22/07/2020

CRIMES PREVISTOS NA LEI DE LICITAÇÕES PÚBLICAS: INIDONEIDADE PARA PARTICIPAR DE LICITAÇÃO

A Licitação Pública é um jogo

Comentários ao art. 97 da Lei 8.666/1993

 Art. 97.  Admitir à licitação ou celebrar contrato com empresa ou profissional declarado inidôneo:

Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.

Parágrafo único.  Incide na mesma pena aquele que, declarado inidôneo, venha a licitar ou a contratar com a Administração.

 

Tutela Jurídica

Numa interpretação que se faz ao art.97 da Lei n. 8.666/1996, a tutela jurídica se insere no contexto representativo da Lei de Licitações num todo e como elemento marcante os princípios jurídicos da legalidade, moralidade, transparência, sobretudo, a igualdade entre licitantes.

O problema maior desta ruptura de legalidade e moralidade está presente no ato de aceitar que pessoas físicas ou jurídicas que participem das licitações públicas e contratar com o Poder Público, ente licitante.

É neste sentido que a esfera penal intervém ao prever a conduta de aceitar que participem ou assinem contratos, entanto, podemos ir além da esfera penal com base no consequencialismo jurídico e no poder de decisão da Administração Pública no aspecto econômico, ao aceitar um licitante inidôneo é trazer prejuízos financeiros que por vezes, o ente licitante terá que realizar uma nova licitação pública se comprovada à inidoneidade profissional.

Em relação da idoneidade profissional, a Administração Pública tem o dever de afastar o licitante em decorrência de uma questão lógica, pois seu afastamento é nada mais é do que a vontade da administração pública em desejar que os seus atos sejam devidamente cumpridos pela sua fiel observância visto que está relacionado ao Direito Administrativo sancionador, restando claro que a medida se ampara no próprio artigo 87 na Lei de Licitações.

Interessante extrairmos um trecho do julgado do Superior Tribunal de Justiça, no qual trata sobre dos efeitos sancionatórios da inidoneidade para licitar abrangendo inclusive para todas as esferas de Governo[1]:

A norma geral da Lei 8.666/1993, ao se referir à inidoneidade para licitar ou contratar com a Administração Pública, aponta para o caráter genérico da referida sanção, cujos efeitos irradiam por todas as esferas de governo. A sanção de declaração de inidoneidade é aplicada em razão de fatos graves demonstradores da falta de idoneidade da empresa para licitar ou contratar com o Poder Público em geral, em razão dos princípios da moralidade e da razoabilidade. O Superior Tribunal de Justiça tem entendimento de que o termo utilizado pelo legislador – Administração Pública -, no dispositivo concernente à aplicação de sanções pelo ente contratante, deve se estender a todas as esferas da Administração, e não ficar restrito àquela que efetuou a punição

É certo que deverá estar presente uma sanção anterior, visto que o próprio artigo 87 da lei de licitações estabelece que pela inexecução total ou parcial do contrato a administração poderá garantida a prévia defesa, aplicar ao contratado a declaração de inidoneidade para licitar ou contratar com a administração pública enquanto perdurarem os motivos determinantes da punição ou até que seja promovida a reabilitação perante a própria autoridade que a aplicou a penalidade que será concedida sempre que o contratado ressarcir a administração pelos prejuízos resultantes e a prova e após decorrido o prazo da sanção aplicada.

 Trata-se, de uma sanção administrativa de natureza severa, quanto à ocorrência da infração grave que cause dano ou prejuízo considerável administração pública, sendo imputada a pessoa física ou jurídica contratada em decorrência da inexecução seja total ou parcial do contrato previamente realizado.

A suspensão temporária será aplicada no prazo máximo de dois anos, devendo constar por meio de processo administrativo regular sendo facultada a defesa prévia do interessado no prazo de 10 dias úteis.

O resultado do processo administrativo instaurado em face de pessoa física ou pessoa jurídica refere-se especificamente, no ato de inidoneidade profissional que, de forma reincidente não cumpre total ou parcialmente a obrigação contratual traçando como causa substancial do dano ocasionado ao prejuízo a Administração Pública em razão da inadimplência do contrato. 

O sujeito ativo do crime é o servidor público no exercício de suas atribuições, mesmo que transitoriamente ou sem remuneração, cargo, função ou emprego público, sendo equiparado aquele que exerce cargo, emprego ou função em entidade paraestatal, assim consideradas, além das fundações, empresas públicas e sociedades de economia mista, as demais entidades sob controle, direto ou indireto, do Poder Público (art. 84, 1°, da Lei n. 8.666/1996).

Outro sujeito ativo do crime a conduta é considerada comum podendo ser praticada por qualquer pessoa desde que tenha sido declarado inidôneo para licitar ou Celebrar contrato com a administração pública. No entanto, pode ser o servidor público de outro setor, mesmo de outra repartição pública com correndo como cidadão comum.

O Sujeito passivo será administração pública licitante (União estados, DF e Municípios e suas entidades controladas), os fundos especiais, as autarquias, as fundações públicas, as empresas públicas, as sociedades de economia mista (art. 1°, parágrafo único, da Lei n. 8.666/1993).

 

Elemento objetivo

 Nos termos do artigo 97, da lei de licitações, a finalidade impedir que participe da licitação ou mesmo contrate com a administração pública empresa ou mesmo profissional que tenha sido declarado inidôneo, conforme mencionado.

Assim temos as seguintes condutas:

  O ato de admitir pode ser considerado como aceitar permitir ou deixar participar licitante;

 O ato de celebrar consubstancia-se como contratar acordar o mesmo formalizado contrato com empresa ou profissional declarado inidôneo.

E importante observar que a admissão de licitante será realizada pela comissão de licitação, que se efetuará por meio de uma análise prévia da documentação, assim como dos requisitos exigidos pela legislação e o edital de convocação percebe-se que é importante na prática todos os interessados na licitação pública observar os requisitos exigidos da Lei e no edital, no entanto foto de admissão por meio de comissão de licitação é exclusivamente da administração pública e não pode ficar omisso Esse ato de controle.

O ato de contratação com a Administração Pública de pessoa inidônea reveste se como elemento crucial de caracterização, tendo o dever legal do administrador em desclassificá-lo.

A relação polêmica no tocante às causas de inidoneidade reveste-se como fator preponderante artigo 88 da Lei de Licitações, contudo, não tem a mesma natureza principalmente porque detém um efeito diverso para compreensão não se trata primeira condenação, muito menos pela prática de ilícitos praticados, isto quer dizer que, a Lei de Licitações não amplia como elemento de causa de inidoneidade e nesta perspectiva, não se pode considerar como crime previsto no artigo 97 da lei de licitações.

No trato o melhor das palavras para fins de compreensão, não importa para Administração Pública que uma condenação definitiva por fraude fiscal no recolhimento de tributos possa ocasionar inidoneidade para contratar com a administração pública, cabendo a esta o poder sancionatório e penalizador administrativamente como medida, ao passo que o elemento impeditivo de que terceiros tenham sido condenados, sempre com base no Processo Administrativo regular, desde que transitado em julgada a decisão.

Desta forma, enquanto não houver o transitado em julgado proveniente da decisão administrativa não poderá ser aplicada a sanção de inidoneidade profissional, ou seja, esgotados todos os recursos administrativos, consequentemente, impedirá com que se possa atribuir ao recorrente à condição de declaração inidônea, pois essa situação ainda pode colaborar, pois não ocorrerá a justa causa para oferecimento da denúncia por parte do Ministério Público para fins de imputação penal.

Existe também a possibilidade de se discutir os pontos da decisão de inidoneidade profissional do processo administrativo na esfera judicial mesmo após o transito em julgado de decisão pelo órgão.  Enquanto houver a discussão sobre o ato administrativo em aberto sobre a legalidade da declaração de inidoneidade, via de consequência, o Ministério Público também não poderá oferecer a denúncia, conforme já afirmamos.

Portanto, a questão inerente ao transito em julgado abrangerá também a esfera civil, enquanto houver a discussão, pois, imagina-se que seja prolatada decisão de procedência para anulação da inidoneidade profissional (ato administrativo) em decorrência de ilegalidade.

Consumação e tentativa

O crime previsto no artigo 97 da Lei licitações se consuma no ato de admissão ou a celebração de contrato com empresa ou profissional previamente declarado inidôneo.

É evidente que a declaração de inidoneidade deverá constar como uma punição administrativa prévia ou anterior para fins de aplicação na esfera penal. É neste ponto que se caracteriza como um crime formal, não sendo possível vislumbrar por crime material, com a devida vênia aos doutrinadores que preconizam em sentido diverso.

 

Pune o funcionário público bem como o particular.

No que diz respeito a punição do particular está relacionado a vantagem recebida de um profissional ou pessoa jurídica que assina contrato com a Administração Pública, mesmo estando ciente da declaração de inidoneidade.

É claro que inexiste a forma culposa (negligência, imprudência ou imperícia) devendo o autor do delito agir de forma dolosa, ou seja, com a vontade livre e consciente para a consecução do resultado em assinar contrato com a Administração Pública.

Diferentemente do ato do funcionário público em admitir a licitação ou celebrar contrato com a Administração Pública, no caso do particular o crime é formal, ou seja, só se consuma com a produção do resultado naturalístico com a assinatura do contrato administrativo.

Ação Penal, Procedimentos judiciais e Pena

 

A Ação Penal será pública incondicionada, cabendo ao Ministério Público promovê-la, mas poderá ser admitida ação penal privada subsidiária da pública, se não for ajuizada no prazo legal, aplicando-se os artigos 29 e 30 do Código de Processo Penal, conforme previsão do art. 103 da Lei de Licitações Públicas e Contratos Administrativos.

Em regra, a competência para processar e julgar será dos Juizados Especiais Criminais (Lei nº 9.099/1995) por se tratar de crime de menor potencial ofensivo e sua pena não superior a dois anos.

No entanto, cumular com outros delitos e ultrapassar os patamares de 2 (dois) anos da pena, a competência para julgamento será da Justiça Comum, aplicando-se todos os procedimentos previstos no Código de Processo Penal.

Se a competência for dos JECRIM, será possível a aplicação da transação penal, ou seja, acordo realizado entre o acusado e o Ministério Público, no qual o acusado aceita cumprir as determinações e as condições propostas pelo promotor em troca do arquivamento do processo[2],

Mas, se a competência for da Justiça Comum, entendemos como possível a aplicação do Acordo de Não Persecução Penal[3] devendo preencher todos os requisitos previstos no art. 28-A do Código de Processo Penal, inserido pelo Pacote Anticrime.

         Quanto a pena, será de detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa, não admitindo que se inicie o cumprimento em regime fechado, pois a detenção é cumprida no regime semiaberto, em estabelecimentos menos rigorosos como colônias agrícolas, industriais ou similares, ou no regime aberto, nas casas de albergado ou estabelecimento adequado.



[1] REsp 550.553-RJ, Rel. Min. Hermann Benjamin, DJ 03.11.2009.

[3]Recomendo ao leitor uma breve leitura deste instituto jurídico importante para familiarização do termo, inclusive de ordem prática no processo penal brasileiro, diante da vigência do Pacote Anticrime:  https://drluizfernandopereira.blogspot.com/2020/02/analise-critica-sobre-o-acordo-de-nao.html


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