivo pagamento do montante devido na operação anterior, basta o industrial adquirente creditar o valor do IPI destacado na nota (v. Isenções tributárias do IPI em face do princípio da não-cumulatividade, escrito pelo Professor Paulo de Barros Carvalho. Revista Dialética de Direito Tributário n° 33, junho/98).

O significado “cobrado” previsto na Constituição Federal, tem sua acepção jurídica num todo, tanto porque o artigo153, § 3º, II, da Carta Magna, é norma autoaplicável, como afirmou em recente voto proferido do então aposentado Ministro César Peluso no RE 475.551/PR, explicando que a não-cumulatividade é “compensado o que for devido em cada operação com o montante cobrado nas (operações) anteriores”. Portanto, comporta-se como técnica, das mais interessantes possíveis em nosso direito tributário atual, visto que o escopo principal é evitar que haja incidência sucessiva nas diversas operações na cadeia econômica, criando, nesta circulação um ônus elevado, decorrente da múltipla tributação na mesma base econômica.

Sobre o aproveitamento de crédito do IPI: pontos relevantes

O aproveitamento de crédito de IPI decorrentes da aquisição de insumos com alíquota zero, NT ou imunes é descabido. Eis os motivos.
                                     
Primeiro, quando da entrada de produto não onerado pelo IPI nas situações acima, não houve a efetiva cobrança, portanto, não há razão para ensejar ao creditamento, conforme entende o STF (RE 566.819, em setembro de 2010).

Mas, em outra vertente, quando de matéria-prima tributada [insumo] o produto final é isento, sujeito à alíquota zero, não tributado ou imune, deverá ser compensado o que for devido em cada operação com o montante cobrado nas operações anteriores, não se aperfeiçoando quando não houver produto onerado na saída, pois se não ocorrer incidência na saída do produto final, os créditos apropriados na entrada devem ser estornados.

De todo modo, algumas matérias primas são vedadas ao creditamento do IPI, como a aquisição de bens para o ativo permanente, energia elétrica, uniformes, itens de segurança do trabalho, combustíveis para o transporte de pessoas ou matérias primas, por outro lado, somente podem ser creditados produtos intermediários e embalagens.

Por derradeiro, não com que creditar o quando existe o industrial tem beneficio, em quaisquer formas.

Do creditamento de matérias consumidas no processo de produção

Os matérias consumidos no processo de produção direta ao produto final não geram crédito ao IPI, apenas nas hipóteses previstas no RIPI, no artigo 4°:

“Parágrafo único.  São irrelevantes, para caracterizar a operação como industrialização, o processo utilizado para obtenção do produto e a localização e condições das instalações ou equipamentos empregados”

Quanto aos bens adquiridos para o ativo permanente, bem como os materiais de teste ou os protótipos não há possibilidade de obter direito ao crédito, pelo simples motivo, não incide o IPI nestes casos, pois a regra é para tenha direito ao credito, o sujeito passivo precisa industrializar o produto, ou seja, é necessário que seja a titulo onero.
Do crédito escritural do IPI e a correção monetariamente

Trata-se de uma questão controvertida do direito tributário, já que não há nenhuma lei que disponha a respeito. Para o particular, há certa liberdade (principio da legalidade ampla) juridicamente, eis que o Fisco não pode se enriquecer as custas do sujeito passivo da relação tributária, em contrapartida, ao ente tributante, não poderá conceder  a correção monetária (legalidade restrita), ao menos que lei ou por ato judicial para que seja concedido. É relevante a questão dos créditos tributários na prática devido a circulação de bens e seu valor diminuto para a industria, logo, o artigo 225, § 1o  , trata:

“O direito ao crédito é também atribuído para anular o débito do imposto referente a produtos saídos do estabelecimento e a este devolvidos ou retornados”.

Pois bem, talvez a correção monetária seja mesmo um beneficio disfarçado por que, pode ocorrer que nesta correção o sujeito passivo nem seque pague o imposto devido para anular aquilo que ele já devia, mas, de todo modo, é um confronto de interesses em que já houve “vencedor nesta puxada de corda”, o contribuinte. A Súmula 411 do STJ coube por “tampar” a questão, consolidando o entendimento de que:

“É devida a correção monetária ao creditamento do IPI quando há oposição ao seu aproveitamento decorrente de resistência ilegítima do fisco”.


Princípio da seletividade e sua aplicabilidade

O princípio constitucional da seletividade do imposto não é uma faculdade, devido ao fundamento previsto na Carta Magna, no art. 153, IV, e § 3°, que assim transponho, para posteriormente tecer breves comentários:

                        “§ 3° O imposto previsto no inciso IV:
                        I – Será seletivo, em função da essencialidade do produto” (grifo nosso).

Como se percebe, o texto normativo constitucional acima emprega o termo “Será seletivo” como regra de estrutura promovendo para o futuro uma complementação estatizada, de modo, que incumbe uma obrigatoriedade na produção normativa do legislador para instituir o imposto.

A essencialidade do objeto pode variar, conforme a necessidade, utilidade e superfluidade, daí que, deverá haver uma ponderação de valores fundantes dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade. A seletividade tem por via, representar os meios classificatórios do produto devido a um critério de descriminação, conforme a essencialidade.

Quanto às alíquotas, não poderão variar conforme a destinação do produto, muito menos quanto à etapa de circulação, mas sim, de acordo com o próprio produto. É este o posicionamento, seguindo a linha de raciocínio da juíza do Tribunal de Justiça da Paraíba, em seu artigo, diz:

“Diante desse quadro, entendemos que deveria existir um critério mais rigoroso na fixação das alíquotas do IPI, levando em conta a adequação do produto à vida do maior número de consumidores do  país.  (...) Ou seja, o IPI não poderá variar conforme destinação do produto, e sim, deverá variar conforme o produto. (grifo nosso)

É neste embalo que deve perseguir as alíquotas, pois se encartam ao objetivo de atualização sobre o mundo extrajurídico ao alterar as alíquotas pela adequado intuito de promoção do principio da dignidade humana, como também liberdade de trafego.



24/10/2013

Poesia: Insônia dos Sonhos

Os sonhos lapidam o entardecer,

O entardecer me remete pensar,
Que sonho sonhar?
Fantasias a criar,
Para a insônia poder afastar!

Nada para além do meu alcance,
Pela manhã irei despertar,
Gira Mundo, bola grande,
Breve torno-me a sonhar...

Sonho dormindo,
Não sonho,
Sonho acordado,
Sonho,
Se sonho, por que sonho?
Freud explica!
Para mim complica,
Mas vale a dica,
Alimente-se!


Sonho engorda?
Sim, meu futuro!
Plante na sua horta,

É duro,
Mas lhe juro,
Seu muro,
É o futuro

Sonhe...

22/10/2013

Imposto Territorial Rural - ITR : Estudos direcionados



Delinearemos a regra-matriz de incidência tributária (na linha do mestre Paulo de Barros Carvalho) do Imposto Territorial Rural e seus critérios, primeiramente deveremos fazer breves considerações acerca deste imposto. A função deste imposto é a extrafiscalidade, pois serve como um instrumento auxiliador, de forma a combater aos latifúndios improdutivos, como bem afirma Hugo de Brito Machado. Ademais, é de competência da União o ITR, conforme o art. 153, VI, da Constituição Federal. A Lei n° 9.393/12/1966 é a que disciplina o ITR e, com base nesta lei, passaremos a definir a regra-matriz deste imposto, analisando o critério antecedente.

Aspecto material: Para que tenhamos uma maior compreensão em relação ao aspecto material, podemos afirmar que em qualquer espécie tributária haverá um fato, desde que seja licito genérico e que descreva sua hipótese de incidência sediada em seu tempo e espaço. Fazendo uma leitura na norma que disciplina o ITR, podemos dizer que o aspecto material está atrelado à propriedade para que haja a incidência tributária. Para tanto, entende-se como aspecto material o “ser proprietário, domínio útil ou a posse de imóvel rural”

Aspecto espacial: tem por critério a localização do imóvel rural, ou seja, que não seja em zona urbana do município.

Aspecto temporal: a partir do momento em que se adquire a propriedade imóvel localizada fora da zona urbana, independente de titulo translativo imobiliário.
Agora, passemos a analisar o critério consequente, como o aspecto o subjetivo e o quantitativo.

Aspecto pessoal: Ao sujeito passivo (devedor) enquadra-se como contribuinte o proprietário do imóvel rural, por domínio útil ou a posse do imovel. Quanto ao sujeito ativo (credor), conforme o art. 153, VI, da Lei Maior/88, a União tem competência para instituir o ITR, bem como também estabelece o Código Tributário Nacional, em seu art. 29. Cabe ressaltar que, a Emenda Constitucional n° 42/03 permitiu delegar a capacidade tributária ativa do ITR para os Municípios, portanto, deve-se distinguir da transferência da competência tributária, pois na delegação, haverá apenas a permissão para a cobrança e fiscalização.

Aspecto quantitativo: Na base de cálculo, deverá observar o art. 30 do CTN, juntamente com o art. 8° da Lei n° 9.393/96, ao passo que direciona ao valor da terra nua. Por terra nua, define a Lei n° 4382/2002, em seu art. 32 que é o valor de mercado do imóvel, sendo excluídos, assim a elenca taxativamente, as construções, instalações e benfeitorias; culturas permanentes e temporárias; pastagens cultivadas e melhorias; florestas plantadas. O art. 33 da referida Lei, logo trata que: “O Valor da Terra Nua Tributável - VTNT é obtido mediante a multiplicação do VTN pelo quociente entre a área tributável, definida no art. 10, e a área total do imóvel”.

Em relação às alíquotas, serão estas proporcionais e progressivas, de acordo com o grau da utilização da área rural. A Lei n° 4382/2002, em seu art. 34 traz uma tabela que deverá ser observada, que assim transcrevo:


ÁREA TOTAL
DO IMÓVEL
(em hectares)
GRAU DE UTILIZAÇÃO (em %)
Maior que 80
Maior que 65
até 80
Maior que 50
até 65
Maior que 30
até 50
Até 30
Até 50
0,03
0,20
0,40
0,70
1,00
Maior que 50 até 200
0,07
0,40
0,80
1,40
2,00
Maior que 200 até 500
0,10
0,60
1,30
2,30
3,30
Maior que 500 até 1.000
0,15
0,85
1,90
3,30
4,70
Maior que 1.000 até 5.000
0,30
1,60
3,40
6,00
8,60
Acima de 5.000
0,45
3,00
6,40
12,00
20,00

Essa variável na alíquota entre 0,03 até 20% em função da área do imóvel e da extensão territorial é sucinta de críticas doutrinarias. Hugo de Brito Machado, no qual nos declinaremos seu posicionamento, é que a carga elevada deste imposto tem um incontestável efeito de confisco, sendo sujeito ao vicio de inconstitucionalidade (art. 150, IV, da CF), pois é vedada a União, aos Estados e aos Municípios utilizar tais tributos para este efeito tão devastador para o contribuinte.

Passando mais adiante, é importante destacar que a principal diferença entre o ITR e IPTU, está para que este último o critério material é bem imóvel por natureza ou por acessão física, diferentemente no ITR, que não há fato gerador ao imóvel rural por acessão física, mas sim, ao imóvel por natureza, como o solo, sua superfície, os acessórios e adjacências naturas, árvores e frutos pendentes, o espaço aéreo e o subsolo, conforme dispõe o Código Civil, art. 79.

Conceitos da propriedade urbana e propriedade rural: distinções

Antes de iniciarmos sobre o conceito de propriedade urbana e a rural, primeiramente, deveremos extrair da seara do direito civil, o que é a propriedade, partindo-se da premissa de que o direito é uno e indivisível, por bem lecionado por Noberto Bobbio (Teoria Geral da Norma Jurídica). Na verdade, o Código Civil de 2002 não define exatamente o que é propriedade, mas sim as prerrogativas de proprietário, que tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha (art. 1.228, CC).

Pois bem, tanto na propriedade urbana como na propriedade rural, proprietário pode usar, gozar e dispor de seu bem imóvel, mas ambos são distintos, eis que ao IPTU, o bem imóvel pode ser por natureza ou por acessão física, já ao ITR, inexiste fato gerador quanto ao imóvel por acessão física, somente em relação a sua natureza, como o solo e sua superfície, os acessórios, adjacências naturais, arvores e frutos pendentes, o espaço aéreo e o subsolo (art. 79, do CC).

Podemos trazer uma indagação a respeito: Como não incidir no IPTU mesmo que o imóvel esteja em área urbana? Foi o que ocorreu, fugindo-se da regra sobre o aspecto espacial do bem imóvel, ou seja, aplicando-se o critério da destinação do imóvel pelo proprietário, conforme o art. 15 do Decreto-Lei 57/1966.  O confronto quanto a hipótese de incidência sobre ao aspecto espacial, em relação de qual imposto incidirá (IPTU x ITR), afinal, é a destinação ou localização do imóvel?  O art. 32 do CTN, logo diz que a localidade do imóvel é fator preponderante quanto a incidência do imposto, vejamos:

“O imposto, de competência dos Municípios, sobre a propriedade predial e territorial urbana tem como fato gerador a propriedade, o domínio útil ou a posse de bem imóvel por natureza ou por acessão física, como definido na lei civil, localizado na zona urbana do Município (grifo nosso)

Para tanto, não há dúvidas que o próprio Código Tributário Nacional cumpriu o seu papel pujante de tratar o aspecto espacial da hipótese de incidência do IPTU.

Quanto à destinação do imóvel para critério de incidência tributária, a aplicação do art. 15 do DL/1966 é válida? O Decreto-lei em tela não fora recepcionado pela Constituição Federal, porém por força da Resolução do Senado Federal nº 09, de 07 de junho de 2005, suspendeu a execução do art. 12 da Lei Federal nº 5.868/72, no ponto em que revogou o art. 15 do Decreto-lei nº 57/66. O ato do Senado está lastreado na decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal, nos autos do Recurso Extraordinário nº 140.773-5/210 – SP. Por derradeiro, pode-se afirmar ser válida aplicação do art. 15 do DL/1996, portanto, incidindo o ITR quando o imóvel for utilizado em exploração extrativa vegetal, agrícola, pecuária ou agro-industrial ou quando preencher apenas um ou nenhum dos requisitos do art. 32 do CTN. Cumpre ressaltar ainda que, a regra da destinação do imóvel apenas se aplica para o ITR e não para o IPTU, já que a norma optou por eleger a regra-matriz antecedente a localidade do imóvel, o que se pode dizer, para não haver dúvidas, estando em zona urbana incide o IPTU, desde que atendidas no mínimo tais circunstâncias:

a. meio-fio ou calçamento, com canalização de águas pluviais;
b. abastecimento de água;
c. sistema de esgotos sanitários;
d. rede de iluminação pública, com ou sem posteamento para distribuição domiciliar;
e. escola primária ou posto de saúde a uma distância máxima de 3 (três) quilômetros do
imóvel.

O problema principal está na competência quanto qual ente tributante pode definir o que é zona urbana e o que é zona rural. Acreditamos que, cada um é competente, só que na falta de definição legal da União, no ITR, pode o Município definir sua zona urbana que, por critérios lógicos, o que não é zona urbana será zona rural, ademais, tal competência é supletiva e que o art. 182, da CF, pois logo, a Lei Maior retrata que “A propriedade atenderá a sua função social” (art. 5º, XXIII da CF).

Ora, se o ITR tem sua finalidade extrafiscal (entendimento doutrinário de Hugo de Brito Machado), bem como ao IPTU, visa então somente cumprir sua função social, de modo, a estimular o seu proveito, quanto ao seu imóvel, seja urbano ou rural.

Ademais, parece-me que se a União definir zona rural e zona urbana, não lhes exorbitará de sua competência, porém, se um município legislar sobre ambas haverá um sério vicio de constitucionalidade, já que estenderá os seus próprios interesses, beneficiando a si próprio ente tributante do IPTU, portanto, deverá o município definir os seus próprios critérios. Por derradeiro, para infirmar ainda mais nosso entendimento, basta a leitura da Lei Ordinária n° 9.393/96, em seu art. 1°, que em seu corpo nos leva a entender que cabe ao município definir o que é zona urbana e o que for fora dela, será zona rural, daí ser incindível o ITR.

Observância ao Princípio da Progressividade

Ao princípio da progressividade, em homenagem ao mestre constitucionalista José Afonso da Silva (pp. 719): “é aquele cuja alíquota aumenta à medida que aumenta o ingresso ou a base imponível”. Alfredo Augusto Becker leciona (pp.309) que: “a medida da proporção e o ritmo da progressividade do tributo são problemas pré-jurídicos de Política Fiscal cuja solução fica entregue exclusivamente ao arbítrio do legislador”, deixando claro objetivo da progressividade, tanto dos impostos como também das taxas, que neste átimo observa-se também a capacidade contributiva em sua proporcionalidade para que não surtam efeitos contrários à Constituição Federal. A progressividade dos impostos está atrelada ao critério quantitativo das alíquotas.

O princípio ora exposto acima, é aplicável ao ITR servindo como referencial de acordo com a área do imóvel e do grau de sua utilização. Para a Lei n. 9.393/1996, uma área de até 50 hectares, sendo utilizada em mais de oitenta percentuais, a alíquota será 0,03 %. O grande problema neste referencial é a progressão destes percentuais chegarem a um patamar incidente de 20% sobre determinado imóvel rural durante cinco anos consecutivos, culminará, por conseguinte, na absorção plena e total do valor desta propriedade, criando um vicio contrário ao que constitucionalizado, ou seja, contrário a outro principio, o não-confisco, em que afrontado tal princípio, o lesado deverá instaurar uma pretensão resistida para reparar tal dano.

Em relação à progressividade do IPTU, tem por referencial a majoração conforme for a alíquota incidente na medida em que o contribuinte demonstrar sua a pujança de sua capacidade contributiva, previsão expressão no art. 145,§ 1º da CRFB/88. A função social da propriedade também é aplicável neste imposto devido sua natureza ser extrafiscal.

Além disso, o art. 33 do CTN, que a base de cálculo será de acordo ao valor venal do imóvel e, em seu parágrafo único, logo diz que na determinação da base de cálculo, não se considera o valor dos bens móveis mantidos, em caráter permanente ou temporário, no imóvel, para efeito de sua utilização, exploração, aformoseamento ou comodidade.

Quanto a constitucionalidade da nova redação do §1º do artigo 156 da Constituição de 1988, conferida pela EC nº 29/2000, a Suprema Corte Constitucional já tratou da temática no Recurso Extraordinário nº 153.771-0-MG, vejamos:

"EMENTA: - IPTU. Progressividade. – No sistema tributário nacional, o IPTU inequivocamente é um imposto real.
– Sob o império da atual Constituição, não é admitida a progressividade fiscal do IPTU, quer com base exclusivamente no seu artigo 145, § 1º, porque esse imposto tem caráter real, que é incompatível com a progressividade decorrente da capacidade econômica do contribuinte, quer com arrimo na conjugação desse dispositivo constitucional (genérico) com arrimo no art. 156, § 1º (específico).
– A interpretação sistemática da Constituição conduz inequivocamente à conclusão de que o IPTU com finalidade extrafiscal a que alude o inciso II do § 4º do artigo 182 é a explicitação especificada, inclusive com limitação temporal, do IPTU com finalidade extrafiscal aludido no artigo 156, I, § 1º.
– Portanto, é inconstitucional qualquer progressividade, em se tratando de IPTU, que não atenda exclusivamente ao disposto no artigo 156, § 1º, aplicado com as limitações expressamente constantes dos §§ 2º e 4º do artigo 182, ambos da Constituição Federal.
Recurso extraordinário conhecido e provido, declarando-se inconstitucional o subitem 2.2.3. do setor II da Tabela III da Lei nº 5.641, de 22.12.1989, no Município de Belo Horizonte."

Conforme a ementa acima transcrita, o STF julgou constitucional a modificação normativa, sendo classificada como norma de eficácia limitada, sob nosso ângulo, pois a norma diz menos do que deveria, deixando margem para implementação legislativa.

A alteração redacional §1º do artigo 156 da Constituição, fez com que houvesse a natureza do IPTU, passando a ser de natureza fiscal, sendo progressivo ao valor do imóvel e não quanto à obrigatoriedade do cumprimento de sua funcionalidade social.

Tratar a progressividade no tempo do IPTU é uma reprimenda sancionatória imposta ao Município, como meio de reforçar e implantar a sua política, conforme o plano diretor, além, tem cunho protecionista na medida em que modela a função social da propriedade. Afirmamos ter caráter sancionatória a progressividade no tempo do IPTU e, podemos ir além que está sanção não seguirá em contrariedade ao art.3° do CTN, eis que não provem de ato ilícito, aloja-se na lei e está observada conforme atividade administrativa plenamente vinculada, como plano diretor municipal.

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