Breves comentários da decisão recente do Superior Tribunal de Justiça no Informativo 674[1].
Uma das
decisões mais importantes da atualidade do Direito Previdenciário, diz respeito
sobre o reconhecimento do trabalho rural antes de completar 12 anos de idade
por fato anterior à Lei n. 8.123/1991.
Primeiramente,
é preciso afirmar que anterior da decisão em comento, a averbação do tempo
rural é plenamente possível mediante a utilização de períodos rurais exercidos
até 31 de outubro de 1991 para fins de concessão de aposentadoria por tempo de
contribuição – independentemente de recolhimento de contribuições
previdenciárias (art. 127, V, do Decreto nº 3.048/99).
O art. 55, §
2º, da Lei 8.213/91, estabelece que:
o tempo de serviço rural, em
regime de economia familiar, deverá ser computado independentemente do
recolhimento das contribuições, desde que anterior à data de início da vigência
do referido diploma legal.
De modo
diverso, a decisão recentíssima do STJ coube por afastar a tese
anteriormente firmada pela jurisprudência que somente se reconheceria a
aposentadoria rural a partir dos 12 anos de idade, no qual haviam já
entendimentos pacificados dos tribunais em todo o Brasil, aplicando-se inclusive
a Súmula n. 5 do Tribunal Nacional de Uniformização que:
“A prestação de
serviço rural por menor de 12 a 14 anos, até o advento da Lei 8.213, de 24 de
julho de 1991, devidamente comprovada, pode ser reconhecida para fins
previdenciários”.
O
motivo que determinou o afastamento de imposição de limite de idade específica
para reconhecimento da atividade rural revela claramente que a decisão do STJ,
é que se evite a exploração do trabalho da criança e do adolescente, pois nossa
Constituição Federal de 1988 veda este tipo de prática (art. 7°, XXXIII) como
regra protetora de direitos de menores.
Atente-se
que, a decisão referida visa a prestigiar àquelas pessoas que tiveram sua
infância e adolescência perdida por conta do trabalho rural exercido durante
este período da vida, que muitas vezes não conseguiram concluir seus estudos,
gerando efeitos negativos com esta perda no lapso de tempo que não poderia ser
contada para fins de aposentadoria.
É
certo que, o capricho da alteração jurisprudencial revela o quão necessário o
reconhecimento da atividade rural antes dos 12 anos de idade. Podemos citar um
breve exemplo para fins práticos:
José, desde os nove anos de idade até os 25
anos trabalhou em atividade rural, somando-se 16 anos laborados sem o devido
reconhecimento trabalhista. Faltando
alguns anos para se aposentar, José ingressa com ação judicial com o objetivo
de que seja reconhecido o período trabalho na lavoura desde os 9 anos de idade
até os 25 anos. Os demais períodos que trabalhou foram em atividade urbana,
numa metalúrgica, por 10 anos. Com o reconhecimento judicial da atividade
rural, juntam-se os 25 anos e os 10 anos de carteira assinada.
Na prática, os
problemas relacionados às provas de que a pessoa trabalhou em atividade rural
ainda persistem. Existem situações em pessoa realmente trabalhou, porém, com
pouquíssimas provas seria impossível o seu reconhecimento e, via de
consequência, o insucesso da ação judicial.
Para
contextualizar, o caso do Sr. José apresentado como exemplo, geralmente em
idade avançada, as provas acabam desaparecendo com o tempo, como um falecimento
de um vizinho próximo da terra em que vivia ou mesmo há situações que fazenda
não mais existe, nem mesmo sua escritura pública.
Em terminadas
circunstancias, é possível a produção antecipada de provas no processo, desde
que haja fundado receio de que venha a tornar-se impossível ou muito difícil a
verificação de certos fatos na pendência da ação, como também, o prévio
conhecimento dos fatos possa justificar ou evitar o ajuizamento de ação (art.
381 e seguintes do Código de Processo Civil de 2015). Por exemplo, uma
testemunha que esteja em estado terminal constatado por médico.
É claro que a vivência dos tribunais quanto à
prática tornam-se ainda mais rigorosos se está diante de um reconhecimento mais
benéfico, devido à vantagem da pessoa que não irá pagar os valores atrasados,
entretanto, caberá o julgador do caso analisar todas as provas acerca da
realidade apresentada, a fim de se mitigar quanto ao prejuízo sofrido pela
criança ou adolescente.
De forma
resumida, o reconhecimento de atividade rural pela via judicial torna-se viável
e interessante para os que exerceram em qualquer período durante sua infância
ou adolescência, mas, deverá o interessado trazer todas as provas necessárias
ao processo.
O STJ já se manifestou por meio da súmula 149,
que “a prova exclusivamente testemunhal
não basta para a comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de
benefício previdenciário”.
A solução é
trazer outros elementos de provas, como por exemplo, certidão de nascimento
própria e de eventuais irmãos, Histórico escolar, Processos administrativos de
aposentadoria de familiares, Ficha de Sindicato de Trabalhadores Rurais do pai
de segurado, devendo constar os filhos como dependentes, dentre outros
documentos de provas.
Cumpre
salientar também que, antes mesmo da decisão do STJ, o Tribunal Regional
Federal da 4ª Região decidiu pela
possibilidade de se computar, para fins previdenciários, o trabalho exercido em
qualquer idade (Ação Civil Pública nº 5017267-34.2013.4.04.7100). No
entanto, não havia uniformidade de aplicação desta decisão, mas com o
posicionamento atual do Superior Tribunal de Justiça, seguramente servirá de
base para aplicação em qualquer caso concreto, desde que tenham provas
necessárias, conforme já frisado.
Portanto, como
o julgado recente do STJ, uma vez prestado o trabalho do tempo, deve ser
computado para que se possa mitigar o prejuízo sofrido pelo infante, sem
exonerar o empregador das punições legais às quais se expõe quem emprega ou
explora o trabalho de menores.
[1] AgInt no AREsp 956.558-SP, Rel. Min.
Napoleão Nunes Maia Filho,
Primeira Turma, por unanimidade, julgado em
02/06/2020, DJe 17/06/2020
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