20/02/2020

O CRIME DE PECULATO E CONTROVÉRSIAS JURÍDICAS


Historicamente, o crime de peculato decorreu-se no direito romano, e quem subtraísse de coisas do Estado era reprimido com penas, como o trabalho nas minas e até mesmo pena de caráter capital, como a morte. Não se punia em razão da qualidade do sujeito, mas pela condição da coisa desviada ou subtraída, que era a coisa pública.

Atualmente, o artigo 312 do nosso Código Penal, prescreve:

Apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo ou desviá-lo, em proveito próprio ou alheio:
Pena – reclusão, de dois a doze anos, e multa.

Podemos compreender, portanto, se tratar de figura própria de crime contra a Administração Pública, que seria como uma apropriação indébita pratica pelo funcionário público, em razão do ofício. No entanto, não se pode afirmar que a natureza da apropriação indébita e o peculato tenham os mesmo elementos estruturais, pois, no peculato o sujeito ativo do crime é funcionário público, exigindo-se desta qualidade especial para que se configure o crime.

Ademais, nada impediria quanto à aplicação do concurso de pessoas com o particular, desde que saiba da condição de funcionário público para que seja devidamente aplicado.

A tutela jurídica na esfera penal é a Administração Pública, no que diz respeito ao patrimônio e a preservação do erário, como em seu aspecto moral proveniente de elementos específicos, como lealdade e probidade dos representantes públicos. A proteção bem particular também deverá ser guiada no mesmo sentido, no entanto, exige-se que tais bens estejam confiados à guarda da Administração Pública, inclusive, a doutrina denomina-se como peculato malversação.

Interessante denotar, quanto à existência de espécies de peculato presente num único dispositivo legal. Para fins didáticos sobre o assunto, existem três espécies de peculato na modalidade dolosa e uma espécie na modalidade culposa:

a)   Peculato Apropriação

b)  Peculato Desvio

c)   Peculato Furto (peculato impróprio)

d)  Peculato Estelionato ou mediante erro de outrem (art. 313, do CP)

e)   Peculato culposo


a)   Peculato Apropriação

O Peculato Apropriação relaciona-se o funcionário público na posição ou condição de cargo emprego ou função pública, apresentando como se dono fosse do objeto de dinheiro, valor ou qualquer outro bem de natureza móvel, público ou particular.
Desta forma, o sujeito passivo detém da coisa objeto da apropriação de forma lícita.

No que diz respeito ao dinheiro objeto material do delito, devemos observar que será indiferente quando se trata de crime de apropriação de dinheiro, afastando-se a ideia da fungibilidade, ou seja, o funcionário público cometerá o crime de peculato apropriação da mesma forma quando apropria de dinheiro público de que tem a posse, mesmo que se pretenda devolvê-lo.

Há outra questão instigante no que se refere quanto à aplicação ou não do artigo 16 do Código Penal[1], especificamente, do arrependimento posterior nos crimes de peculato apropriação.

Com a devida vênia com os que preconizam de modo diverso, entendemos ser aplicável o arrependimento posterior, visto que o crime de peculato apropriação não há violência ou grave ameaça, no entanto, deverá o agente cumprir as condições previstas no artigo 16, do CP, como por exemplo, deverá reparar o dano ou restituir a coisa, até o recebimento da denuncia ou queixa, de forma espontânea. 

Assim, preenchidas tais condições, o agente terá sua pena reduzida de um a dois terços, mas, conforme dito anteriormente, basta ter a posse do bem público e apropriar-se dela como se dono fosse para que seja caracterizado o delito, significando dizer quer que não o agente não vá escapar-se ileso da Justiça Penal pelo simples ato de arrependimento ou mesmo a reparação integral dos danos ocasionados.

Ademais, o Superior Tribunal de Justiça na maioria dos casos, tem aplicado a sua jurisprudência pacífica, qual seja, que a incidência do instituto do arrependimento posterior pressupõe a integral reparação do dano antes do recebimento da denúncia, cuja fração de diminuição de pena será fixada de acordo com o aspecto temporal entre a prática do ilícito e a conduta voluntária do agente em restituir à vítima o seu prejuízo[2]

É de extrema relevância que o agente do crime tenha a posse para consumação do delito, pois, caso contrário aplica-se a tentativa, conforme inteligência do artigo 14, II, do Código Penal. A expressão "posse" deve ser concebida em sentido amplo, ou seja, inclui a disponibilidade jurídica do bem[3].

b)  Peculato Desvio

O ato de desviar tem um significado relevante para fins penais. Caracteriza-se por peculato desvio quando o funcionário público dá atribuição diversa do objeto que lhe foi determinado, seja em proveito próprio ou de outrem, em razão do cargo, emprego ou função.

Em verdade, trata-se do simples uso irregular da coisa pública. Por exemplo, desviar verba para construir uma estrada ou obra pública, que objetiva construir em sua fazenda para seu proveito próprio ou de um amigo político; desviar um recurso público que promoveria projetos culturais para um casamento.

Caso prático, Mélvio, servidor público municipal, negou-se, após sua função ter sido alterada, a devolver um notebook do município que lhe fora cedido em razão de seu cargo para realização de serviços que não mais faria para a prefeitura.

A consumação do crime de peculato-desvio (art. 312, caput, 2ª parte, do CP) ocorre no momento em que o funcionário efetivamente desvia o dinheiro, valor ou outro bem móvel, em proveito próprio ou de terceiro, ainda que não obtenha a vantagem indevida[4]

Se o Funcionário que recebe dinheiro ou outro valor de particular e aplica na própria repartição, via de consequência comete o crime de peculato, na modalidade desvio, tendo em vista que o valor foi destinado ao Estado, não cabendo ao funcionário público promove-lo sem a devida autorização legal, qualquer que seja sua finalidade.

Para fins de elucidação prática, interessante julgado do STF, no qual se afirmou que o desvio pode ser feito de qualquer forma, independentemente se causar prejuízo para a administração, devendo levar em consideração o dinheiro público que foi parar em local indevido. Vejamos:

“O Tribunal, por maioria, recebeu denúncia oferecida pelo Ministério Público Federal contra Deputado Federal, em que se lhe imputa a prática do crime previsto no art. 312 do CP, na modalidade de peculato-desvio, em razão de ter supostamente desviado valores do erário, ao indicar e admitir determinada pessoa como secretária parlamentar, quando de fato essa pessoa continuava a trabalhar para a sociedade empresária de titularidade do denunciado.
Inicialmente, rejeitou-se a arguição de atipicidade da conduta, por se entender equivocado o raciocínio segundo o qual seria a prestação de serviço o objeto material da conduta do denunciado. Asseverou-se que o objeto material da conduta narrada foram os valores pecuniários (dinheiro referente à remuneração de pessoa como assessora parlamentar). (...) Vencidos os Ministros Marco Aurélio e Celso de Mello, que rejeitavam a denúncia por reputar atípica a conduta imputada ao denunciado”
STF, Inquérito n. 1.926/DF, Pleno, rel. Ellen Gracie, 09.10.2008, m.v., Informativo 523.


Durante a conduta delitiva não poderá estar presente qualquer tipo de violência, fraude, ou mesmo erro, senão, estar-se-ia caracterizar por outras espécies de crimes, mas não o de peculato desvio.

c)   Peculato Furto (peculato impróprio)

O peculato furto está previsto no § 1º do Artigo 312 do CP, “in verbis”:

§ 1º - Aplica-se a mesma pena, se o funcionário público, embora não tendo a posse do dinheiro, valor ou bem, o subtrai, ou concorre para que seja subtraído, em proveito próprio ou alheio, valendo-se de facilidade que lhe proporciona a qualidade de funcionário.


A conduta consubstancia-se no ato de subtrair, ou seja, tirar de quem tem a posse ou a propriedade, sendo inexigível que o funcionário público tenha o bem sob sua guarda, que por si só, configura como crime.

Portanto, trata-se da subtração da coisa sob guarda ou custódia da Administração Pública, no entanto, o funcionário público utiliza-se de seu cargo, emprego ou função, agindo por sua vontade consciente de subtração ou mesmo que concorra para que seja subtraída, seja para si ou para outrem, determinada coisa, independentemente se a referida coisa seja de natureza pública ou privada, desde que esta esteja sob guarda do ente público, conforme mencionado.

Denota-se que, a intenção do funcionário público é não devolver a coisa ao seu proprietário.

Para fins práticos, imagine um funcionário público que ingressa numa repartição pública mediante destruição ou rompimento de obstáculo com o objetivo de subtrair um computador de propriedade do órgão. 

Ocorre que neste caso hipoteticamente mencionado, o funcionário público não comete o crime de peculato furto, tendo em vista que ao adentrar numa determinada repartição pública por meio destruição ou rompimento de obstáculo, como arrombamento da porta, o funcionário não se vale da qualidade de seu cargo, emprego ou função para consumar o delito, logo, comete o crime de furto qualificado.

Diferentemente, no mesmo exemplo mencionado, o funcionário público por trabalhar em determinada função especifica furta de forma direta e objetiva equipamentos de informática ao término do seu expediente, levando para sua residência. Observa-se, portanto, que houve a consumação do delito ao retirar o objeto da repartição pública às escondidas, diante da vantagem de laborar como funcionário público, elemento normativo essencial para a referida qualidade.

Quanto ao elemento subjetivo, exige-se a presença do dolo, manifestando o autor do delito pela vontade livre e consciente quanto a prática criminosa.

O crime se consuma com efetiva subtração da coisa.

No tocante a tentativa do delito é possível, desde que vislumbrada a interrupção do inter criminis.

Imagina-se: um vigilante a serviço da Policia Federal subtraí arma de fogo da Delegacia ao guardar em sua bolsa. Desconfiado com o sumiço da referida arma, o Delegado de Polícia pede que todos da repartição sejam revistados. Resultado, localizada a arma de fogo na posse do vigilante, mas, não se consumou o crime de peculato furto por completo, pois, por circunstancias alheias a sua vontade não saiu da Delegacia com o objetivo que desejava subtrair. 

Note-se que se exige que a coisa móvel saia da posse da Administração Pública para consumar o delito[5].

d)  Peculato Estelionato ou mediante erro de outrem (art. 313, do CP)


De acordo com o artigo 313, do Código Penal:

“Apropriar-se de dinheiro ou qualquer utilidade que, no exercício do cargo, recebeu por erro de outrem.
Pena: Reclusão, de um a quatro anos e multa”

Trata-se de crime proveniente da captação indevida por parte do funcionário público, de dinheiro ou qualquer outra utilidade mediante o aproveitamento ou manutenção do erro alheio.

Vale lembrar que, da mesma forma que o crime de estelionato, exige-se o erro, mas, não deve ser considerado como a mesma espécie de crime, visto ser uma modalidade especial de apropriação de coisa havida por erro, pois o sujeito ativo do crime ser funcionário público, que age prevalecendo de sua atividade.

O objeto material do crime é dinheiro ou qualquer outra utilidade. Note-se que, a expressão “qualquer utilidade” revelando em sentido amplo e geral, cabendo ao aplicador da lei, asseverar quanto ao aspecto interpretativo, podendo observar somente ao fator econômico, representado por qualquer bem de cunho material, desde que haja vantagem para o funcionário público, haja vista que o núcleo do crime é o recebimento mediante erro de outrem.

Nas precisas lições do saudoso Paulo José da Costa Jr, o erro ou ignorância poderá tratar sobre[6]:

a)   O que é devido ou sobre o quanto é devido;

b)   A pessoa a quem faz a entrega, não competente para o recebimento, que silencia sobre determinada circunstância e apropria-se indevidamente da quantia paga por engano;

c)   A obrigação de entregar, em que poderá suceder uma interpretação errônea de alguma das cláusulas contratadas, que poderá ensejar o equivoco, do qual se dá conta o funcionário, sem advertir o ofendido.

O crime cose consuma no momento que o funcionário público se apropria do valor que lhe é entregue por erro, dispondo-se como se fosse dono.

Casos práticos de Peculato Estelionato ou mediante erro de outrem:

1)   Determinado auditor fiscal da SEFAZ exigiu do contribuinte o pagamento de tributo que sabia ser indevido, afirmando que iria recolher o valor aos cofres públicos.

2)   Claus, servidor público de uma secretaria de fazenda, estava sozinho em seu departamento de trabalho, ao final do expediente, quando um cidadão dirigiu-se até ele, insistindo em efetuar pagamento em dinheiro referente a dívida que Claus verificou ser inexistente junto àquela secretaria. Aproveitando-se do equívoco, Claus recebeu e apropriou-se do valor, sem alertar o devedor de que o pagamento deveria ser efetuado em outro órgão.

Admite-se ao crime na forma tentada.

Quanto ao elemento subjetivo, deverá estar presente o dolo genérico que consistente na vontade livre e consciente de apropriar-se de coisa havida por erro, durante o exercício da função pública. Ademais, a existência do dolo deve ser considerada no momento do recebimento do bem empossado pelo funcionário público, proveniente do erro de outrem.

Conflito de normas penais

Assim como o Código Penal, o Código Penal Militar também disciplinou sobre o mesmo crime: “Art. 304. Apropriar-se de dinheiro ou qualquer utilidade que, no exercício do cargo ou comissão, recebeu por êrro de outrem”. Pena - reclusão, de dois a sete anos.

A solução mais adequada num eventual conflito de normas penais é aplicar ao princípio da especialidade. Portanto, se o funcionário público for militar, aplica-se ao disposto no Código Penal Militar, mas não poderá ser aplicada a punição pelo mesmo fato, afastando-se o bis in idem.

O crime de peculato apropriação mediante erro de outrem de ação penal pública incondicionada.


Questão de concurso 

(ADVISE - 2018 - Câmara do Município de Brejão - PE - Assessor Legislativo):

   Segundo disposto no Decreto-Lei nº 2.848/40, apropriar-se de dinheiro ou qualquer utilidade que, no exercício do cargo, recebeu por erro de outrem, é considerado crime de:

Parte superior do formulário
a) Peculato de Extração Externa.
b) Peculato Doloso.
c) Peculato Contra Outrem.
d) Peculato Magistério.
e) Peculato Mediante Erro de Outrem.


         e) Peculato culposo

Nos termos do artigo 312, do Código Penal, §2° e § 3°:

§ 2º - Se o funcionário concorre culposamente para o crime de outrem:

Pena - detenção, de três meses a um ano.

§ 3º - No caso do parágrafo anterior, a reparação do dano, se precede à sentença irrecorrível, extingue a punibilidade; se lhe é posterior, reduz de metade a pena imposta.

Trata-se de espécie de peculato, mas o agente não age de forma intencional, ou seja, estando presente a imprudência, negligência ou imperícia, que infringe quando a dever de cuidado.

O crime se consuma no momento em que se aperfeiçoa a conduta dolosa do terceiro, pois há uma relação de causa e efeito, ou seja, o vinculo de natureza objetiva entre o comportamento culposo e a atuação dolosa empreendida pelo terceiro. Ademais, não poderá existir acordo entre o funcionário e o terceiro, pois se assim houver, se caracterizará por crime de peculato doloso.

Não haverá crime tentado nesta modalidade de peculato culposo. Se o crime praticado por terceiro ficar na fase da tentativa, via de consequência, o funcionário público que agiu de forma culposa não responde especificamente por peculato culposo.
Para fins de estudo, citamos um exemplo:

Carro oficial é furtado após funcionário público estacioná-lo em via pública deixando as portas abertas e as chaves no contato. O funcionário, nesse caso, incorre, em tese, no crime de peculato culposo (Prova: FCC - 2019 - DPE-AM - Assistente Técnico de Defensoria - Assistente Técnico Administrativo).

É corriqueiro casos em que o policial deixa a arma dentro do veículo e consequentemente, por destreza do furtador abre a porta do veículo e leva a arma. Neste caso específico, o policial responderá tanto na esfera criminal por crime de peculato culposo na Justiça Comum (Federal ou Estadual, conforme a competência), quanto na esfera administrativa, respondendo por processo administrativo disciplinar.

Causa de extinção da punibilidade ou de redução da pena no crime de Peculato Culposo

O art. 312, § 3°, do CP, prescreve dois momentos com efeitos jurídicos diversos no tocante a reparação do dano decorrente do crime de peculato, antes e após o trânsito em julgado da condenação:

a)   Reparação do dano antes do transito em julgado da condenação:

O efeito em concreto decorrerá como causa extintiva da punibilidade, ainda que não esteja prevista no rol taxativo do art. 107 do CP. Em verdade, trata-se da aplicação do princípio da boa-fé, devido ao agente público reconhecer, ainda que de forma tácita, sua culpa, reparando pelo prejuízo ocasionado antes que lhe seja condenado, sendo inclusive, vantajoso para a Administração Pública, ao invés de esperar todo o tramite processual para ser devidamente ressarcida.

b)  Reparação do dano após o transito em julgado da condenação:

Nesta hipótese, se o funcionário público reparar o dano ao erário, via de consequência, ocorrerá a minimização diante de eventual condenação, sentença reduz de metade da pena imposta, cabendo ao juiz da execução penal aplicar o redutor da pena, por ter cessado a atividade jurisdicional do juiz da condenação.

         No crime de peculato culposo, a ação penal é pública incondicionada.


Aplica-se o princípio da insignificância no crime de peculato?

Diversas decisões judiciais têm sedimentado de forma pacífica que, o princípio da insignificância é inaplicável aos crimes cometidos contra a Administração Pública em geral, incluindo ao crime de peculato.

Trata-se do posicionamento firmado pelo STJ, pois, ainda que o objeto do crime seja sem valor algum, a intenção da norma penal é buscar maior efetividade na tutela jurídica da moralidade administrativa (dever de probidade). A referida E. Corte editou a Súmula 599:

“O princípio da insignificância é inaplicável aos crimes contra a Administração Pública”

Com o devido respeito à decisão sumular do Superior Tribunal de Justiça apresentada, será necessário que cada caso seja devidamente avaliado por parte do juiz diante de um caso concreto, como também, por parte do promotor de justiça, pois, a este incumbe no seu dever legal em apresentar na acusação em todos os detalhes e direcionamento para que o processo tenha seu curso.

Para compreendermos melhor, a avaliação de cada caso concreto se origina na teoria dos valores aplicados à prática. Citamos por exemplo, determinado funcionário público subtrai duas folhas de papel em branco de sua repartição, indaga-se: seria justo e necessário dar o impulsionamento ao processo por meio de denúncia em face do funcionário por esta conduta? A resposta seguramente não! Seria injusto e desnecessário, sobretudo, dispendioso para o Estado mover todo o seu aparato por meio do Poder Judiciário para punir um funcionário público por furtar determinado objeto de valor ínfimo, por mais que se argumente ao aspecto de moralidade pública, visto que está estritamente pautado em valores.

De outra visão, talvez mais prudente e sensata para a aplicação da Justiça, diz respeito exatamente aos valores empregados como necessários em prol da moralidade pública, visto a obrigatoriedade de sua preservação na prática, mas, conjuntamente com o princípio da equidade como base elementar dos valores tido como reprováveis no seio social, portanto, não se pode aceitar que se furtem um computador de uma repartição pública, tampouco, que seu ato fosse acometido por um funcionário público, pois representa não somente aos quadros da Administração Pública, como também, a sociedade num todo, diante do fator democrático de representação, ainda que de forma indireta, sendo aprovado em prova de concurso público.

Há se afirmar, portanto, aplicar a Súmula 599 do STJ sem dimensionar a questão valorativa de cada caso concreto significa não fazer Justiça, devendo ser relativizada, senão, alterada a referida Súmula, afim de, trazer a lume um inconsequente “engessamento” do sistema jurídico num todo.








[1] Dispõe o art. 16, do CP: “Nos crimes cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa, reparado o dano ou restituída a coisa, até o recebimento da denúncia ou da queixa, por ato voluntário do agente, a pena será reduzida de um a dois terços.
[2] AgRg no REsp 1262608/BA, Rel. Ministro JORGE MUSSI
[3] REsp 1723969 PR 2018/0032973-3, Superior Tribunal de Justiça.
[4] RHC 036755/AP,Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA,Julgado em 16/12/2014,DJE 03/02/2015
CC 119819/DF,Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA SEÇÃO,Julgado em 14/08/2013,DJE 20/08/2013
AgRg no Ag 905635/SC,Rel. Ministro NILSON NAVES, SEXTA TURMA, Julgado em 16/09/2008,DJE 24/11/2008
[5] Seguindo as precisas lições do saudoso Paulo José da Costa Junior, in Código Penal Anotado, p.1164, São Paulo: 2009, Editora Dpj.
[6] Código Penal Anotado, p.1168, São Paulo: 2009, Editora Dpj.







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18/02/2020

A Participação das Microempresas e Empresas de Pequeno Porte nas Licitações Públicas



        
         Em nosso sistema jurídico, as empresas de pequeno porte e as microempresas possuem um tratamento diferenciado para que possam participar em licitações públicas (artigos 146 III, “d”, 170, IX e 179, da CF/88). A Lei Complementar n. 123/2006, estabeleceu normas gerais, que posteriormente foi regulamentado pelo Decreto n. 8.538/2015.

         Desta forma, para o enquadramento ao tratamento diferenciado para as empresas microempresas e empresas de pequeno porte deverão ser atendidas conforme os critérios estabelecidos em lei. A legislação atual impõe limites de acordo com os valores de receita bruta para fins de tratamento diferenciado (art. 3°, I e II, LC 123/06).

         Para Empresa Individual de Responsabilidade Limitados (Eireli) e Empresários que auferirem calendário-ano receita bruta igual ou inferiores a R$ 360.000,00.

         Empresas de pequeno porte que auferirem em cada ano-calendário receita bruta superior a R$ 360.000,0 e igual ou inferior a R$ 480.000,00 (art. 3°, I, II, Lei Complementar n. 123/2006).

         Interessante frisarmos que, as Microempresas e as empresas de pequeno porte devem apresentar documentos relacionados a regularidade fiscal  e trabalhista na fase de habilitação, ainda que  tais documentos possuam vícios ou restrições, sendo apenas exigida a regularidade ao final, com a assinatura contratual, distintamente como ocorre numa licitação quando não há a participação para tais empresas (art. 42, 43, da Lei n. 123/2006).

         Assim, se ocorrer qualquer restrição, caberá ao interessado regulariza-las no prazo de cinco dias úteis, a partir da declaração do vencedor da licitação, sendo prorrogado por igual período, de acordo com a conveniência e oportunidade da Administração Pública.
         Ademais, podemos observar que, na prática há duas possibilidades de regularização de restrições por parte das Microempresas e Empresas de Pequeno Porte, como por exemplo, o pagamento integral ou o parcelamento dos débitos fiscais, no qual haverá a possibilidade de emissão de certidão negativa ou positiva com efeitos de negativa (art. 43, § 1°, da LC n. 123/06).
         Esgotado o prazo de cinco dias para a regularização das restrições, ocorrerá a decadência do direito à contratação por parte do ente licitante, sendo lhes impostas sanções previstas no artigo 87 da Lei de Licitações (Lei n. 8.666/93).

         No que diz respeito a critérios de desempate nas licitações, a legislação assegura o direito de preferência nas contratações para as microempresas e empresas de pequeno porte. No entanto, poderá ocorrer critérios de empate, em que as propostas será apresentadas pelas microempresas e empresas de pequeno porte seja iguais ou até dez por cento superiores à proposta mais bem classificada. Em se tratando da modalidade pregão, o intervalo percentual será de cinco por cento superior ao melhor preço (art. 44, §§ 1°, 2°, da Lei n. 123/06).

         Haverá situações que o empate esta evidenciado no critério preço, ou seja, menor preço e maior lance, não sendo possível também pautar-se na melhor técnica ou preço (art. 44, § 2°, art. 45, I e III, da Lei 123/2006).

         Assim, as microempresas e empresas de pequeno porte poderão apresentar proposta inferior ao preço considerada como vencedora, no qual ocorrerá a adjudicação do objeto licitado, ao passo que, não havendo proposta mais vantajosa, a Administração convocará as microempresas e empresas de pequeno porte remanescentes, conforme os percentuais limitativos, de acordo com a ordem de classificação (art. 45, I, II e III, da Lei 123/2006).

         Se houver a disputa de duas ou mais entidades de mesmo valores, a escolha da licitante que poderá oferecer, em primeiro ligar, a proposta que será definida, por meio de sorteio (art. 45, III, da Lei 123/06).

         Devidamente convocadas para desempatarem a licitação e não apresentarem a proposta mais vantajosa, o objeto licitado será adjudicado em favor da proposta originalmente vencedora do certamente (art. 45§ 1°, Lei 123/06).

         Em se tratando de pregão, a empresa de pequeno porte ou microempresa melhor classificada será convocada para apresentação de nova proposta no prazo máximo de cinco minutos, após o encerramento dos lances e, não realizada a proposta será considerada preclusiva (art. 45, § 3°, Lei 123/06).

Contatos:


        

06/02/2020

ANÁLISE CRÍTICA SOBRE O ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL E SEUS REQUISITOS, (DE ACORDO COM PACOTE ANTICRIME)




Seria oportuno e adequado trazer a lume inovações no cenário penal e processual penal. Cada vez mais estamos por respirar tais inovações inseridas pelo Pacote Anticrime promovida pela Lei 13.964/2019 que, via de consequência, todo e qualquer tipo de reflexão, quanto aos contornos práticos pode robustecer a tese de sua efetividade no aspecto social.

Por obviedade, a inserção do acordo de não persecução penal não é tão novidade assim, tendo em vista as resoluções 181/2017 e 183/2018, do Conselho Nacional do Ministério Público, mas, o critério essencial do referido instituto diz respeito apenas a normatização do rito e dos procedimentos a serem aplicados na prática.

O artigo 28-A do Código de Processo Penal estabelece que:
“não sendo caso de arquivamento e tendo o investigado confessado forma e circunstancialmente a prática de infração penal sem violência ou grave ameaça e com pena mínima inferior a quatro anos, o Ministério Público poderá propor acordo de não persecução penal”.

Se observarmos com um senso crítico, podemos vislumbrar a ausência de uma Política Criminal direta, visto que se deveria estimular para combate ao crime, empregando meios muito mais eficazes para tanto.

Reservamos observar também que, por outro lado, os acordos penais trazem consigo uma amenização econômica ao Estado, pois, ao invés de continuar com o processo penal, condenar o individuo e mantendo encarcerado, preferiu o Estado (em sentido amplo) economizar seu erário.

Por certo, a Justiça Penal Negociada é uma estratégia válida e de alcance imediato de despenalização, tendo em vista que não haverá sua continuidade ao caráter punitivo, desde que preenchidas as condições estabelecidas no artigo 28-A do Código de Processo Penal.

Podemos citar diversos exemplos de crimes que podem ser aplicados na prática, quanto ao acordo de não persecução penal, como: furto, dano, apropriação indébita, estelionato, receptação, moeda falsa, falsidade ideológica, peculato, concussão, corrupção passiva e ativa, descaminho, crimes licitatórios, tributários, crimes contra o sistema financeiro nacional, crime de lavagem de dinheiro e crime de organização criminosa.

Quantos aos requisitos para a concessão do acordo de não persecução penal estabelecido no art. 28-A, do CPP, serão condicionantes especificas sendo ajustadas de forma alternativa e cumulativa, portanto, caberão às partes interessadas no acordo realizar uma espécie de “check list” para seu devido preenchimento de tais requisitos, conforme análise do juiz, que homologará o acordo.
 
Assim temos os seguintes requisitos previstos em lei, como:

a)   Reparar o dano ou restituir a coisa à vítima, salvo se houver a impossibilidade de fazê-lo:

Citamos um exemplo típico, um crime tributário que o sujeito confessa o crime e ainda efetua o pagamento dos valores, ainda que de forma fracionada com o parcelamento do débito perante o órgão tributante competente.

No entanto, há situações em que a reparação do dano ou mesmo a restituição da coisa à vítima torna-se impossível, no entanto, não significa que o critério de reparação possa ser empecilho ao acordo, desde que a parte interessada consiga provar a referida impossibilidade de reparação.

b)   Renunciar voluntariamente a bens e direitos indicados pelo Ministério Público como instrumentos, produto ou proveito do crime:

Interessante observação se deve pela harmonização da condição anterior referente à reparação do dano, sendo que a renuncia voluntária a bens e direitos ficam a cargo do Ministério Público indicar nos termos do acordo que, em verdade, seria um ato de “abrir mão” dos bens e direitos provenientes do crime, entretanto, não significa que estes sejam de forma voluntária e até gera estranheza a questão de “renunciar voluntariamente”, pois se o individuo não fizer, de modo algum será beneficiado pelo acordo.

c)   Prestar serviço à comunidade ou entidades públicas por período correspondente à pena mínima cominada ao delito diminuída de um a dois terços, em local a ser indicado pelo juízo da execução, na forma do art. 46 do Código Penal:

Realmente, o texto legal é claro no sentido que, o individuo beneficiado pelo acordo de não persecução penal deverá prestar serviço comunitário ou de entidades públicas pelo período da pena mínima do crime acometido, sendo reduzida de um dois terços, em local indicado pelo juiz de execuções.
Por exemplo, a pena mínima será de um ano referente ao crime específico, logo, a prestação de serviço à comunidade será reduzida de um terço, correspondente a 121,66 dias e se for um ano bissexto será 122 dias.

d)   Pagar prestação pecuniária, a ser estipulada no artigo 45 do Código Penal, a entidade pública ou de interesse social, a ser indicada pelo juízo da execução, que tenha, preferencialmente, como função proteger bens jurídicos iguais ou semelhantes ao aparentemente lesados pelo delito:

É necessário observarmos que, a alteração legislativa absorve mais funções do juiz de execução penal, visto que poderá escolher o destino dos valores inerentes à prestação pecuniária da entidade pública ou de interesse social. Ademais, menciona a alteração legislativa que deverá seguir em consonância ao disposto no artigo 45 do CP, no qual estabelece que a importância fixada não poderá ser inferior a um salário mínimo, nem superior a 360 salários mínimos, sendo que o valor pago será deduzido do montante de eventual condenação em ação de reparação civil.

e)   Cumprir, por prazo determinado, outra condição indicada pelo Ministério Público, desde que proporcional e compatível com a infração imputada:

A crítica que se faz sobre esta alteração legislativa diz respeito especialmente uma margem ampla de atuação do Ministério Público, ao passo que, na prática será necessária à observância do princípio da legalidade estrita ou cerrada, ou seja, não poderá de modo algum haver uma interpretação ampliativa do alcance normativo, por se tratar de norma penal, ainda que a norma traga em seu espírito esta vontade.

Além do mais, qualquer outra condição indicada pelo Ministério Público deverá passar ao crivo do juiz que poderá rejeitar a homologação judicial do acordo de não persecução penal se considerar determinada condição inadequada, insuficiente ou abusiva, no qual serão devolvidos os autos ao MP para que seja reformulada a proposta de acordo, com a concordância do investigado e seu defensor (art. 28-A, § 5°, do CPP).

Importante observarmos que, a alteração legislativa trouxe quatro hipóteses taxativas que não se aplica o acordo de não persecução penal (art. 28-A, § 2°, do CPP). Vejamos tais situações com breves comentários:

I)             Em casos de transação penal perante os Juizados Especiais Criminais, conforme a Lei 9.099/95:

Por tratar se de lei especial e de rito distinto, por questão lógica é inaplicável o acordo de não persecução criminal;

II)           Quando o investigado for reincidente ou se houver elementos probatórios que indique condita criminal habitual, reiterada ou profissional, exceto se insignificantes as infrações penais pretéritas:

Teceremos algumas considerações.

Primeiramente, a alteração legislativa nada diz respeito se o beneficiado for reincidente por crime especifico ou reincidente por qualquer crime, de forma genérica. Assim, aplicam-se as regras regrais contidas no artigo 63 do Código Penal: “verifica-se reincidência quando o agente comente novo crime, depois de transitar em julgado a sentença que no País ou no estrangeiro, o tenha condenado por crime anterior”

         Desta forma, temos os seguintes requisitos para que seja considerada a reincidência:

1)   Prática de crime anterior, no Brasil ou no exterior, independentemente se crime doloso, culposo, tentado ou consumado;

2)   Transito em julgado de sentença penal condenatória.

3)   Cometimento de nova infração penal.

Interessante pontuarmos que, a pena imposta ao crime cometido anterior não haverá a interferência direta na reincidência, ou seja, considerará pena privativa de liberdade, restritiva de direito, assim como, a pena de multa.

Por certo, a reincidência tem efeitos temporários não devendo prevalecer a condenação anterior, se entra a data do cumprimento ou extinção da pena e a infração posterior tiver decorrido período de tempo superior a 5 (cinco) anos, computado o período de prova da suspensão ou do livramento condicional, se não ocorrer a revogação (art. 64, I, CP). Por exemplo: em 2005, Tibúrcio é condenado de forma definitiva pelo crime de homicídio ao cumprimento de pena de 10 anos de reclusão, sendo que em 2015 teve seu integral cumprimento de pena. Em 2020, pratica novo delito, não podendo o juiz reconhecer a reincidência, no entanto, poderá servir como maus antecedentes numa eventual condenação[1].

Feitas tais considerações, pode ser afirmar que, não será beneficiado do acordo de não persecução penal aquele que for reincidente.

No tocante da inaplicabilidade de não aplicação de acordo em casos que houver elementos de prova que indiquem a conduta criminal habitual, reiterada ou profissional, devemos atentar que, na prática, levará a tais elementos para o subjetivismo institucional permitindo ao Ministério Público recusar-se de ofertar ou mesmo aceitar o acordo de não persecução penal, pois os indicativos de provas de conduta criminal deverão apontar ou não a tais critérios e que a recusa do acordo advenha por meio de fundamentação do MP, assim como, todas as provas robustas de que o individuo pratique determinada atividade criminosa de forma habitual, reiterada ou profissional e que, via de consequência, será ofertada a denuncia nos autos, haja vista os indícios de autoria e materialidade.

Imagine-se que todos os requisitos foram devidamente preenchidos para o acordo de não persecução penal, no entanto, devido a pratica criminosa reiterada (não sendo considerada reincidência), o Ministério Público descobre por meio de provas que determinado individuo sempre vendeu produtos proveniente do crime, inclusive tem uma loja virtual e física, mas nunca respondeu pelo crime de receptação (art. 180, CP). Logo, o Ministério Público deverá ofertar a denuncia e recusar o acordo, mas que o individuo não seja reincidente.

III)         Não haverá aplicação do acordo de não persecução penal, quando o agente for beneficiado nos 5 (cinco) anos anteriores ao cometimento da infração, em acordo de não persecução penal

Por certo, não se trata de reincidente ou mesmo esteja praticando qualquer conduta criminosa, mas, a legislação coube por estabelecer um lapso temporal de cinco anos com a finalidade única do individuo beneficiar-se dos institutos penais quando assim bem entender, de modo que, aqueles criminosos tidos como contumazes não possam se beneficiar do acordo.

IV)        Não haverá aplicação do acordo de não persecução penal, nos crimes praticados no âmbito de violência doméstica ou familiar, ou praticados contra a mulher por razões da condição do sexo feminino, em favor do agressor.

Note-se que a alteração legislativa referente especialmente, ao crivo de proteção social aludindo que ninguém passará “a mão na cabeça” daqueles que praticarem violência domestica ou familiar, inclusive, em sua razão de ser, são direitos tidos indisponíveis no tocante a proteção à família.

No entanto, restou claro mais uma norma jurídica de proteção ao gênero feminino em face daqueles que assim agridem, levando a entender que, deverão ser aplicados os aspectos de punibilidade de forma seletiva, como ocorre no crime de feminicidio e também, sua aplicação integral a Lei Maria da Penha.

Neste sentido, a vedação de acordo nestes casos, sem sombra de dúvidas, que restou evidente o amparo e o tratamento material, sob o tecido social.
                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                     
Do Processo e Procedimentos do acordo de não persecução penal

O primeiro critério necessário alude-se como premissa ao princípio da formalidade, ou seja, o acordo de não persecução penal será formalizado por escrito e posteriormente, será firmado pelo Ministério Público, pelo investigado e por seu defensor (§3°, art. 28-A, CPP). É evidente também quanto à presença do princípio da voluntariedade, visto que a parte interessada também terá que manifestar-se de forma expressa ao requerer e a assinar o acordo, ainda que com a presença técnica de seu defensor. Veja que, é necessária a presença do defensor (advogado em sentido amplo, visto que temos advogados públicos e particulares) e a sua ausência poderá gerar a nulidade do ato, assim como o membro do Ministério Público.

Posteriormente, formalizado o acordo, será realizada audiência homologatória, no qual o juiz deverá verificar que tal ato foi de forma voluntária, ou seja, sem nenhum vício de consentimento. Ademais, o juiz ouvirá o investigado na presença de seu defensor (advogado) e, observará se o acordo está conforme a lei (§4°, art. 28-A, CPP).

Homologado o acordo, o juiz remeterá os autos ao Ministério Público para que se inicie sua execução perante o juízo de execução penal (§6, art. 28-A, CPP). Em verdade, traz certa estranheza que a legislação traga este rito ao devolver os autos para o MP, como se o órgão fosse o responsável para o cumprimento da execução penal, sendo que a fase de execução penal é pertencente à tutela jurisdicional, inclusive não cabe ao MP por ato discricionário fazer cumprir com o acordo ou não, sendo ato devidamente delineado, vinculado e precedido por etapas. Portanto, não haveria sentido o juiz encaminhar os autos para o MP, ao menos que nesta fase de cumprimento do acordo assuma o real papel de fiscal do acordo celebrado.

Noutro interessante ponto na fase de acordo de não persecução penal, diz respeito do ato do juiz que deverá utilizar-se em critérios previstos em lei, por ato vinculado, e devolver os autos ao Ministério Público quando entender que o acordo for inadequado, insuficiente ou impondo condições abusivas em face do beneficiado (§ 5°, art. 28-A, CPP). Ao que parece, a função do juiz na homologação é buscar um equilíbrio no acordo entre o MP e o beneficiado, inclusive, diante da recusa da homologação do acordo por ato do juiz, também devolvidos os autos para o MP, no qual terá que analisar se complementa as investigações ou mesmo oferecerá a denuncia (§8°, art. 28-A, CPP).

Devido ao princípio da transparência, a vítima será intimada, tanto na homologação do acordo, quanto ao descumprimento (§ 9° art. 28-A, CPP). Na prática, pessoas jurídicas de direito público e privado também deverão ser intimadas por meio de seu representante legal, aplicando-se subsidiariamente as regras contidas no Código de Processo Civil, visto que é parte interessada no acordo ou descumprimento.

No tocante ao cumprimento e descumprimento do acordo, temos as seguintes regras. Em caso de descumprimento de qualquer das condições estabelecidas, o Ministério Público se manifestará nos autos justificando a rescisão do acordo celebrado e oferecerá a denuncia, dando impulso ao processo (§ 10° art. 28-A, CPP).

O descumprimento poderá ser utilizado pelo MP como justificativa para eventual não oferecimento da suspensão condicional do processo (§ 11° art. 28-A, CPP).

Nos termos do art. 89 da Lei nº 9.099/1995, o sursis processual aplica-se aos crimes – sejam de menor potencial ofensivo ou não e também contravenções penais, cuja pena mínima cominada for igual ou inferior a um ano, desde que o acusado não esteja sendo processado por outro crime ou não tenha sido condenado por outro crime. Percebe-se neste aspecto que há conflito normativo, tendo em vista que, o sursis envolve a análise de aspectos subjetivos da personalidade do acusado, especialmente quanto à culpabilidade, antecedentes, conduta social e personalidade do agente, assim como os motivos e as circunstâncias do delito, que poderão envolver diretamente no oferecimento ou não do sursis. Portanto, o simples descumprimento do acordo de não persecução penal de modo algum poderia envolver aos aspectos relacionados à suspensão condicional do processo, devido a requisitos específicos deste instituto, no qual devem obrigatoriamente ser analisados perante o caso concreto.

Se o Ministério Público recusar a propor o acordo de não persecução penal, o investigado poderá encaminhará os autos para a instância de revisão ministerial para fins de homologação (artigos 28 e 28-A, § 13° CPP).

Por derradeiro, se cumpridas todas as condições previstas no acordo de não persecução penal, o juízo competente (Vara de Execuções Penais) decretará a extinção da punibilidade (§ 13° art. 28-A, CPP), sendo que a celebração e o cumprimento do acordo não constarão na certidão de antecedentes criminais, ao menos que o agente tenha sido beneficiado nos cinco anos anteriores ao cometimento da infração, em acordo, transação penal ou suspensão condicional do processo (art. 28-A, III, § 2°, CPP).








[1] STF, Primeira Turma, ARE 925136, AgR, j. 02.09.2016.

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