15/05/2020

É POSSÍVEL ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL EM AÇÕES JUDICIAIS EM CURSO?


 


         Um dos questionamentos de ordem prática, diz respeito quanto à possibilidade ou não, de aplicar o instituto de acordo de não persecução penal em curso, ou seja, durante o processo penal.

         Antes mesmo de darmos uma posição sobre o referido questionamento, é necessário que tenhamos uma breve noção sobre o acordo de não persecução penal, que foi inserido pelo Pacote Anticrime (Lei n. 13.964/19), ao acrescer o artigo 28-A do Código de Processo Penal.

         Com a finalidade de compreendermos melhor, a novel inserção legislativa define apenas o momento e os requisitos em que se aplica o acordo de não persecução penal na prática, porém, sem delimitar quanto ao conceito especificamente.

É preciso afirmar que, quando estamos a traçar conceitos e princípios a tendência que o objeto seja mais claro possível, a fim de se evitar interpretação extensiva ou restritiva acerca de determinado ponto em questão.

Em verdade, a finalidade da ciência jurídica é estabelecer e construir conceitos a partir da norma em concreto para que se possa facilitar ainda mais o conhecimento jurídico, não sendo adequado nem mesmo proveitoso apenas a replicar o texto legal, podendo causar inclusive, uma falsa impressão de que entendeu bem o aspecto finalístico e se esgotou ao tema. Pois bem.

         Conforme a leitura que se faz do artigo 28-A do Código de Processo Penal, em nada explica sobre o acordo de não persecução penal, apenas diferencia que não pode ser aplicado em caso de arquivamento do processo, devendo o investigado ter confessado formalmente, assim como, que a natureza do crime não tenha sido por violência ou grave ameaça e com pena em até quatro anos.

         Conceituando, mas de modo inverso, a persecução penal é atividade que o Estado desenvolve no sentido de tornar realizável a repressão penal por meio de um processo, no qual o Ministério Público oferecerá a denuncia, desde que estiverem presentes todas as provas em face do autor, conforme estabelece o art. 41 do CPP[1].

Desta forma, a não persecução penal é o ato de deixar de praticar a repressão de um ato criminoso, de forma autorizada pela lei (art. 28-A, CPP), cabendo o interessado aceitar o acordo para que a ação penal não tenha o seu devido curso, realizando em verdade, um ajuste de condições entre o MP e investigado devidamente assistido.

Há quem defenda que o referido instituto ser a segunda velocidade do Direito Penal ao relativizar a promoção dos direitos e garantias fundamentais, possibilitando punição mais célere, mas, em compensação, prevê como consequência jurídica do crime uma sanção não privativa de liberdade, de acordo com as lições teóricas de Jesús-María Silva Sánchez[2].

Feitas tais considerações, indaga-se: é possível (ou não) o acordo de não persecução penal após a denúncia, ou seja, nas ações em curso?

Ao que se percebe, somente será possível o Acordo de Não Persecução Penal antes da propositura da ação penal, ou seja, durante procedimentos investigatórios e antes do oferecimento da denúncia, entretanto, o artigo. 28-A do CPP nada diz respeito quanto à possibilidade de aplicação em ações penais em curso.

A questão da inaplicabilidade do ANPP[3] em processos em andamento, diz respeito que as regras novas possuem um caráter meramente instrumental ou processual, devendo observar aos deslindes do tempus regit actum, sendo lhe necessário aplica-las a partir de sua entrada em vigor.

Todavia, há quem defenda que o ANPP detém valor de caráter substancial ou material, pois promove a sua incidência despenalizadora, especialmente quanto à aplicação de pena e extinção de punibilidade.

Para solucionar o deslinde da questão inerente à aplicação do ANPP nas ações judiciais em curso, deve-se observar que o justo e necessário equilíbrio entre o instrumental e o substantivo, ao passo que, a natureza do instituto é bifronte, pois está umbilicalmente ligado à valores como fonte a Constituição Federal de 1988, no artigo 5°, XL, “tratando que a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu”.

Além disso, em bases instrumentais o artigo 3° do Código de Processo Penal, estabelece que: “a lei processual penal admitirá interpretação extensiva e aplicação analógica, bem como o suplemento dos princípios gerais do direito”. Explica-se que, numa aplicação analógica que, se existem outros institutos despenalizadores inseridos em nosso sistema jurídico penal, como a suspensão condicional do processo e a transação penal, no qual o Supremo Tribunal Federal assentou ser cabível aplicar tais institutos mesmo em processos em curso, à luz do artigo 5°, XL, da CF/88[4], visto que não há na Constituição limite a aplicação de direitos sensíveis em razão de determinada fase processual.

Em conclusão defende-se que, mesmo que o Ministério Público já tenha promovido a denúncia, nada impediria que apresentasse a proposta de Acordo de Não Persecução Penal por se tratar de norma de caráter despenalizadora conforme já dito, desde que, estejam cumpridos os requisitos estabelecidos em lei para que se possa empregar a aplicação analógica, no entanto, é sabido que, por se tratar de um novel instituto, ao que tudo indica, sob o ponto de vista de adequação dúplice (material e processual) ser das mais sábias e evidentes na prática, ainda possam surgir argumentos contrários, para não aplicar o acordo em ações judiciais em curso.

 

 



[1] Art. 41. A denúncia ou queixa conterá a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo, a classificação do crime e, quando necessário, o rol das testemunhas.

 

[2] A expansão do direito penal: aspectos da política criminal nas sociedades pós-industriais. Trad. Luíz Otávio de Oliveira Rocha. São Paulo: RT, 2002.

 

[3] Para facilitar ao caro leitor e familiarizar-se quanto a sigla, leia-se: Acordo de Não Persecução Penal.

[4] V. STF - ADI: 1719 DF, Relator: JOAQUIM BARBOSA, Data de Julgamento: 18/06/2007, Tribunal Pleno, Data de Publicação: DJe-072 DIVULG 02-08-2007 PUBLIC 03-08-2007 DJ 03-08-2007 PP-00029 EMENT VOL-02283-02 PP-00225 RB v. 19, n. 526, 2007, p. 33-35


13/05/2020

QUAL CRIME APLICADO NO FALSO ANUNCIO DA CURA DO CORONAVÍRUS?



Imagine a seguinte situação, um determinado sujeito aproveitando-se da posição líder religioso ou qualquer pessoa que se valendo de sua fama, afirma com todas as letras  que tem a cura para o coronavírus.


A cura que afirma diz ter está em um determinado produto ou objeto (preferimos escrever desta forma para se evitar qualquer comparação midiática), cabendo aos seus fiéis ou seguidores comprarem para que pudesse ficar imune a doença mencionada.

Diante da situação apresentada, indaga-se, incorreu em qual crime, à luz do Código Penal Brasileiro?

Existem as possiblidades mais comuns que podemos aplicar ao caso hipotético, como, o Charlatanismo (art. 283, CP), Estelionato (art. 171, CP) e ainda existe a possibilidade de concurso formal, elegendo entre os dois crimes mencionados. Assim, faremos uma análise de cada um dos crimes, conforme suas estruturas para fins de estudo.


De acordo com o artigo 283 do Código Penal, o charlatanismo é a prática de Inculcar ou anunciar cura por meio secreto ou infalível. A pena é de detenção, de 3 meses a 1 ano, além de multa.


Trata-se de um crime que se tutela a saúde coletiva, assim como aqueles que estejam diretamente atingidos pelo ato de fraude e deverão estar presentes as seguintes condutas:

·        Inculcar que significa apregoar, propor, indicar, recomendar.

 

·        Anunciar é ato de divulgação, podendo ser por meu secreto ou infalível a cura de uma doença.

 

·        Os meios empregados para recomendar ou anunciar a cura, podendo ser por jornais, revistas, cartazes, televisão, rádio, ou por qualquer outro meio de comunicação, inclusive por meio de aplicativo e redes sociais, como whatsApp, zoom, Messenger, Facebook, Instagram, etc.

Ademais, o crime se consuma com a conduta de inculcar ou de anunciar a cura e, por se tratar de um crime de perigo abstrato não há a necessidade que alguém venha comprar determinado objeto ofertado pelo criminoso, como por exemplo, um suco milagroso que deixa imune a qualquer tipo de vírus.


E se alguém efetivamente pagasse por determinado produto indicado? Neste caso, pode se afirmar que houve uma fraude, no qual o sujeito emprega o charlatanismo como meio para se buscar o resultado esperado, ou seja, buscar uma vantagem indevida em face da vítima.


Neste caso, pode se afirmar que o crime de charlatanismo sendo uma conduta meio, o crime de estelionato deverá ser caracterizado em sua integralidade, por se tratar de conduta fim, aplicando-se o artigo 171, do Código Penal[1].


Por outro lado, há quem defenda a tese de aplicação dos dois crimes em comento por se tratarem de condutas autônomas, ou seja, o sujeito pratica o charlatanismo e ao mesmo tempo o estelionato.


Com o devido respeito aos que entendem que são condutas autônomas devendo aplica-las concomitantemente, é importante frisar que, quando se tratar de crime mais gravoso, a conduta fim consome a conduta meio, ou seja, pois o sujeito se utiliza meio fraudulento para obter um proveito ilícito, deve-se aplicar o crime de estelionato em sua integralidade em consonância ao artigo 70 do Código Penal.


         Desta forma, se houver prejuízo relacionado ao patrimônio a vítima em decorrência do charlatanismo (crime meio) e estando presentes os elementos indicativos de conduta previstos no artigo 171, do CP, entendemos ser aplicado o crime de estelionato em sua integralidade, ao passo que, não estando presente nenhum prejuízo específico, como por exemplo, a compra expressiva de produtos que curam, mas apenas existe o ato de propalar a cura por meio secreto ou infalível, logo, o crime de charlatanismo estará por caracterizado.


         Noutro ponto importante diz respeito quanto a prática judiciária do crime de estelionato, pois conforme a alteração legislativa com o Pacote Anticrime (Lei n. 13.964/19), a vítima provocar por meio da tutela jurisdicional, tornando-se de crime de ação penal mediante representação (art. 171, § 5º, do CP), portanto, a vítima terá que constituir um advogado ou mesmo assistindo por  defensor público, desde que preenchidos os requisitos em lei, para que promova ação penal contra o autor do crime.


Entretanto, a modificação legislativa estabelece de forma excepcional que não haverá a necessidade de promover ação penal privada, podendo ser promovida por meio de ação penal pública incondicionada representada pelo Ministério Público, se a vítima for:


1) Administração Pública, direta ou indireta;

2) Criança ou adolescente;

3) Pessoa com deficiência mental; ou

4) Maior de 70 (setenta) anos de idade ou incapaz.

11/05/2020

TRF4 dá prazo de 45 dias para que INSS responda pedido de aposentadoria

TRF4 dá prazo de 45 dias para que INSS responda pedido de aposentadoria

Em sessão virtual de julgamento realizada ontem (7/5), o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) fixou prazo de 45 dias para que o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) analise o requerimento administrativo de uma segurada que solicita sua aposentadoria. Ela protocolou o pedido junto à autarquia há mais de 7 meses e ainda não obteve retorno. Conforme a decisão proferida pela Turma Regional Suplementar do Paraná, o tempo decorrido sem que haja uma resposta do instituto é excessivo e ultrapassa o limite razoável.

Em fevereiro, a mulher ajuizou um mandado de segurança pleiteando a análise imediata de seu requerimento por parte do INSS. Ela afirmou que o pedido de aposentadoria por tempo de contribuição aguarda por resposta desde setembro de 2019. A autora alegou descumprimento do prazo de 30 dias previsto na lei que regula os processos administrativos em âmbito federal (Lei nº 9.784/99).

A 1ª Unidade Avançada de Atendimento de Ivaiporã (PR) concedeu medida liminar favorável a segurada e estabeleceu o prazo de 10 dias para que o INSS respondesse o pedido de aposentadoria.

O instituto previdenciário recorreu da determinação ao TRF4 com um agravo de instrumento. No recurso, argumentou que a demora se deve a reflexos da pandemia e que está adotando providências para a resolução de requerimentos administrativos pendentes. A autarquia solicitou ao tribunal que concedesse um prazo de até 180 dias para o caso.

O relator do processo na corte, desembargador federal Fernando Quadros da Silva, deu parcial provimento ao recurso e determinou que o INSS tem 45 dias para responder ao pedido da segurada.

Segundo o magistrado, ao postergar indefinidamente a análise dos requerimentos administrativos, a autarquia afronta o princípio constitucional da eficiência a que estão submetidos tanto os processos administrativos quanto os judiciais.

“Todavia, é insuficiente o prazo de 10 dias estabelecido inicialmente, sendo o caso de ampliação para 45 dias. Considerando as peculiaridades do momento em face da pandemia, o que impacta também na prestação do serviço público e caracteriza justificativa plausível”, observou o desembargador.


Fonte: TRF4

Município é condenado por queda de bebê durante parto


O Município de Contagem foi condenado a indenizar um casal em um total de R$ 12 mil, por danos morais, pelo fato de que o filho deles, ao nascer, ter sofrido uma queda, provocada pelas circunstâncias inadequadas de assistência médica recebidas pela mãe durante o parto em uma unidade municipal de saúde da cidade.

A decisão é da 3ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), que reformou sentença da 1ª Vara da Fazenda Publica Municipal da Comarca de Contagem, onde o pedido de indenização por danos morais havia sido julgado improcedente.

O casal narrou nos autos que em 11 de setembro de 2016 chegou à Fundação Médica e de Urgência de Contagem, em uma ambulância do Samu, para que a mulher pudesse dar à luz.

De acordo com os pais, apesar da urgência da situação, precisaram aguardar muito tempo pelos trâmites para a entrada na unidade. Com isso, a mãe deu à luz durante o processo de transferência dela de uma cadeira de rodas, onde se encontrava, para o leito hospitalar, ocasionando a queda do bebê.

Nos autos, os pais afirmaram que, após a queda, o bebê foi diagnosticado com traumatismo encefálico leve e precisou ficar internado em CTI por dois dias, tendo apresentado ainda sequelas nos dois braços. De acordo com eles, no período gestacional, o feto não havia apresentado qualquer anormalidade.

Em sua defesa, entre outros pontos, o Município afirmou não ter ocorrido erro passível de indenização e sustentou que não ter havido culpa da unidade médica no corrido. Declarou também não ter ficado provado o nexo de causalidade e pediu para o pedido dos pais ser negado.

Recurso

Em primeira instância, o pedido foi julgado improcedente e o casal recorreu, indicando que a indenização não se referia somente à ocorrência de sequelas da vida de sua filha, que não se revelaram permanentes, mas à situação suportada por eles diante do ocorrido, e que teria sido gerada pela conduta da ré para com a gestante e o recém nascido.

Ao analisar os autos, o relator, desembargador Jair Varão, observou inicialmente que a Constituição da República dispõe que “as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.”

No caso dos autos, continuou o relator, os danos decorreriam de acidente ocorrido nas dependências de unidade de saúde municipal, pois durante o trabalho de parto a mãe não teve o tratamento adequado a tempo, dando à luz no corredor da instituição, sem o devido amparo médico, o que provocou a queda do recém-nascido no chão e uma lesão por traumatismo craniano.

O relator verificou que a existência do acidente era incontroversa e que o próprio relatório médico juntado aos autos atestava isso e deixava clara a extensão dos danos causados. 

Abalo psicológico

Pelo contexto analisado e as provas juntadas ao processo, o relator julgou que a conduta omissiva do hospital e a ocorrência do parto em condições inadequada de modo tinham permitido a queda da criança.

O relator observou que o laudo pericial atestava o desenvolvimento adequado da criança para a idade, bem como a ausência de sequelas, e o relatório de alta à época dos fatos indicar a normalidade do quadro neurológico,.

Contudo, ressaltou o magistrado, o documento da alta mencionava “a ocorrência de traumatismo craniano leve e irregularidades no comportamento e nas reações do recém-nascido, sem deixar claro sua causa”.

Assim, o desembargador julgou que cabia ao ente público o dever de indenizar o pai e a mãe pelos danos morais suportados, fixando o valor em R$ 6 mil para cada um.

“O abalo psicológico vivenciado pelos pais de uma criança recém-nascida diante do tratamento degradante a que a parturiente foi submetida no momento em que foi recepcionada pelo hospital, bem como por presenciar a queda da criança e vivenciar a angústia pela incerteza da existência de sequelas, é incontestável”, destacou.

 

O desembargador Maurício Soares e a juíza convocada Luzia Peixôto votaram de acordo com o relator.

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Fonte: TJ-MG

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