O conceito de
"domínio do fato" ou "domínio final do fato" não se
satisfaz com a simples referência à posição do indivíduo como administrador ou
gestor (de fato ou previsto no contrato social da empresa). Vale dizer, é
insuficiente considerar tal circunstância, isoladamente, para que se possa
atribuir à responsabilidade penal pela prática de crime tributário.
Certamente,
podemos observar que, a teoria do domínio do fato traça como critério de
distinção do autor do delito para aquele que apenas detém sua participação na
empreitada criminosa, atribuindo o elemento de coautoria.
Neste aspecto,
em 1939 o jurista alemão Hans Welzel preconizou sua tese, juntamente com o
dialogo de cunho finalista, admitia que nos crimes dolosos, é autor quem tem o controle final do fato,
sendo requisito material para a determinação da autoria.
A presença de
dois requisitos necessários para a caracterização de sua tese é marcado pela observância
de elementos fáticos relacionados ao domínio final do fato, ou seja, o autor do
crime detém do poder decisão e execução de sua vontade final, juntamente com questões
estritamente pessoais, ligada ao tipo estrutural do crime.
Em 1963, outro
professor alemão ganhou notoriedade internacional, Claus Roxin em sua obra Täterschaft und TatherrschaftI, robusteceu a teoria do domínio do fato, sendo
aquele que ocupasse uma posição dentro do chamado aparato organizado de poder,
proveniente de um comando para que se executasse um crime, teria de responder
como e autor e não apenas como participe, sendo necessário distinguir o papel
desempenhado por cada um em relação a sua participação.
A teoria de
Claus Roxin, que pode se manifestar em três formas: a) existência do domínio da
ação; b) domínio da vontade e; c) domínio funcional do fato.
a) Existência do domínio da ação: o agente
realiza, por sua própria pessoa todos os elementos estruturais do crime, denominada
como autoria imediata;
b) Domínio da vontade: o terceiro atua
como um instrumento para a prática criminosa, denominada como autoria mediata;
Neste
aspecto, o professor alemão delimitou-se que o domínio da vontade, que poderá ser exercido por meio de:
(i)
Coação exercida sobre terceiro;
(ii)
Por indução a erro de terceiro;
(iii)
Em decorrência de um aparado organizado de
poder, servindo-se de forma estruturada, considerado como autor mediato dos
fatos realizados.
c) Domínio funcional do fato,
caracterizada pela divisão de tarefas para a execução do crime de forma
coordenada, por mais de uma pessoa.
Interessante
pontuarmos que, para a aplicação da teoria do domínio do fato, deve-se limitar
aos crimes de natureza dolosa, ou seja, com intenção de ocasionar determinado
resultado.
Seria inconcebível
aplicar em caso de crimes culposos por razão lógica, pois se exige um conceito
unitário de autor, não distinguindo a autoria e a participação, bem como
inexistindo o domínio sobre o próprio fato.
Feitas tais
considerações teóricas, ainda que de forma sucinta para fins de compreensão
sobre o tema, devemos adentrar ao estudo da decisão recentíssima do Superior
Tribunal de Justiça que afastou quanto aplicação da teoria do domínio do fato
em caso de crimes contra a ordem tributária (REsp 1854893/SP, Rel. Ministro
ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 08/09/2020, DJe 14/09/2020,
INFORMATIVO DE JURISPRUDÊNCIA 681).
Podemos dar
trazer, por exemplo, o caso de uma companheira que assume a empresa em virtude
do falecimento de seu cônjuge, no qual delegou as competências sobre questões tributárias
aos gerentes com conhecimento especializado. Houve a acusação de crime de
sonegação fiscal em face da companheira, requerendo-se a aplicação da teoria do
domínio do fato, imputando-a quanto ao crime previsto no art. 1°, II, da Lei n.
8.137/1990.
O crime de
sonegação fiscal se configura por meio de conduta dolosa, na utilização de procedimentos
que violem direta a lei ou regulamento fiscal, com o escopo de favorecer a si
ou terceiros, por meio de sonegação de qualquer espécie tributária inserta em
nosso ordenamento jurídico.
Numa análise da
decisão do STJ, não se poderia atribuir a responsabilidade de natureza penal pelo
simples fato de determinado sujeito por estar na posição de gestor, diretor ou
sócio administrador da empresa, sendo que, em hipótese alguma poderia-se
atribuir a responsabilização penal por mera presunção, cabendo a acusação
trazer todos os elementos que evidenciem quanto a prática criminosa.
Há que
distinguir a pessoa que não pode pagar tributos por circunstancias alheias a
sua vontade, como em casos que esteja passando por dificuldades financeiras,
daquele que sonega o tributo com a utilização de expedientes espúrios e
motivados por interesses pessoais.
Além disso,
inexiste crime de sonegação de forma culposa, no qual se exige que a conduta
(elemento subjetivo) seja dolosa, portanto, utilizar de procedimentos que
violem a lei ou o regulamento fiscal, com a intenção de favorecer-se ou mesmo a
terceiro.
A importância
da referida decisão do STJ, afastado teoria do domínio do fato, altera seu entendimento
anterior, no qual se estabelecia a interpretação da norma penal e aplicava a
teoria para aquele que concorre para o crime é considerado autor, assim como
aquele que detenha a sua participação de
menor importância responde por crime tributário (art. 29, caput e §1°, do
CP).
Após o
entendimento recente, passa-se afastar por completo a teoria do domínio do fato
ao considerar que a norma penal não deve ser aplicada por presunção,
considerando como severa e sem condição alguma para a sua devida aplicação e
que, na maioria dos casos, nos crimes de sonegação fiscal, a exigência de um
conhecimento técnico, como de um contador ou um especialista, é capaz para se chegar
ao resultado dolosamente e, que por vezes, a delegação de funções é condição ao
pleno funcionamento de uma empresa, devendo distinguir a responsabilidade
objetiva da subjetiva.
Assim, em
decorrência do ato de fraude, assim como para aquele que tiver a real intenção para
a participação para tal ato, a acusação
deve-se atentar que, quanto à demonstração da presença do nexo de causalidade
entre o crime o agente e suas devidas provas.
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