Vídeo sobre o tema: https://youtu.be/TUzmNhbSxmg
A extradição
do estrangeiro é um dos temas mais sensíveis, apesar de não se tratar de
assunto atual, nos remete a ideia de um embate entre o direito de soberania do
Estado brasileiro e de outro, o individuo.
Na maioria das
vezes, este embate se prepondera muito mais ao Estado do que particular em prol
do interesse coletivo, entretanto, as decisões recentes dos Tribunais Superiores
retratam bem a relativização de forças, dando contornos muito mais robustecidos
cujo norte é a aplicação e a efetividade de direitos humanos fundamentais.
Inicialmente,
devemos definir a extradição,
como:
Extradição é a Forma de cooperação jurídica na esfera
criminal internacional, no qual o Estado requer o envio de um indivíduo para
que seja julgado em seu País de origem ou mesmo, possa cumprir a pena, se já
condenado.
Em
nossa Constituição Federal de 1988, a extradição está prevista em seu art. 5°,
LI e LII, que prescreve aspectos centrais
de proteção aos brasileiros numa eventual extradição, sendo possível apenas a
extradição do naturalizado em caso de crime comum, antes da naturalização,
assim como, se comprovado envolvimento de trafico ilícito de entorpecentes e
drogas afins.
Outra proteção
prevista constitucionalmente, diz respeito a não extradição em casos de crime
político e de opinião.
O brasileiro nato não pode ser
extraditado.
É preciso
deter uma breve atenção ao julgado do STF que entendeu que o brasileiro nato
pode ser extraditado, desde que opte, de
forma voluntária a nacionalidade estrangeira[1], na hipótese do brasileiro
adquirir o green card e adquirir a
nacionalidade americana.
Ainda que a
referida decisão seja polêmica, é passível de alteração entendimento
jurisprudencial podendo ser revisitada pela Corte para análise de casos
específicos, inclusive deverá ser interpretada de acordo com a Lei n. 13.445/2017(Lei
de Migração).
MODALIDADES DE EXTRADIÇÃO
Além de
compreendermos sobre a definição da extradição, existem também quatro modalidades:
a) Extradição Ativa;
b) Extradição Passiva
c) Extradição Instrutória e
d) Extradição Executória:
a)
Extradição
ativa: quando o Estado brasileiro requerer a outro País a extradição de criminoso
foragido pela justiça brasileira;
Nos termos do
art. 88 e seguintes da Lei de Migração: todo
pedido que possa originar processo de extradição em face de Estado estrangeiro
deverá ser encaminhado ao órgão competente do Poder Executivo diretamente pelo
órgão do Poder Judiciário responsável pela decisão ou pelo processo penal que a
fundamenta.
A referida lei
estabelece a competência ao órgão do Poder Executivo o papel de orientação,
de informação e de avaliação dos elementos formais de admissibilidade dos
processos preparatórios para encaminhamento ao Estado requerido.
Além disso,
incumbe aos órgãos do sistema de Justiça vinculados ao processo penal gerador
de pedido de extradição a apresentação de todos os documentos, manifestações e
demais elementos necessários para o processamento do pedido, inclusive suas
traduções oficiais.
Em relação ao procedimento, o pedido deverá
ser instruído com cópia autêntica ou com o original da sentença condenatória ou
da decisão penal proferida, conterá indicações precisas sobre o local, a data,
a natureza e as circunstâncias do fato criminoso e a identidade do extraditando
e será acompanhado de cópia dos textos legais sobre o crime, a competência, a
pena e a prescrição.
Observa-se
que, sem tais documentos de modo algum deverá ser realizada a extradição por se
tratar de requisitos formais e, se ausentes caracterizam-se como manifestamente
ilegais.
b) Extradição passiva: decorre quando um
País estrangeiro solicita ao Brasil a extradição de foragido que está em
território nacional.
Este instituto
está previsto no art. 89 da Lei de Migração, ao estabelecer que o pedido de
extradição originado de Estado estrangeiro será recebido pelo órgão competente
do Poder Executivo e, após análise dos requisitos estabelecidos em lei,
encaminhará a autoridade judiciária competente.
Se não
atendidos os requisitos em lei, o processo será arquivado, devendo o órgão
fundamentar sua decisão.
c) Extradição instrutória: decorre quando
houver um processo em curso no País de origem;
d) Extradição executória: quando o
extraditando deverá cumprir pena já imposta pelo Estado requerente, podendo a
autoridade competente solicitar ou autorizar a transferência de execução,
devendo-se respeitar o princípio do non bis in idem, conforme estabelecido no
art. 100, caput, da Lei de Migração.
Diante das
modalidades de extradição apresentadas, surge uma breve indagação, afinal, existe extradição sem que tenha sido
realizado tratado internacional?
A resposta é a
seguinte:
Se o ato de
extradição se dá por meio de cooperação jurídica entre Estado brasileiro e
Estado estrangeiro, via de consequência deverá ser compreendida em sentido
amplo, pois, mesmo que os Estados não tenham retificado qualquer acordo ou
tratado internacional, poderá ser efetivada a extradição.
Este ato se perfaz
com a denominada promessa de
reciprocidade ou acordo diplomático entre os dois Estados para a entrega de
determinado indiciado, mesmo sem as devidas formalidades legais de um tratado
internacional.
A Lei de
Migração permite a que seja aplicada a promessa de reciprocidade recebida pela
via diplomática, quando se tratar de prisão cautelar do extraditando, conforme
estabelece o art. 84, caput, § 2°.
Conforme a
jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, que tem se debruçado há um tempo,
ao conferir quanto à possiblidade de
aplicação da extradição monocrática
(v. Extradição n. 1476/DF), que se efetiva com a declaração de concordância espontânea do extraditando, seguindo a
premissa de que um tratado internacional firmado previamente que assim
autorize, devendo ser assistido por advogado ou defensor, no qual o Relator do
processo de extradição julgar sem levar ao plenário do STF.
Ademais, entendemos
que a extradição monocrática não é uma
modalidade, devendo ser considerado como um mero procedimento, inclusive, é disciplinado como Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal,
permitindo-se maior celeridade processual, ao invés do processo ter que passar
ao crivo do plenário para que seja julgado por todos os Ministros por não
possuir repercussão geral.
CONDIÇÕES PARA A CONCESSÃO DE EXTRADIÇÃO
(art. 83, inc. I e II, da Lei de Migração e
Regulamento, art. 263, I e II).
De forma
objetiva, podemos destacar duas
condições necessárias para a concessão da extradição:
1)
Crime cometido no território do Estado
requerente ou serem aplicáveis ao extraditando as normas penais do Estado;
2)
Estar o extraditando respondendo a processo
investigatório ou a processo penal ou ter sido condenado pelas autoridades
judiciárias do Estado requerente a pena privativa de liberdade.
É preciso
afirmar que, se não preenchidas as condições previstas em lei em hipótese
alguma poderá efetivar o ato extraditório, sendo uma tarefa do Supremo Tribunal
Federal que será observar todos os requisitos formais num todo, atuando como uma
espécie de juízo de delibação.
LIMITAÇÃO DEFENSIVA DO EXTRADITANDO
No tocante a
defesa do extraditando, advogado ou defensor poderá apenas apresentar os vícios
inerentes ao processo no prazo de 10 (dez) dias contado da data do
interrogatório, não se admitindo que tratar sobre os fatos ocorridos como base
de argumentos.
O art. 91, §
1º, da Lei de Migração, traça como um aspecto
limitativo da defesa do extraditando, devendo apenas ater-se com tais
pontos, como:
(i)
A
identidade da pessoa reclamada
(ii)
Defeito
de forma de documento apresentado ou
(iii)
Ilegalidade da extradição
Por critérios
lógicos, a defesa pode apresentar eventual violação de direitos do extraditando
previamente estabelecidos na Constituição Federa de 1988 e até mesmo violação
de tratados em direitos humanos que o Brasil faça parte, seja acordos
bilaterais ou multilaterais.
Neste passo, a
jurisprudência do Supremo Tribunal Federal já estabeleceu alguns parâmetros
específicos que, diante de um caso concreto necessita de uma análise quando
houver violação de direitos humanos, como[2]:
a) A
probabilidade concreta de imposição de uma das penas vedadas pelo ordenamento
jurídico nacional e internacional;
b) Se
existem garantias válidas de que o país requerente irá eventualmente adimplir
com o dever de comutar essas penas em sanções juridicamente admitidas pelo
Brasil e pela comunidade internacional;
c) Se
há garantias mínimas de um julgamento justo e imparcial no qual essas
obrigações e os direitos humanos do extraditando sejam respeitados.
Podemos citar ainda
que, em inúmeros julgados do STF, a referida Corte já considerou como inviável
a extradição de estrangeiro que tenha que cumprir pena de morte ou de caráter perpétuo
no seu País de origem, ou mesmo qualquer outra pena contrária ao ordenamento
jurídico brasileiro[3].
Por outro
lado, o STF estabeleceu requisitos tidos como essenciais para o deferimento de
extradição passiva, sem que na prática violem preceitos constitucionais e
internacionais.
Elencaremos os
principais pontos:
1)
Não
sendo o extraditando brasileiro nato, e se naturalizado o crime tiver sido
cometido antes da naturalização ou, a qualquer momento, no caso de comprovado
envolvimento em tráfico de entorpecentes.
Neste caso,
admite-se a extradição se comprovado o envolvimento em trafico de entorpecentes
na forma executória de brasileiro
naturalizado após a naturalização, exigindo que o Estado que o requereu
apresente a certidão de transito em julgado de condenação criminal para que
possa se efetivar a extradição.
2)
Não
sendo caso de crime político ou de opinião
Segundo o STF,
o crime
político é caracterizado quando existe a motivação para tal ato sendo
apto a violar elemento subjetivo do cidadão daquele País, como também, haver a
violação potencial ou real de valores tidos como fundamentais do Estado.
Podemos citar
o caso em que se reconheceu como crime político, o extraditando acusado de
transmitir ao Iraque segredo do Estado Requerente (Alemanha), utilizável em
projeto de desenvolvimento de armamento nuclear, no qual foi não deferida a
extradição do estrangeiro.[4]
Ocorre que, em
se tratando de crime de terrorismo,
o STF preconizou seu entendimento que não é a mesma figura jurídica do crime
político[5].
Portanto, independentemente
de suas formas realizadas, a Lei de Migração (art. 82, §4°) estabeleceu que a
Corte Constitucional somente deixará de considerar como crime político o
atentado contra chefe de Estado ou quaisquer autoridades, bem como crime contra
a humanidade, crime de guerra, crime de genocídio e terrorismo.
3)
Respeito
ao princípio do devido processo legal
Assim como
toda espécie processual, o princípio do
devido processo legal também deve ser obedecido na extradição, pois se fosse
de modo diverso, a lei não estabelecesse tais regras processuais, como a
proibição de julgamento por juízo de exceção, por exemplo.
4)
Se a
comutação de pena originária no País do extraditando não for superior do que
prevê no Brasil.
Antes do
Pacote Anticrime, as penas no Brasil não poderia ser superior a 30 (trinta)
anos, porém, com a entrada em vigor da 13.964/2019, O tempo de cumprimento das
penas privativas de liberdade não pode ser superior a 40 (quarenta) anos.
O STF entendeu
que, a comutação de pena de caráter perpétuo é requisito implícito previsto constitucionalmente para que a extradição seja deferida, cabendo ao Estado estrangeiro
comprometer-se em comutar a pena corporal, as de caráter perpétuo ou as de
morte em pena privativa de liberdade.
No
aprofundamento dos estudos, surge um embate entre considerar a pena não
superior a 40 (quarenta) anos, conforme prevê o art. 75 do Código Penal,
inserido pelo Pacote Anticrime, ou, considerar o art. 96, III, da Lei de
Migração, que se respeite o limite máximo de cumprimento de pena de 30 (trinta)
anos.
Cumpre
observar que, não há uma posição consolidada acerca de qual regramento será
aplicado, entretanto, entendemos ser mais adequado aplicar ao estabelecido no
art. 96, III, da Lei de Migração, por se tratar de norma especial e seu
elemento condicional se amolda perfeitamente com o ato negativo de não se
efetivar a entrega do extraditando sem que o estado requerente assuma
compromissos específicos, dentre eles, o de comutar a
pena corporal, perpétua ou de morte em pena privativa de liberdade, respeitado
o limite máximo de cumprimento de 30 (trinta) anos.
Por outro lado, não se pode dizer que o Art. 75 do Código Penal
atual revogou tacitamente o art. 96, III, da Lei de Migrações, tendo em vista
que cabe ao Congresso Nacional alterar os atributos específicos, para fins de
harmonização legislativa entre os diplomas normativos.
Ademais, existem outros fatores que possam almejar a
extradição do estrangeiro, como a reciprocidade entre o Estado brasileiro e
Estrangeiro, se ausente tratado ou acordo internacional, devendo o Brasil
solicitar extradição em situações similares.
Não será concedida a extradição se caracterizado o ne
bis in idem, ou seja, se o extraditando estiver respondendo um processo
ou já houver sido condenado ou absolvido no Estado brasileiro pelo mesmo fato
do pedido de extradição.
Noutro ponto de extrema importância diz respeito quanto a impossibilidade de extraditar um
estrangeiro quando a lei brasileira
impuser ao crime pena de prisão inferior a 2 (dois) anos, nos termos do
art. 82, IV, da Lei n. 13.445/2017.
[1]
STF. 1ª Turma. MS 33864/DF, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 19/4/2016.
[2]
EXT 1426 ED / DF
[3] STF - Ext: 633 CH,
Relator: CELSO DE MELLO, Data de Julgamento: 28/08/1996, Tribunal Pleno, Data
de Publicação: DJ 06-04-2001 PP-00067 EMENT VOL-02026-01 PP-00088
[4]
Ext 700, Rel. Min. Octavio Gallotti, julgamento em 4-3-1998, Plenário, DJ de
5-11-1999.
[5]
Ext 855, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 26-8-2004, Plenário, DJ de
1º-7-2005.