Comentários ao art. 97 da
Lei 8.666/1993
Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2
(dois) anos, e multa.
Parágrafo único. Incide na mesma pena aquele que, declarado
inidôneo, venha a licitar ou a contratar com a Administração.
Tutela Jurídica
Numa
interpretação que se faz ao art.97 da Lei n. 8.666/1996, a tutela jurídica se
insere no contexto representativo da Lei de Licitações num todo e como elemento
marcante os princípios jurídicos da legalidade, moralidade, transparência,
sobretudo, a igualdade entre licitantes.
O problema
maior desta ruptura de legalidade e moralidade está presente no ato de aceitar
que pessoas físicas ou jurídicas que participem das licitações públicas e
contratar com o Poder Público, ente licitante.
É neste
sentido que a esfera penal intervém ao prever a conduta de aceitar que
participem ou assinem contratos, entanto, podemos ir além da esfera penal com
base no consequencialismo jurídico e
no poder de decisão da Administração
Pública no aspecto econômico, ao aceitar um licitante inidôneo é trazer
prejuízos financeiros que por vezes, o ente licitante terá que realizar uma
nova licitação pública se comprovada à inidoneidade profissional.
Em relação da
idoneidade profissional, a Administração Pública tem o dever de afastar o
licitante em decorrência de uma questão lógica, pois seu afastamento é nada
mais é do que a vontade da administração pública em desejar que os seus atos
sejam devidamente cumpridos pela sua fiel observância visto que está relacionado
ao Direito Administrativo sancionador,
restando claro que a medida se ampara no próprio artigo 87 na Lei de
Licitações.
Interessante
extrairmos um trecho do julgado do Superior Tribunal de Justiça, no qual trata
sobre dos efeitos sancionatórios da inidoneidade para licitar abrangendo
inclusive para todas as esferas de Governo[1]:
“A norma geral da Lei 8.666/1993, ao se
referir à inidoneidade para licitar ou contratar com a Administração Pública,
aponta para o caráter genérico da referida sanção, cujos efeitos irradiam por
todas as esferas de governo. A sanção de declaração de inidoneidade é aplicada
em razão de fatos graves demonstradores da falta de idoneidade da empresa para
licitar ou contratar com o Poder Público em geral, em razão dos princípios da
moralidade e da razoabilidade. O Superior Tribunal de Justiça tem entendimento de
que o termo utilizado pelo legislador – Administração Pública -, no dispositivo
concernente à aplicação de sanções pelo ente contratante, deve se estender a
todas as esferas da Administração, e não ficar restrito àquela que efetuou a
punição”
É certo que
deverá estar presente uma sanção anterior,
visto que o próprio artigo 87 da lei de licitações estabelece que pela inexecução total ou parcial do contrato
a administração poderá garantida a prévia defesa, aplicar ao contratado a
declaração de inidoneidade para licitar ou contratar com a administração
pública enquanto perdurarem os motivos determinantes da punição ou até que seja
promovida a reabilitação perante a própria autoridade que a aplicou a
penalidade que será concedida sempre que o contratado ressarcir a administração
pelos prejuízos resultantes e a prova e após decorrido o prazo da sanção
aplicada.
Trata-se, de uma sanção administrativa de
natureza severa, quanto à ocorrência da infração grave que cause dano ou
prejuízo considerável administração pública, sendo imputada a pessoa física ou
jurídica contratada em decorrência da inexecução seja total ou parcial do
contrato previamente realizado.
A suspensão temporária
será aplicada no prazo máximo de dois anos, devendo constar por meio de
processo administrativo regular sendo facultada a defesa prévia do interessado
no prazo de 10 dias úteis.
O resultado do
processo administrativo instaurado em face de pessoa física ou pessoa jurídica
refere-se especificamente, no ato de inidoneidade profissional que, de forma
reincidente não cumpre total ou parcialmente a obrigação contratual traçando
como causa substancial do dano ocasionado ao prejuízo a Administração Pública
em razão da inadimplência do contrato.
O sujeito ativo do crime é o servidor público
no exercício de suas atribuições, mesmo que transitoriamente ou sem
remuneração, cargo, função ou emprego público, sendo equiparado aquele que exerce cargo, emprego ou função em entidade
paraestatal, assim consideradas, além das fundações, empresas públicas e
sociedades de economia mista, as demais entidades sob controle, direto ou
indireto, do Poder Público (art. 84, 1°, da Lei n. 8.666/1996).
Outro sujeito ativo do crime a conduta é
considerada comum podendo ser praticada
por qualquer pessoa desde que tenha sido declarado inidôneo para licitar ou
Celebrar contrato com a administração pública. No entanto, pode ser o
servidor público de outro setor, mesmo de outra repartição pública com correndo
como cidadão comum.
O Sujeito passivo será administração
pública licitante (União estados, DF e Municípios e suas entidades controladas),
os fundos especiais, as autarquias, as fundações públicas, as empresas
públicas, as sociedades de economia mista (art. 1°, parágrafo único, da Lei n.
8.666/1993).
Elemento objetivo
Nos termos do artigo 97, da lei de licitações,
a finalidade impedir que participe da licitação ou mesmo contrate com a administração pública
empresa ou mesmo profissional que tenha sido declarado inidôneo, conforme
mencionado.
Assim temos as
seguintes condutas:
O ato de admitir pode ser considerado
como aceitar permitir ou deixar participar licitante;
O ato de celebrar consubstancia-se
como contratar acordar o mesmo formalizado contrato com empresa ou profissional
declarado inidôneo.
E importante
observar que a admissão de licitante será realizada pela comissão de licitação,
que se efetuará por meio de uma análise prévia da documentação, assim como dos
requisitos exigidos pela legislação e o edital de convocação percebe-se que é
importante na prática todos os interessados na licitação pública observar os
requisitos exigidos da Lei e no edital, no entanto foto de admissão por meio de
comissão de licitação é exclusivamente da administração pública e não pode
ficar omisso Esse ato de controle.
O ato de contratação com a Administração Pública
de pessoa inidônea reveste se como elemento crucial de caracterização, tendo o
dever legal do administrador em desclassificá-lo.
A relação
polêmica no tocante às causas de inidoneidade reveste-se como fator
preponderante artigo 88 da Lei de Licitações, contudo, não tem a mesma natureza
principalmente porque detém um efeito diverso para compreensão não se trata
primeira condenação, muito menos pela prática de ilícitos praticados, isto quer
dizer que, a Lei de Licitações não amplia como elemento de causa de
inidoneidade e nesta perspectiva, não se pode considerar como crime previsto no
artigo 97 da lei de licitações.
No trato o
melhor das palavras para fins de compreensão, não importa para Administração Pública
que uma condenação definitiva por fraude fiscal no recolhimento de tributos
possa ocasionar inidoneidade para contratar com a administração pública,
cabendo a esta o poder sancionatório e penalizador administrativamente como
medida, ao passo que o elemento impeditivo de que terceiros tenham sido
condenados, sempre com base no Processo Administrativo regular, desde que
transitado em julgada a decisão.
Desta forma, enquanto
não houver o transitado em julgado proveniente da decisão administrativa não
poderá ser aplicada a sanção de inidoneidade profissional, ou seja, esgotados
todos os recursos administrativos, consequentemente, impedirá com que se possa
atribuir ao recorrente à condição de declaração inidônea, pois essa situação
ainda pode colaborar, pois não ocorrerá a justa
causa para oferecimento da denúncia por parte do Ministério Público para
fins de imputação penal.
Existe também
a possibilidade de se discutir os pontos da decisão de inidoneidade
profissional do processo administrativo na esfera judicial mesmo após o
transito em julgado de decisão pelo órgão.
Enquanto houver a discussão sobre o ato administrativo em aberto sobre a legalidade da declaração
de inidoneidade, via de consequência, o Ministério Público também não
poderá oferecer a denúncia, conforme já afirmamos.
Portanto, a
questão inerente ao transito em julgado abrangerá também a esfera civil,
enquanto houver a discussão, pois, imagina-se que seja prolatada decisão de
procedência para anulação da inidoneidade profissional (ato administrativo) em
decorrência de ilegalidade.
Consumação e tentativa
O crime
previsto no artigo 97 da Lei licitações se consuma no ato de admissão ou a
celebração de contrato com empresa ou profissional previamente declarado
inidôneo.
É evidente que
a declaração de inidoneidade deverá constar como uma punição administrativa prévia
ou anterior para fins de aplicação na esfera penal. É neste ponto que se
caracteriza como um crime formal, não sendo possível vislumbrar por crime
material, com a devida vênia aos doutrinadores que preconizam em sentido
diverso.
Pune o funcionário público bem como o particular.
No que diz
respeito a punição do particular está relacionado a vantagem recebida de um
profissional ou pessoa jurídica que assina contrato com a Administração
Pública, mesmo estando ciente da declaração de inidoneidade.
É claro que
inexiste a forma culposa (negligência, imprudência ou imperícia) devendo o
autor do delito agir de forma dolosa, ou seja, com a vontade livre e consciente
para a consecução do resultado em assinar contrato com a Administração Pública.
Diferentemente
do ato do funcionário público em admitir a licitação ou celebrar contrato com a
Administração Pública, no caso do particular o crime é formal, ou seja, só se consuma com a produção do resultado naturalístico com a
assinatura do contrato administrativo.
Ação Penal, Procedimentos judiciais e Pena
A Ação Penal
será pública incondicionada, cabendo ao Ministério Público promovê-la, mas
poderá ser admitida ação penal privada subsidiária da pública, se não for
ajuizada no prazo legal, aplicando-se os artigos 29 e 30 do Código de Processo Penal,
conforme previsão do art. 103 da Lei de Licitações Públicas e Contratos
Administrativos.
Em regra, a
competência para processar e julgar será dos Juizados Especiais Criminais (Lei
nº 9.099/1995) por se tratar de crime de menor potencial ofensivo e sua pena
não superior a dois anos.
No entanto,
cumular com outros delitos e ultrapassar os patamares de 2 (dois) anos da pena,
a competência para julgamento será da Justiça Comum, aplicando-se todos os
procedimentos previstos no Código de Processo Penal.
Se a competência
for dos JECRIM, será possível a aplicação da transação penal, ou seja, acordo
realizado entre o acusado e o Ministério Público, no qual o acusado aceita
cumprir as determinações e as condições propostas pelo promotor em troca do
arquivamento do processo[2],
Mas, se a
competência for da Justiça Comum, entendemos como possível a aplicação do
Acordo de Não Persecução Penal[3] devendo preencher todos os
requisitos previstos no art. 28-A do Código de Processo Penal, inserido pelo
Pacote Anticrime.
Quanto
a pena, será de detenção, de 6 (seis)
meses a 2 (dois) anos, e multa, não admitindo que se inicie o cumprimento
em regime fechado, pois a detenção é cumprida no regime semiaberto, em
estabelecimentos menos rigorosos como colônias agrícolas, industriais ou
similares, ou no regime aberto, nas casas de albergado ou estabelecimento
adequado.
[1] REsp 550.553-RJ, Rel. Min.
Hermann Benjamin, DJ 03.11.2009.
[2]Para
fins didáticos, interessante a leitura sobre a transação penal: https://www.tjdft.jus.br/institucional/imprensa/campanhas-e-produtos/direito-facil/edicao-semanal/transacao-penal
[3]Recomendo
ao leitor uma breve leitura deste instituto jurídico importante para
familiarização do termo, inclusive de ordem prática no processo penal
brasileiro, diante da vigência do Pacote Anticrime: https://drluizfernandopereira.blogspot.com/2020/02/analise-critica-sobre-o-acordo-de-nao.html