Primeiramente, é importante destacar a
responsabilidade do cultor do Direito perante a sociedade no que se refere ao
caráter informador referente a determinados institutos jurídicos, inclusive
pouco conhecidos.
Adentrando diretamente sobre o tema,
anúncios publicitários informando sobre o “recall” de diversos produtos são
mais que comuns. Porém, surge uma indagação, afinal, o que é “recall”?
“Recall” provém da língua inglesa, no
qual tem diversos significados para a língua portuguesa, como recordar,
lembrar, relembrar, rememorar, cancelar, etc. Quaisquer empregos destas
palavras teriam o mesmo significado, quando estamos apontando para o instituto
no Código de Defesa do Consumidor. Aliás, o “recall” é muito comum em países de
Primeiro Mundo.
No Código de Defesa do Consumidor (Lei
n. 8.078/90), o “recall” encontra-se previsto no artigo 10, § 1,
“in verbis”
“Art. 10 - O fornecedor não poderá colocar no mercado de
consumo produto ou serviço que sabe ou deveria saber apresentar alto grau de nocividade
ou periculosidade à saúde ou segurança”
“§ 1º - O fornecedor de produtos e serviços que,
posteriormente à sua introdução no mercado de consumo, tiver conhecimento da
periculosidade que apresentem, deverá comunicar o fato imediatamente às autoridades
competentes e aos consumidores, mediante anúncios publicitários”.
Nesta senda, o fornecedor de produtos e
serviços, quando colocados a circulação de mercado determinado produto ou
serviço e tomando conhecimento da periculosidade apresentada deverá comunicar a
todos, portanto, as autoridades competentes como também seus consumidores por
meio de anúncios publicitários.
Cumpre mencionar que, por meio deste
instrumento, a norma protecionista pretende que o fornecedor impeça ou procure
impedir, ainda que tardiamente, que o consumidor sofra algum dano ou perda em
função de vício que o produto ou serviço tenham apresentado após sua
comercialização. P. ex. um amortecedor que saiu da montadora, apresentou
problemas de funcionamento e por ter origem do mesmo lote advindo do seu
fabricante, tem maiores probabilidades de repetir o problema nos automóveis já
colocados no mercado, daí que os veículos já vendidos deverão ser “chamados de
volta”.
Ainda, a divulgação em anúncio
publicitário deve ser ampla e geral, ou seja, capaz de atingir a população num
todo, utilizando-se em quaisquer meios eficazes, aplicando-se ao princípio da
publicidade ao consumidor.
Apesar do fornecedor de produtos e
serviços retirar de circulação, surge uma dúvida: E mesmo agindo desta forma
conforme a lei exime-se de responsabilização? A resposta é negativa. Eis os
argumentos.
A responsabilidade do fornecedor dos
serviços ou dos produtos é objetiva, pois o Código de Defesa do Consumidor
prescreve neste sentido:
“Art. 12. O fabricante, o produtor, o construtor, nacional
ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de
culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos
decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação,
apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações
insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos”
Conforme o artigo acima, todos aqueles elencados
respondem, quanto sua responsabilidade, independente de culpa, devendo reparar
eventuais danos causados aos seus consumidores. No caso do “recall”, fora
constatado um defeito de fabricação em que o fornecedor de produtos e ou
serviços retira de circulação para evitar prejuízos, ainda que saiba, segundo a
lei, possa responsabilizar-se de eventuais prejuízos durante o tempo em que
estiver em circulação.
Neste sentido, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do
Sul deu seguimento a Primeira Instância no Recurso
Cível n. 71003384989:
“RESPONSABILIDADE CIVIL. INDENIZAÇÃO. DANOS MATERIAIS E MORAIS. ACIDENTE
COM MOTOCICLETA. POSTERIOR RECALL. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. FATO DO PRODUTO.
DEVER DE REPARAR OS DANOS MATERIAIS E MORAIS.
1. Complexidade da causa
inocorrente. Inexiste qualquer complexidade na causa a ensejar a incompetência
do JEC para o julgamento da lide. Não é necessária a realização de prova
pericial, no caso concreto, haja vista que o conjunto probatório acostado ao
feito, especialmente o comunicado de “recall” para substituição do corpo do
acelerador, leva à conclusão de que o defeito implicou no acidente ocorrido com
o autor.
2. Tendo o autor sofrido
acidente com a moto alguns meses após a compra, em decorrência de queda por não
responder a motocicleta aos comandos de aceleração, e tendo recebido comunicado
da fabricante, após o acidente, sobre a identificação de problema consistente
no “retorno lento do acelerador, podendo levar à perda de controle da motocicleta
com eventual queda”, evidenciada está a causa do acidente.
3. Trata-se de
responsabilidade pelo fato do produto, que é objetiva, conforme previsão do
art. 12 do CDC.
Desse modo, demonstrados os danos decorrentes de defeito na motocicleta, que
ocasionaram o acidente sofrido pelo autor, evidenciado o dever de indenizar os
prejuízos sofridos.
4. No que se refere aos
danos materiais, demonstrados os prejuízos decorrentes dos danos na
motocicleta, cujo menor orçamento alcança o valor de R$ 2.685,00, despesas
médicas no valor de R$ 366,00 e utilização de serviços de terceiro para
atividade profissional por três meses, no valor de R$ 2.700,00, totalizando R$
5.751,75.
5. No que tange aos danos
morais, evidenciado o sofrimento do autor, em decorrência da violação à sua
integridade física. Quantum indenizatório fixado em R$ 3.000,00, que não
comporta minoração.
Sentença mantida pelos
próprios fundamentos.
RECURSO DESPROVIDO”
Por certo, a indenização por danos
materiais, assim como os danos morais devem ser avaliados caso a caso, sendo
neste último caso poderia aplicar o princípio do dever de confiança, já que
consumidor optou por contratar ou comprar determinado produto não somente pelo
preço como também pela notoriedade demonstrada.