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13/04/2023

COMO COMPROVAR EFETIVO PREJUÍZO PARA INDENIZAÇÃO POR VAZAMENTO DE DADOS?

Análise conforme decisão recente do STJ.

A questão que devemos inicialmente observar refere-se sobre a caracterização por vazamento de dados,  que ocorre quando informações confidenciais e pessoais são divulgadas ou expostas sem autorização ou consentimento do titular desses dados. Essas informações podem incluir dados pessoais, como nome, endereço, data de nascimento, informações de contato, número de CPF, RG ou passaporte, dados bancários e informações de cartão de crédito, entre outros.

Em relação às formas de vazamento de dados, pode se dar por ataques cibernéticos a sistemas de empresas, roubo ou perda de dispositivos móveis ou armazenamento físico, erro humano, entre outras causas.

As consequências decorrentes de vazamentos de dados podem ser graves, como a exposição de informações pessoais e sensíveis, a possibilidade de fraudes financeiras, o uso indevido de informações para marketing ou monitoramento, ou mesmo a perda de privacidade e segurança para o indivíduo afetado.

Na prática, as empresas são responsáveis pela proteção e segurança dos dados de seus clientes e usuários, e a divulgação de informações sem autorização pode resultar em sanções e multas, além de possíveis processos judiciais por danos morais e materiais.

É neste sentido que empresas e organizações adotem medidas de segurança adequadas para proteger os dados de seus clientes e usuários e garantir a privacidade e a segurança dessas informações.

E como a Legislação trata sobre o tratamento de dados?

 A Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) que entrou em vigor em setembro de 2020, e tem como objetivo regulamentar a coleta, armazenamento, tratamento e compartilhamento de dados pessoais por empresas e organizações, garantindo a privacidade e a proteção dos dados dos cidadãos brasileiros.

É preciso observar que, o vazamento de dados pessoais é uma violação da LGPD e pode resultar em sanções e multas para as empresas ou organizações responsáveis pelo tratamento desses dados.

Conforme mencionado, as empresas e organizações tem a obrigação prevista em lei para implementar medidas de segurança adequadas para proteger os dados pessoais, como a adoção de políticas de segurança, a implementação de tecnologias adequadas de proteção de dados, a realização de auditorias regulares e o treinamento de funcionários para lidar com dados pessoais.

Assim, em caso de vazamento de dados pessoais, a LGPD exige que as empresas e organizações afetadas comuniquem imediatamente aos titulares dos dados e à Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) sobre a violação, e adotem as medidas necessárias para minimizar os danos e prevenir novos vazamentos.

Note-se que a LGPD tem como objetivo garantir a proteção dos dados pessoais dos cidadãos brasileiros e incentivar a adoção de boas práticas de segurança da informação por empresas e organizações, criando um ambiente mais seguro e confiável para a coleta, armazenamento e compartilhamento de dados pessoais.

E o que a Justiça tem decidido sobre indenização por vazamento de dados?

Apesar de ser uma falha indesejável no tratamento de informações pessoais conforme mencionado anteriormente, o vazamento de dados não tem a capacidade, por si só, de gerar dano moral indenizável, segundo entendimento recente do Superior Tribunal de Justiça.

         É neste ponto que podemos destacar que o Tribunal decidiu, sobre eventual pedido de indenização será necessário que o titular dos dados comprove o efetivo prejuízo gerado pela exposição dessas informações.

Desta forma, nas lições que jurisprudência exige até o momento, é a existência de um prejuízo decorrente de vazamento de dados. Podemos citar, por exemplo, a divulgação de informações pessoais e sensíveis de um indivíduo, como dados bancários, informações de saúde ou dados de identificação, que podem ser usados para fraudes, phishing ou roubo de identidade.

Entendemos como prejuízos financeiros, como a abertura de contas fraudulentas, cobranças indevidas ou compras não autorizadas. Também pode levar a prejuízos psicológicos, como a sensação de invasão de privacidade e a preocupação com possíveis consequências futuras.

Ademais, o efetivo prejuízo para fins de indenização se refere aos danos reais e comprováveis sofridos pela vítima em decorrência de um evento ou situação que deu origem a uma ação de indenização. Em outras palavras, é a demonstração de que a vítima sofreu algum tipo de prejuízo em decorrência do fato ocorrido.

No caso de uma ação de indenização por vazamento de dados, por exemplo, o efetivo prejuízo pode incluir os danos materiais, como prejuízos financeiros decorrentes de fraudes ou outras atividades ilícitas realizadas com os dados vazados, e os danos morais, como o constrangimento, a angústia e a violação da privacidade.

Entretanto, aos danos morais, o STJ reconheceu que o dano moral não é presumido, sendo necessário que o titular dos dados demonstre ter havido efetivo dano com o vazamento e o acesso de terceiros.

Vejamos o breve argumento do Ministro Francisco Falcão (AREsp 2.130.619)[1]:

"Diferente seria se, de fato, estivéssemos diante de vazamento de dados sensíveis, que dizem respeito à intimidade da pessoa natural. No presente caso, trata-se de inconveniente exposição de dados pessoais comuns, desacompanhados de comprovação do dano", concluiu o ministro ao acolher o recurso da Eletropaulo e restabelecer a sentença.

Nesses casos, é possível que o indivíduo prejudicado por vazamento de dados ainda possa buscar indenização por danos morais e/ou materiais, porém, exige-se na prática que a empresa responsável pelo vazamento de dados arque com as consequências financeiras e emocionais decorrentes do incidente, cabendo ao lesado à demonstração de dano.

Por fim, o valor da indenização pode variar dependendo da gravidade do vazamento e do impacto causado ao indivíduo afetado.

 

É possível que o STJ altere seu entendimento neste caso?

Regra geral, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) é estabelecida através de seus julgamentos, que interpretam e aplicam a legislação federal, bem como a Constituição Federal. A alteração da jurisprudência do STJ só pode ocorrer através de uma mudança de entendimento pelos ministros da Corte em julgamentos futuros ou pela atuação do legislador.

Os julgamentos do STJ são proferidos por uma composição colegiada de ministros, que se reúnem para decidir os casos que lhes são apresentados. Cada julgamento é fundamentado em argumentos jurídicos, doutrina e jurisprudência, além da interpretação da legislação aplicável ao caso.

Se houver um caso em que a jurisprudência do STJ esteja sendo questionada e os ministros decidam mudar o entendimento, a jurisprudência será atualizada a partir da publicação do acórdão do julgamento, que passará a ser considerada a nova orientação da Corte.

No entanto, vale lembrar que a jurisprudência não é algo imutável, mas sim uma construção contínua que se adapta às mudanças sociais, políticas e econômicas do país. Portanto, a jurisprudência do STJ pode ser alterada ao longo do tempo, desde que haja uma nova interpretação do direito, inclusive, a negativa de dano moral por vazamento de dados é consolidada no sentido de que nem todo vazamento de dados gera automaticamente o dever de indenizar por danos morais.

Neste ponto, para que se configure a indenização, é necessário que o vazamento seja capaz de gerar efetivamente uma lesão aos direitos da personalidade do titular dos dados, como a privacidade, a intimidade, a honra ou a imagem.

Observe-se que, tecnicamente alterar essa jurisprudência, seria necessário que um novo caso, com argumentos e fatos diferentes daqueles que já foram analisados pela Corte, seja levado ao STJ e que os ministros decidam de forma diferente em relação à indenização por danos morais. A partir desse julgamento, a jurisprudência poderia ser alterada, nesse sentido.

Não podemos deixar de frisar que,  a jurisprudência do nosso País é pautada num processo dinâmico, que pode ser alterado ao longo do tempo em razão da evolução da sociedade e do próprio entendimento dos tribunais.

Dessa forma, é possível que a jurisprudência do STJ sobre a negativa de dano moral por vazamento de dados seja modificada no futuro (ainda que próximo), mesmo sem um novo julgamento específico sobre o assunto.



24/03/2022

A DESCONSIDERAÇÃÇO DA PERSONALIDADE JURIDICA DE PESSOA JURÍDICA EM CASOS RELACIONADOS À FRAUDE DE CRIPOTOMOEDAS

Assista ao vídeo sobre o tema acima.


 

         Imagine a seguinte situação: uma empresa de investimentos em criptomoedas causa danos financeiros em face de diversos consumidores, no qual criam obstáculos para ressarci-los.

         Diante deste caso hipotético, o consumidor ingressa com ação judicial com o objetivo de ser ressarcidos aos prejuízos materiais sobre o valor integralmente investido, bem como, aos danos morais devidos caracterizar-se por pirâmide financeira e fraude.

         Antes de trazermos o apontamento necessário para este caso hipotético, é preciso claramente afirmar que nem todas as empresas que atuam no setor de criptomoedas utilizam o engodo no mercado, entretanto, cabe ao consumidor investigar a idoneidade da empresa previamente.

         É importante compreendermos que, a desconsideração da personalidade jurídica é uma forma (teoria) que se busca desprender quanto à responsabilidade da empresa e imputando aos seus sócios ou administradores, se estes agirem com abuso, seja por desvio de finalidade ou confusão patrimonial.

          Cumpre observar também, que existem duas teorias de desconsideração da personalidade jurídica, a Teoria Maior e a Teoria Menor.

        

Na Teoria Menor, apenas decorre da insolvência do devedor para com os credores, indiferentemente de se analisar quanto aos fatores que ensejaram a sociedade a deixar de se obrigar perante terceiros.  

Esta teoria é comumente empregada em casos de  insolvência ou falência da pessoa jurídica, danos ambientais e nas relações de consumo. Basta o prejuízo para caracterizar como Teoria Menor.

A base jurídica da Teoria Menor possui previsão no art. 28, § 5° do Código de Defesa do Consumidor e o art. 4° da Lei n. 9.605/1998.

A Teoria Maior se caracteriza quando se provado o desvio de finalidade da pessoa jurídica ou confusão patrimonial. Podemos citar o art. 50 do Código de Civil de 2002, que prescreve:

Art. 50. Em caso de abuso de personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações seja estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica.

Nesta Teoria acima descrita, o abuso de personalidade jurídica se perfaz quando houver o desvio de finalidade ou confusão patrimonial, sendo suficiente um dos dois elementos para a sua aplicação, ou seja, não são requisitos cumulativos.

 

Sobre os efeitos da aplicação da desconsideração da personalidade jurídica

 

De fato, seja qual for a Teoria aplicada com sua respectiva legislação, seguramente, não afeta a personalidade da pessoa jurídica, mas sim, os efeitos patrimoniais da personalidade, especialmente o princípio da autonomia patrimonial que protege o patrimônio das pessoas naturais que integram ou administram a pessoa jurídica, afastando-a de forma temporária em decorrência da fraude.

A partir desta perspectiva surge uma indagação, afinal: Todos os sócios e administradores são atingidos pela desconsideração da personalidade jurídica?

A interpretação do art. 50, caput, do Código Civil de 2002, que somente os bens particulares de administradores e sócios que abusaram da personalidade jurídica, cabendo quem alega comprova-los.

Conforme o Enunciado 07, da Jornada de Direito Civil: Só se aplica a desconsideração da personalidade jurídica quando houver a prática de ato irregular e, limitadamente, aos administradores ou sócios que nela hajam incorrido[1].

Desta forma, apresentados os apontamentos iniciais sobre a desconsideração da personalidade jurídica, podemos adentrar ao presente tema proposto com base nas decisões dos Tribunais.

         É preciso compreender que, a atuação irregular pelas empresas que poderá ensejar numa aparente fraude e a consequência será a desconsideração da personalidade jurídica com único objetivo de evitar que os consumidores que adquiriram as Criptmoedas (Bitcoins) não fiquem sem reaver sobre os valores pagos,  justamente para preservar o patromônio daquele que foi lesado e apontando a responsabilização do sócio ou administrador que promoveu a referida fraude.

         Podemos citar, por exemplo, na hipótese do consumidor não conseguir mais o acesso da plataforma ou sistema online que constam as informações da cripmoeda adquirida e para fim de preservar o patrimônio do consumidor, coube por bem desconsiderar a personalidade jurídica e bloquear os bens dos sócios e administradores da empresa, conforme já decidiu o Tribunal de Justiça do Paraná em julgado recente[2].

         Perceba que, neste caso não se aplica a teoria maior, mas sim a teoria menor, levando-se em consideração a inexistência de patrimônio suficiente para garantir  o cumprimento das obrigações da pessoa jurídica, sendo irrelevante a caracterização do abuso por parte dos sócios e administradores.

         A fundamentação jurídica para aplicação da teoria menor a consequente desconsideração da personalidade jurídica possui previsão nos artigos 28, parágrafo 5º, do Código de Defesa do Consumidor, e 4º da Lei dos Crimes Ambientais (Lei 9.605/1998).

         Além disso, existem inúmeras empresas que prestam serviços de intermediação na compra e venda de criptomoeda, mediante remuneração, a destinatário final. Logo, a consequência será aplicar a integralidade do Código de Defesa do Consumidor.

         Noutro ponto prático é a pessoa lesada registrar um boletim de ocorrência ou mover uma ação de natureza criminal se, de fato houver indícios de pirâmide financeira da empresa de investimentos ou intermediação, pois, pode trazer um peso ainda maior na decisão do juiz cível em relação ao ressarcimento dos valores e a desconsideração da personalidade jurídica.

         Interessante leitura de um julgado recente do Tribunal de Justiça de São Paulo, retratando bem a realidade de uma pessoa que não conseguiu resgatar os valores de bitcoins retidos pela empresa que teve que promover uma ação judicial para ser ressarcido e durante ao processo o juiz desconsiderou a personalidade jurídica como forma de trazer maior efetividade na referida devolução em favor do consumidor. Vejamos:

 

RECURSO – APELAÇÃO CÍVEL – GESTÃO DE NEGÓCIOS – AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL CUMULADA COM DEVOLUÇÃO DE VALORES E DESCONSIDERAÇÃO DE PERSONALIDADE JURÍDICA. Justiça gratuita pleiteada pelos requeridos apelantes. Demandados que comprovam a insuficiência de recursos, enquanto que o recolhimento de custas possui o condão de prejudicar sua própria subsistência. Concessão. Possibilidade. Acolhimento do pleito da conceder ao requerente os benefícios da gratuidade processual RECURSO – APELAÇÃO CÍVEL – GESTÃO DE NEGÓCIOS – AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL CUMULADA COM DEVOLUÇÃO DE VALORES E DESCONSIDERAÇÃO DE PERSONALIDADE JURÍDICA – MATERIA PRELIMINAR. Cerceamento de defesa. Inocorrência. Não se constatada o cerceamento de defesa alegado. Há nos autos prova suficiente para deslinde da causa, o que dispensa a produção de qualquer outra. Matéria preliminar afastada. RECURSO – APELAÇÃO CÍVEL – GESTÃO DE NEGÓCIOS – AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL CUMULADA COM DEVOLUÇÃO DE VALORES E DESCONSIDERAÇÃO DE PERSONALIDADE JURÍDICA - MERITO. Investimentos em bitcoins. Incidência do Código de Defesa do Consumidor ao presente caso. Desconsideração da personalidade jurídica acertada, eis que existente obstáculo ao ressarcimento do prejuízo suportado pelo consumidor. Rescisão do pacto firmado entre as partes e devolução do valor pertencente ao autor. Possibilidade. Descumprimento contratual por parte das requeridas devidamente demonstrado. Ação julgada parcialmente procedente. Sentença mantida. Recurso de apelação dos requeridos não provido, majorada a verba sucumbencial com base no artigo 85, parágrafo 11, do Código de Processo Civil.

 

(TJ-SP - AC: 10087191920208260562 SP 1008719-19.2020.8.26.0562, Relator: Marcondes D'Angelo, Data de Julgamento: 13/09/2021, 25ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 13/09/2021)

         Em síntese, o instrumento da desconsideração da personalidade jurídica nos casos relacionados a crimes de pirâmide financeira e de empresas de criptomoedas são suficientes para preservação do patrimônio de pessoas lesadas.

A finalidade é evitar que os sócios e administradores resgatem todos os valores recebidos indevidamente e transfiram para pessoas físicas e não deixando que tais pessoas fiquem “a ver navios”, ou, na melhor das expressões, “ganhou, mas não levou!”.

 E, fatalmente, se assim não fosse, empobreceria o sistema de efetividade da Justiça em desfavor dos vulneráveis da relação consumerista, bem como, possibilitando que utilizem “laranjas” ou “testas de ferro”, nos contratos sociais, caracterizados estes meros administradores formais encobrindo os verdadeiros sócios e administradores de responsabilização.

 



[2] TJ-PR - AI: 00703101520208160000 Curitiba 0070310-15.2020.8.16.0000 (Acórdão), Relator: Denise Kruger Pereira, Data de Julgamento: 14/02/2022, 18ª Câmara Cível, Data de Publicação: 15/02/2022

13/10/2020

Banco digital deve indenizar cliente e restituir valores debitados por falha de segurança

 Valores foram debitados após cliente ter seu celular roubado. Ao decidir, magistrada concluiu que houve falha na prestação do serviço pelo banco.


Um banco digital brasileiro deverá restituir valores debitados da conta de um cliente que teve o celular roubado. A decisão é da juíza de Direito Claudia Carneiro Calbucci Renaux da 7ª Vara Cível de São Paulo ao constar que o serviço prestado pela instituição teve falhas por não proporcionar a segurança esperada pelo cliente. A instituição financeira também foi condenada a pagar danos morais.



Conforme a ação, o cliente teve o seu celular roubado em novembro de 2019, momento em que avisou imediatamente a operadora telefônica para que bloqueasse a linha e todas as suas operações. Além disso, afirmou que trocou todas as senhas dos aplicativos das instituições financeiras e invalidou os acessos bancários por aplicativo.

Entretanto, no dia seguinte, relatou que, ao acessar o aplicativo do banco, constatou que o valor de R$ 29.990 havia sido debitado por um fraudador. O cliente explicou que o criminoso não teve acesso a qualquer senha de sua conta bancária e que parte das operações foram realizadas fora do horário permitido pela instituição.

Como não foi realizado o estorno dos valores, o cliente recorreu à Justiça buscando a restituição da quantia, além de indenização por danos morais.

Ao decidir, a juíza reconheceu a falha da instituição bancária, concluindo que o serviço prestado foi defeituoso "ao não proporcionar a segurança dele esperada, sem que se possa imputar ao consumidor a culpa exclusiva pelo evento danoso".

"Na verdade, o que se depreende dos autos é o controle insuficiente do banco réu sobre os procedimentos de segurança de lançamentos da conta bancária e também de ressarcimento em casos de débitos indevidos (investiga-se pouco e desconfia-se muito do cliente), caracterizando um descaso com o consumidor", assinalou a magistrada.

Assim, condenou o banco a restituir o valor transferido, de R$ 29.990. A magistrada também considerou que a falha na prestação de serviços configura dano moral, fixando o valor em R$ 10 mil reais.


04/05/2020

BREVES NOÇÕES SOBRE OS CRIMES CONTRA A HONRA NA INTERNET E FAKE NEWS

       

O ser humano é realmente complexo. Na medida em que vivem em sociedade as condutas cada vez mais se tornam complexas, sendo necessário o acompanhamento da ciência jurídica dinamicidade, conforme suas ferramentas implementadas pela norma jurídica.

As ofensas pela rede mundial de computadores pelos seres humanos são frequentes e são originários de inúmeros fatores, como questões de natureza política, social, sobre determinado clube de futebol ou até atos mais delicados como relacionados à homofobia, xenofobia e racismo.

Diretamente ao assunto, a aplicação do Código Penal ao Mundo virtual é necessária, pois os crimes a serem apresentados em estudos podem ser aplicados também fora do referido mundo eletrônico. No entanto, é preciso observar quais condutas são tipificadas como crime. É este o objetivo deste texto.

Podemos observar com uma breve leitura do referido Código Penal as seguintes condutas ilícitas, como:


Calúnia: ao imputar, falsamente, a algúem fato definido como crime (art. 138, CP).

Difamação: ao imputar a alguém fato ofensivo à sua reputação (art. 139, CP).

Injúria: ao ofender a dignidade ou o decoro de alguém (art. 140, CP).

Ameaça: ao ameaçar alguém de causar-lhe mal injusto e grave (art. 147, CP).

 

Conforme o caso, a vítima deverá agir prontamente, de modo a evitar com que seu nome e sua imagem sejam violados, pois como se sabe, “a internet não perdoa!”, pois podem tais informações serem “revividas novamente” no Mundo eletrônico, bastando uma postagem numa rede social como Facebook, Instagram ou WhatsApp.

É justificável que a vítima precisa mesmo agir. E quem não se recorda de uns seis anos atrás, uma mulher ter sido espancada até a morte após boatos no Facebook de que estaria praticando magia negra com crianças[1]. Veja-se que, em 2014 sequer se ouvia dizer sobre a expressão fake news[2]. Há casos também preocupantes, mas não são muito divulgados, como casos em que, por ato de vingança determinada pessoa expõe a foto de uma pessoa na internet ao dizer que aquela pessoa é estuprador ou mesmo caloteira, por não pagar uma dívida.

A preocupação (ou cautela) leva ao extremo quando citamos um caso de morte decorrente de notícia falsa, mas é o espírito que se deve ter quando estamos a tratar sobre a internet nos dias atuais, pois tudo tem sido reservado com a breve frase popular: “ou oito ou oitenta!”, pois não se sabe ao certo o resultado da conduta humana ao acreditar numa notícia circulando pelas redes sociais.

Se determinado individuo acredita em uma notícia falsa, sem sombra de dúvidas, compartilhará em sua rede social, assim como seu amigo virtual também executará acreditando apenas nas informações compartilhadas de seu amigo, mas ambos não observam qual se era a fonte daquela informação. O resultado: compartilhamento em massa em diversas redes sociais, gerando uma desonra sem precedentes à vítima.

Diante de uma situação grave, como uma imputação de falso crime ou a desonra à imagem, o que a vítima deverá fazer?

A primeira coisa a ser feita é guardar as provas por meio de print de todas as mensagens, postagens e conversas que possam apontar  que é o autor do crime. Outra coisa fundamental é guardar as URLs, mais conhecido como o endereço ou fonte do site.

A segunda coisa a ser feita é a realização de uma Ata Notarial, que tem por objetivo constar a veracidade das informações no resguardo de provas, sendo indispensável visto que uma postagem pode ser tanto manipulada pela pessoa interessada, como também, alguém poderá apaga-la a qualquer momento. O ato de lavrar ata notarial é dos tabeliães, no qual o tabelião acessa os dados tidos como provas da vítima e posteriormente, constará de forma transcrita o conteúdo, dotando de veracidade das informações.

Desta forma, a origem da informação com o endereço do site juntamente com a ata notarial são realmente necessários como elementos de prova (na esfera criminal e cível), pois há situações que a vítima deverá recorrer à Justiça para remover determinado conteúdo que viole sua imagem diante de outras. A previsão legal para remoção de conteúdo está prevista no artigo 19 do Marco Civil da Internet (Lei nº 12.965/2014).

O ato da vítima em registar os fatos por meio de boletim de ocorrência também se torna uma medida importante, no qual a autoridade policial tomará conhecimento dos fatos, podendo servir como argumento do ato ilícito num determinado processo judicial.

Realizado o boletim de ocorrência, a vítima terá o prazo de seis meses para representar o promover uma queixa crime, a contar da data em que tomou conhecimento de da autoria do crime e, se nada fizer após os seis meses, seu direito caducou-se, é o que se denominada como decadência do direito decorrente de renuncia, seja expressa ou tácita, conforme estabelece o artigo 103, do Código Penal.

Regra geral, no tocante ao aspecto processual, os crimes contra a honra na esfera penal a vítima terá o prazo de seis meses para promover ação penal privada, conforme dito, sendo considerado como uma defesa de um direito subjetivo especificado, sendo julgado no Juizado Especial Criminal (sigla JECRIM), por se tratar de crimes de menor potencial ofensivo.

A título de informação complementar, na esfera cível a vítima poderá promover uma ação de indenização por danos morais com as mesmas provas da esfera penal, no entanto, o prazo para ingresso de ação judicial será de três anos, nos moldes do artigo 206, § 3°, V do Código Civil de 2002.

 

 

        



[2] Para não ficar fora do contexto, as fake News popularmente conhecidas, traduzindo para o português são notícias falsas e tanto podem acontecer nas redes sociais como também fora dela.


28/10/2019

Empresa de bitcoin tem bens bloqueados

A Atlas Serviços em Ativos Digitais, que trabalha com bitcoin, teve os bens bloqueados por não ter efetivado o saque de um investidor no valor de R$ 177 mil.
A liminar foi deferida pelo juiz Luiz Gonzaga Silveira Soares, da 12ª Vara Cível de Belo Horizonte.
De acordo com os autos, o cliente investiu na compra da moeda bitcoin, com a promessa de que seria um negócio seguro e rentável. Porém, ao tentar sacar o valor investido, não obteve sucesso.
Segundo o investidor, o acesso à movimentação de sua moeda virtual e o contato com a empresa seguiam normais. Quando ele teve conhecimento de que a Comissão de Valores Mobiliários havia proibido a Atlas de oferecer o mesmo tipo de contrato, solicitou o saque dos valores investidos.
Conforme o contrato, o saque estaria disponível em até 24 horas; mas, passados 30 dias da solicitação, o cliente não teve seu dinheiro de volta.
De acordo com o magistrado, a liminar resguarda ao investidor o ressarcimento dos valores e da rentabilidade do investimento caso seu direito seja comprovado ao final do processo.

14/04/2019

OS PRINCIPAIS ERROS JURÍDICOS DAS STARTUPS NO CENÁRIO ATUAL


  
Perca tempo errando que o resultado será negativo; corrija quanto houver tempo!
         
          Neste presente e breve artigo trato sobre os erros mais comuns das startups, em seu aspecto jurídico.

          A análise quanto aos erros estão relacionados a questões técnicas e giram em torno de elementos estruturais do próprio empreendedorismo. Para facilitar, elencamos alguns dos erros mais comuns:

1 – O empreendedor esquece “onde está pisando

Realmente é um erro número comum e mais comum, desconhecer o campo de atuação da startup. Mas qual relevância jurídica nisso? Tudo!

Exemplo: a startup investe valores, consegue atuar no mercado, no entanto, por falta de conhecimento de seu campo de atuação acaba levando uma multa altíssima de determinado ente público devido a atividade exercida. Há situação como, sofrer uma cobrança ou execução fiscal ao esquecer de recolher um imposto específico, como o ISS- Imposto sobre Serviços.

Interessante que, para as Fintechs há regras especificas devendo seguir as regras editadas pelo Banco Central do Brasil, conforme editou a Resolução n. 4656.

Podemos citar diversos exemplos, pois são infinitos. Há questões não somente de cunho legal, devendo obediência as normas, regramentos e resoluções especificas, mas, de modo algum deverá ser olvidada de cunho moral. Citando exemplo, aplicativo criado com a intenção de divulgar fotos de pessoas nuas, ainda que com o consentimento delas.

Por isso, não é o suficiente apenas o conhecimento de execução da startup, sendo necessário também estar adequada da legislação em vigor, no entanto, o mais conveniente é um acompanhamento jurídico especializado para a realização da atividade. Portanto, não saber onde pisa é muito mais do que qualquer um pensa!

2. Não tratar de cláusulas e revisões contratuais com seus fundadores e colaboradores

Outro erro marcante diz respeito à ignorância, digamos assim, levada ao desleixo, possa sensivelmente impactar na atividade profissional, ao deixar de tratar das cláusulas e revisões contratuais.

É por isso que, faticamente surgem os Memorando de Entendimento, Pactos/Acordos entre Cotistas. Sem sombra de dúvidas, estando devidamente tratadas as cláusulas contratuais, evitam-se estresses futuros.

Interessante ressaltar que, as cláusulas contratuais deverão ser objetivas, devendo permitir, por exemplo, a limitação de voto de determinado sócio; clausulas de período de carência, hipótese de perda de direitos societários no abandono de um dos sócios; direito de preferência, quando de contra e venda entre sócios cotistas; clausulas de admissão entre sócios; distribuição de lucros e dividendos; cláusulas de confiabilidade e concorrência, após a saída da sociedade por um dos sócios; ou mesmo situações mais gravosas, como a exclusão de um dos sócios.

A assessoria jurídica em questões contratuais como as elencadas acimas, são relevantíssimas na prática, evitando-se, portanto futuros litígios.

3. A insistência por contratos modelos feitos pela internet para negócios

Como diz aquele velho e conhecido ditado popular, o barato saí caro. Essa história de “só um modelo copiado na internet” não pode ser aplicado na prática.

É muito importante dizer, todo e qualquer tipo de contrato exige-se personalização, ou seja, pontos sensíveis que possam melhor ainda mais nas atividades de uma startup.

As cláusulas de proteção e de blindagem contratual definem como serão executadas as atividades desempenhadas por seus desenvolvedores, fundadores, aporte de capital, horas trabalhadas e etc.

Além disso, quem já utilizou tais modelos, recomenda-se alterar em tempo hábil.

4. Esquecer que existe proteção à atividade intelectual

Sendo atividade de um startup regada por ideias novas e com um acréscimo de incertezas, logicamente  deverão ser preservadas e protegidas juridicamente.

Temos como ferramentas de proteção jurídica por categorias: Propriedade Industrial: marcas, patentes, desenho industrial e segredos empresariais. Direitos Autorais e Direitos conexos, sendo exemplo, programas de computador.

Erro comum na prática: esquecer deixar de registrar a propriedade industrial ou registrar em cartório por instrumento particular direitos autorais vinculado à pessoa física, podendo prever clausula contratual de cessão de direitos à pessoa jurídica.

A proteção do Software também é fundamental diante de diversas mudanças no cenário atual, bem como quanto ao nome e domínio empresarial.

Todos estes pontos tratados devem valer como regramento as questões internacionais cabendo o empreendedor registrar nos Países onde executar as atividades.


5. Deixar de contratar advogado

As startups no cenário jurídico atual, realmente despertam o interesses de muitos profissionais do Direito, no entanto, não são todos que estão preparados a atuar no mercado em prol de um futuro cliente. Cursos de extensão serão insuficientes para o profissional, pois, deverão conhecer as áreas correlatas, como direito societário, consumidor, contratual, tributário, propriedade intelectual, além de Direito Digital e Tecnologia.

Por outro lado, o empreendedor que deixar de contratar um conhecedor no setor de startups culminará num dos grandes erros, além dos já tratados anteriormente.



06/03/2019

NOÇÕES DO CRIME DE LAVAGEM DE DINHEIRO E AS MOEDAS VIRTUAIS


                 
O crime de lavagem de dinheiro, sem sombra de dúvidas, é um dos mais comentados nas últimas décadas em nosso País, seja veiculado pela imprensa por meio de jornais, revistas telejornais, nos bancos acadêmicos via congressos, palestras, produção literária, ou mesmo numa simples conversa informal. Mas, afinal, o que é crime de lavagem de dinheiro?

          Certamente, a resposta não precisa ser necessariamente com conceitos jurídicos empregados, mas, de forma mais simples e objetiva, podemos dizer que, se trata de métodos/ações promovidas pelo agente do crime que busca um meio para ‘apagar’ a origem ilícita dos bens, direitos e valores anteriores e, na operação seguinte ‘branqueá-los’ como se lícitos fossem a sua origem.

          Neste sentido, é preciso que já tenha uma origem criminosa dos bens que o agente criminoso deseja que seja posteriormente lícito e, neste ponto, não se distingue se tal crime seja uma infração, como no caso de crimes de trafico de drogas, exploração sexual, corrupção, ou mesmo, no caso de contravenção penal, como exemplo, a exploração de jogos de azar.

          Podemos trazer um exemplo fático recente numa noticia veiculada no sítio eletrônico G1, em 14/02/2019 [1]:

“Polícia busca 40 veículos comercializados por suspeitos de lavagem de dinheiro”
Após três anos de investigação, a polícia Civil deflagrou nesta quinta-feira (14) a operação Pavilhão, decorrente da Operação Pullus, que investiga uma organização criminosa suspeita de tráfico de drogas, agiotagem, lavagem de dinheiro e sonegação fiscal. Um casal foi preso.

Com a notícia acima exposta, realmente traz uma melhor elucidação de ordem prática para este delito, no entanto, é preciso afirmar que os atos configuradores da lavagem de dinheiro dificultam a descoberta e o combate aos crimes antecedentes, mas, salienta-se que a Lei n. 9.613/98, com redação dada pela Lei nº 12.683/12, tipificou as seguintes condutas como criminosas, conforme previsão em seu artigo 1°, in verbis:

Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de infração penal.
Pena – reclusão, de 3 (três) a 10 (dez) anos, e multa.
 § 1° Incorre na mesma pena quem, para ocultar o dissimular a utilização de bens, direitos ou valores provenientes de infração penal:
I – Os converte em ativos lícitos;
II – Os adquire, recebe, troca, negocia, dá ou recebe em garantia, guarda, tem em depósito, movimenta ou transfere;
III- Importa ou exporta bens com valores não correspondentes aos verdadeiros.
§ 2° Incorre, ainda, na mesma pena quem:
I – Utiliza, na atividade econômica ou financeira, bens, direitos ou valores provenientes de infração penal;
II – Participa de grupo, associação ou escritório tendo conhecimento de que sua atividade principal ou secundária é dirigida à prática de crimes previsto nesta Lei.
§ 3º A tentativa é punida nos termos do parágrafo único do art. 14 do Código Penal.
§ 4° A pena será aumentada de um a dois terços, se os crimes definidos nesta Lei forem cometidos de forma reiterada ou por intermédio de organização criminosa.
§ 5° A pena poderá ser reduzida de um a dois terços e ser cumprida em regime aberto ou semiaberto, facultando-se ao juiz deixar de aplicá-la ou substituí-la, a qualquer tempo, por pena restritiva de direitos, se o autor, coautor ou partícipe colaborar espontaneamente com as autoridades, prestando esclarecimentos que conduzam à apuração das infrações penais, à identificação dos autores, coautores e partícipes, ou à localização dos bens, direitos ou valores objeto do crime.

Interessante colocarmos as três fases caracterizadoras do crime de lavagem de dinheiro, sejam em quaisquer condutas acima descritas acima pela lei em vigor. Segundo Min. Luiz Fux, manifestado por seu voto na famosa Ação Penal 470, extraímos as fases:

1a Fase: É a colocação de recursos derivados de uma atividade ilegal em mecanismo de dissimulação de sua origem, que pode ser realizado por instituição financeira, casas de cambio, leilões de obras de arte, entre outros negócios aparentemente lícitos.

2a Fase: Decorrente do encobrimento, circulação ou transformação, cujo objetivo é tornar mais difícil a detecção da manobra dissimuladora e o descobrimento de lavagem.

3a Fase: Interação dos recursos a uma economia ondem pareçam legítimos.

Obviamente, é impossível que na prática tenhamos que analisar todas estas fases descritas pelo Min. Luiz Fux, mas, não significa que sejam inservível tais fases, no entanto, a sintetização das condutas previstas no artigo 1° da Lei n. 9.613/98,  por si só, são o suficientes para a aplicação da norma penal.

Interessante, para nós, a questão relacionada ao “contágio” do produto do crime, pois o risco prático é ainda maior diante de ações que exigem muito mais detalhes, como provas em concreto para que a conduta seja considerada criminosa haja vista a existência do dolo, conforme o artigo 18, I, do Código Penal Brasileiro: “doloso, quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo”, sendo impossível aplicar modalidade culposa, pois o agente do crime conhecia a origem do bem, não podendo agir com negligência, imprudência ou imperícia.

Para fins de elucidação prática, o Superior Tribunal de Justiça reconheceu a ilegalidade de condenar uma pessoa por imputação de lavagem de dinheiro na forma culposa, tendo em vista que não estava demonstrada a  consciência e vontade de ocultar ou dissimular a origem ilícita de valores depositados em conta bancária (STJ - AgRg no AREsp 328.229/SP, Rel. Ministro Rogerio Schietti Cruz, DJe 02/02/2016).

Assim, conforme tratado anteriormente, o dolo como elemento de conduta subjetiva livre e consciente para realização do ato ilícito, devendo estar devidamente caracterizada para que seja considerado crime de lavagem de dinheiro que, alias corroborado com o entendimento do Supremo Tribunal Federal, na Ação Penal 470.

Não podemos deixar de destacar a questão polêmica do dolo eventual. Conforme lições de Damásio de Jesus (2015: 331), sobre o dolo eventual, o sujeito “antevê o resultado e age, percebendo que é possível causar o resultado, realizando o comportamento. Entre desistir da conduta e causar o resultado, ele opta por não evitar aquela”.

Na senda de tipificação normativa, o nosso Código Penal em seu artigo 18, I, estabelece que o dolo eventual caracteriza-se quando o agende do delito assume o risco de produzir o resultado.

Indaga-se, será mesmo que deveremos aplicar o elemento subjetivo do dolo eventual nos crimes de lavagem de dinheiro?

Nas lições de Paulo José Baltazar Junior (2017: 1096), afirma que:

“Admitir o dolo eventual implica admitir a ocorrência do crime quando o lavador não tem a certeza de que o objeto da lavagem é produto da atividade criminosa, mas assume o risco de que os bens tenham origem criminosa, com base no indicativo dado pelas circunstâncias do fato”.

É importante pensarmos que, o dolo eventual aplicado ao crime ora em estudo, requer uma análise mais acurada na legislação especial ao aplicar da lei, no entanto, a celeuma entre aplicar somente o dolo direto e o eventual, abre-se a possibilidade fática da previsão legal do artigo 18, I, do Código Penal, devido o risco que determinado bem seja de origem criminosa.

Na prática é a famosa Teoria da Cegueira Deliberada (Willful Blindness) ou a Teoria das Instruções do Avestruz, no qual se caracteriza como crime de lavagem de capitais o agente que se omite diante de uma ilicitude evidente com a única finalidade de lucro, deverá responder por dolo eventual. Em terras brasileiras, a referida teoria foi aplicada para condenar o dono de uma concessionária de veículos que vendeu onze carros de valores avultosos recebidos em dinheiro em espécie, sendo que a origem do dinheiro era referente ao roubo de um banco.

Interessante posição, pelo visto pacificada da Egrégia Corte do Superior Tribunal de Justiça ao afirmar que:

Sabe-se que para a aplicação da teoria da cegueira deliberada, deve ficar demonstrado no quadro fático apresentado na lide que o agente finge não perceber determinada situação de ilicitude para, a partir daí, alcançar a vantagem pretendida (STJ - RECURSO ESPECIAL : REsp 1565832 RJ 2015/0282311-7).

Desta forma, para aplicarmos o dolo eventual nos crimes de lavagem de dinheiro, será necessário um plus, ou seja, o agente não perceber quanto a origem ilícita do bem, como no princípio do non olet do direito tributário[2], ignorando a origem, mas, de modo a considerar a obtenção da vantagem econômica final.

Sobre lavagem de dinheiro por meio de moedas virtuais

Feitas as considerações introdutórias sobre o crime de lavagem de dinheiro e suas características indispensáveis para a sua configuração, podemos traçar como algo recente no cenário jurídico no tocante as moedas virtuais, conhecidas por criptomoedas ou bitcoin, apesar de que estas duas últimas, em verdade são espécies da primeira[3].

Numa sociedade de risco e em alto grau de elementos inovadores dinâmicos, as moedas virtuais surgiram no mercado financeiro por iniciativa de particulares como alternativa de circulação de riquezas (assim entendemos desta forma).

A ausência de uma lei especifica no Brasil ou mesmo de um Tratado Internacional que seja  ratificado pelo Estado, gera de certa forma uma insegurança e poderá ensejar num aumento da cyber-lavagem.

Essa possibilidade ainda persiste, ainda que as criptomoedas possuam complexa tecnologia, haja vista que blockchain não possibilita a identificação dos usuários[4] e ainda que precisam ser declaradas perante a Receita Federal do Brasil[5], isto não significa que exista uma fiscalização, pois o Poder Pública estará ainda sem desconhecer a origem dos bens.

Faticamente será um imenso desafio aos Poderes Públicos, sobretudo, ao aspecto investigatório na produção de provas acerca da “lavanderia virtual”, pois a identificação de usuários já possa traçar os indícios de autoria e posteriormente, a materialidade delitiva para que haja a punibilidade do transgressor da norma penal.

Em notícia recente (05/03/2019), já temos um caso intrigante no qual facção criminosa utilizava Bitcoin para lavagem de dinheiro[6] e que na reportagem o policial disse que, de acordo com um especialista consultado pela PM, esse equipamento é “usado para fazer a lavagem do dinheiro do tráfico” e que eles conseguem até “dobrar o valor da noite para o dia” e também que essas máquinas podem girar em torno de “1 milhão a 2 milhões por dia[7]”. Portanto, trata-se de uma realidade a lavanderia virtual.

Quanto em relação à aplicação do dolo eventual é possível inclusive mais próximo de uma identificação do comprador da moeda virtual, como origem o vendedor. Talvez, ao critério de regulamentação normativa seria um cadastramento integro e concentrado por parte do vendedor, no qual terá a obrigatoriedade de apresentar aos órgãos públicos quem são seus compradores de moedas virtuais e um órgão específico fiscalizador poderá inibir as transações eletrônicas.

 Por fim, ainda que tenhamos pouquíssimas discussões dos Tribunais, já sabemos pelo menos que a competência para julgamento de ações penais haja vista que o Superior Tribunal de Justiça manifestou-se:

inexistindo indícios, por ora, da prática de crime de competência federal, o procedimento inquisitivo deve prosseguir na Justiça estadual, a fim de que se investigue a prática de outros ilícitos, inclusive estelionato e crime contra a economia popular” STJ - CONFLITO DE COMPETENCIA : CC 161123 SP 2018/0248430-4.



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[2] A cláusula tributária chamada pecunia non olet ou non olet (não tem cheiro) estabelece que, para o fisco, pouco importa se os rendimentos tributáveis tiveram ou não fonte lícita ou moral.

[3] As chamadas “moedas virtuais” ou “moedas criptográficas” são representações digitais de valor que não são emitidas por Banco Central ou outra autoridade monetária. O seu valor decorre da confiança depositada nas suas regras de funcionamento e na cadeia de participantes. Vale a leitura no sítio eletrônico do Banco Central do Brasil:

[4] Blockchain (também conhecido como “o protocolo da confiança”) é uma tecnologia de registro distribuído que visa a descentralização como medida de segurança. São bases de registros e dados distribuídos e compartilhados que têm a função de criar um índice global para todas as transações que ocorrem em um determinado mercado. Ver: https://pt.wikipedia.org/wiki/Blockchain


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