18/11/2022

RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO RESIDENTE



No exercício da medicina na atualidade, ao que se percebe, exige-se o nível de conhecimento elevado com o escopo de trazer à prática a qualidade técnica do médico.

         É por este motivo que a residência médica torna-se essencial com o objetivo de habilitar os médicos ao exercício da medicina, inclusive, o art. 1°, da Lei n. 6.932/1981, estabelece como “modalidade de ensino de pós-graduação, destinada a médicos, sob forma de cursos de especialização, caracterizada por treinamento em serviço funcionando sob a responsabilidade de instituições de saúde universitária ou, sob a orientação de profissionais médicos de elevada qualificação ética e profissional

         Desta forma, se observarmos atentamente quanto a esta exigência prevista em lei segue em conformidade aos padrões éticos, tendo em vista que o Código de Ética Médica (CEM), em seu capítulo XXI, proíbe ao médico “anunciar títulos científicos que não possa comprovar, e especialidade ou área de atuação para a qual não esteja qualificado e registrado no Conselho Regional de Medicina” (Art. 115), bem como, a Resolução do Conselho Federal de Medicina (CFM) nº. 1845, de 2008.

         Adentrando detidamente ao tema proposto, podemos afirmar que a responsabilidade civil consiste na obrigação daquele causa um prejuízo a outrem, devendo reparar em relação ao dano decorrente. Diante desta premissa, o médico residente também deve responder por seus atos não somente civilmente, mas também, penal e ético.

         Salienta-se que, atividade do médico residente deve ser conferida, sob orientação e instrução do médico preceptor definindo a melhor conduta médica a ser aplicada, não cabendo aos residentes à escolha da melhor conduta.

         Em relação a definição de médico preceptor, possui previsão na resolução do CNRM (Comissão Nacional de Residência Médica), Decreto nº 80.281/77; art 1º Lei nº 6.932/81, ipsis literis:

 

“O cargo de preceptor/tutor de programa de Residência Médica será exercido por médico com menos de 10 (dez) anos de conclusão do curso de graduação, portador de certificado de Residência Médica expedido há menos de 05 (cinco) anos e que tenha elevada competência profissional e ética, portador de título de especialista na área afim, devidamente registrado no Conselho Regional de Medicina ou habilitado ao exercício da docência em Medicina, de acordo com as normas legais vigentes.”

         Sobre este prisma que a responsabilidade civil de médico residente e do médico preceptor precisam ser distintos na prática, podendo ser: solidária, subsidiária e exclusiva.

         A responsabilidade solidária se caracteriza quando o médico residente e preceptor respondem conjuntamente.

Conforme decisão recente do Tribunal de Justiça de São Paulo, aplicou esta responsabilidade por entender que o médico residente também responde civilmente[1]. Vejamos:

Apelação. Erro médico. Cesariana. Falecimento da paciente. Ação de indenização por danos morais e materiais. Sentença de parcial procedência. Dano moral fixado em 400 salários mínimos. Danos materiais arbitrados em 2/3 do salário mínimo, desde o falecimento até a idade em que os menores completariam 25 anos. Processo Civil. Aplicação das disposições CPC/1973, ante o princípio "tempus regit actum". Cerceamento de defesa. Não ocorrência. Prova produzida nos autos, sob o crivo do contraditório e com a ampla participação das partes. Observância do princípio do livre convencimento do juiz e da tese de que "uma sucessão de indícios e circunstâncias, coerentes e concatenadas, podem ensejar a certeza fundada que é exigida para a condenação". Preliminar afastada. Legitimidade passiva do hospital e dos médicos que atenderam ao paciente, inclusive do médico-residente. Responsabilidade solidária. Mérito. Erro médico comprovado. Falha na conduta e procedimentos médicos, antes, durante e após a cesariana. Necessidade de realização de novas cirurgias diante das complicações apresentadas, que culminou com o óbito da mãe dos autores. Reconhecimento da existência do liame de causa e efeito. Danos materiais. Pensão fixada em 2/3 do salário mínimo desde o falecimento da genitora dos autores até a data em que completarem 25 anos. Pagamento a ser realizado de uma só vez. Ausência de prova de exercício de atividade laborativa. Vítima que cuidava e cuidaria dos afazeres domésticos e de seus filhos que, na época, eram menores. Necessidade de desenvolvimento de tais trabalhos por terceiros. Dano moral configurado. Dever de indenizar caracterizado. "Quantum" a título de indenização mantido. Observância aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade. Conversão da indenização fixada em salários mínimos para moeda corrente. Sentença mantida. Preliminares rejeitadas. Recursos não providos.

Ademais, o Superior Tribunal de Justiça preconizou seu entendimento recente que, a responsabilidade solidária do médico residente, decorrente de sua diplomação lhe garante direitos e também impõe obrigações e responsabilidades[2].

Responsabilidade subsidiária do médico residente:  decorre quando sempre que restar comprovada de que, a atuação do médico respondente  esteja sob obediência e supervisão do médico preceptor, sendo este último que realizar diagnóstico e o residente acompanha suas orientações.

Há que se compreender “uma certa hierarquia” instituída nessa relação entre médico preceptor e o médico residente, incidindo também, quanto a responsabilidade, inicialmente, apenas do médico preceptor, sendo que, numa eventual impossibilidade, o residente responderá, mas de forma secundária ou subsidiária

         No tocante a Responsabilidade exclusiva dos médicos preceptores, pode ser por ação ou omissão, no qual se obriga por orientar o médico residente no seu proceder médico. Neste caso, o médico preceptor responderá pelo ato do seu discípulo na medida da sua culpa "in vigilando", isto é, tem dever de vigiar o médico residente nas condutas médicas que este tomar.

         Entendemos por fim, que se somente haverá a responsabilidade civil do médico preceptor ou tutor quando houver, de fato, sua “presença profissional”, portanto, em ato conjunto no exercício de suas atribuições. Podemos mencionar a decisão do Tribunal de justiça do Rio Grande do Sul , que não reconheceu que o médico preceptor fosse incluído entre as partes de um processo - a chamada denunciação à lide-, pois entendeu que o erro do medico residente se deu em ato cirúrgico para o qual o seu preceptor não fora convocado a comparecer[3].

         De modo geral, as decisões dos Tribunais Superiores não tem aplicado a teoria acima referida, sendo considerada como minoritária, tendo em vista que a responsabilidade civil é de natureza subjetiva, ou seja, cada um responde por atos, dentro dos seus respectivos limites.

         Afirma-se que, os médicos residentes também devem cumprir a tarefa de trazer juízo de valor sobre suas condutas médicas, de acordo com a ciência e não apenas na avaliação apresentada por seus preceptores. Podemos citar um breve exemplo, preceptor que obriga o médico residente a inserir determinados dados irrelevantes no receituário do paciente, em contrariedade ao Código de Ética Médica, especialmente o art. 85:

"Utilizar-se de sua posição hierárquica para impedir que seus subordinados atuem dentro dos princípios éticos".

Considerações finais

Diante de uma breve exposição sobre o tema, podemos considerar como necessário distinguir as espécies de responsabilidade civil, para que seja devidamente aplicada a lei o caso concreto.

Frisa-se que, a responsabilidade civil, tanto do médico residente, quando te seu preceptor é subjetiva, sendo imputado dentro dos seus limites de sua atuação, podendo ser majorada ou minorada determinada conduta e o dano efetivamente ocasionado.

É neste critério que impera aplicação em nossos Tribunais a responsabilidade solidária em que ambos os tutor e aprendiz respondem conjuntamente por seus atos.

Aos aconselhamentos para atuação preventiva é:

a)   O preceptor deve atentar-se com que ocorre no dia-dia do hospital ou clinica médica, inclusive, quanto as deficiências e qualidades dos médicos residentes, atuando como um verdadeiro gestor de pessoas, gerando ainda mais garantias nas suas atividades, podendo tomar medidas enérgicas, como por exemplo, excluir residente desidioso do programa que está vinculado.

 

b)   O médico residente deve estar atendo com sua conduta, ainda que atue sob vigilância e cuidado do seu preceptor, pois o atributo de seu diploma médico não exclui de sua responsabilidade, respeitando também, padrões éticos.

 

Neste ponto, qualquer irregularidade ou ilegalidade deve ser denunciado por ato de seu preceptor, juntando +as devidas provas de que seus atos foram precedidos do seu tutor, como conversas de aplicativos de mensagens instantâneas, fotos de documentos, email, etc.

 

 



[1] TJ-SP 00079806620078260482 SP 0007980-66.2007.8.26.0482, Relator: Edson Luiz de Queiróz, Data de Julgamento: 20/02/2018, 9ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 21/02/2018)

[2] STJ - REsp: 1328457 RS 2012/0121455-4, Relator: Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, Data de Julgamento: 11/09/2018, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 17/09/2018.

[3] Embargos Infringentes n° 70002326569, terceiro grupo de câmaras cíveis, tribunal de justiça do RS. relator: Des. Osvaldo Stefanello, julgado em 23/11/01.


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06/11/2022

ERRO MÉDICO E SUAS CONSEQUENCIAS JURÍDICAS



         A atuação do médico é vista como algo em que se exige do profissional ao empregar técnicas adequadas, seguindo aos ditames da ciência médica.

         É preciso observar que, nem todo e qualquer resultado na atuação do profissional será caracterizado por erro, sendo necessária cautela para que seja responsabilizado em três esferas independentes. Vejamos quais sao:

·        Responsabilidade Administrativa/Ética: Perante o Conselho Regional de Medicina decorrente de denúncia, para abertura de processo ético disciplinar em face do médico visando eventual punição administrativa.

 

·        Responsabilidade Criminal: por meio de Inquérito Policial, Denuncia do Ministério Público e a consequente Ação Penal em face do médico.

 

·        Responsabilidade Civil: por ação indenizatória decorrente de dano material e/ou moral, se constatado.

 

         Trataremos apenas as questões relacionadas à responsabilidade civil, em linhas a seguir.

Importante salientar que, a responsabilidade do profissional liberal é subjetiva, de acordo com grau de culpa a ser apurada pela prática de seus atos, aplicando-se ao disposto no art. 14, §4°, do Código de Defesa do Consumidor:

Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

§ 4º A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa.

         Adentrando ao tema proposto, podemos afirmar que, para que seja imputada a culpa do médico, deverá conter situações específicas, como:

·        Imperícia

·        Imprudência

·        Negligência.

Vejamos cada um destes elementos essenciais detalhadamente:

         A Imperícia médica indica falta de competência, de experiência e habilidade no exercício habitual das atividades médicas. Por exemplo, um médico especialista em clínica médica, porém, realiza cirurgia em pacientes para colocar prótese de silicone.

Há duas situações distintas que precisam ser observadas acerca da imperícia médica.

1.   Exercer especialidade não registrada é infração ética: pois, o Código de Ética Médica (CEM), em seu capítulo XXI, proíbe ao médico “anunciar títulos científicos que não possa comprovar, especialidade ou área de atuação para a qual não esteja qualificado e registrado no Conselho Regional de Medicina” (Art. 115), bem como, a Resolução do Conselho Federal de Medicina (CFM) nº. 1845, de 2008.

 

Atualmente, existem duas formas de se obter o título de especialista na área médica:

·        Por meio de concurso ou avaliação da respectiva Sociedade de Especialidade Médica, realizada após o profissional ter concluído um curso, estágio ou outra forma de capacitação;

 

·        Ser titulado como especialista após frequentar um programa de Residência Médica (RM) reconhecido pelo MEC.

 

2.   Para fins de responsabilidade civil do médico somente se constituirá a imperícia médica por meio de laudo médico e que seja constatado o dano de sua conduta[1].

         Retomaremos com mais detalhes adiante quando tratarmos sobre o dano aplicado em todos os casos de responsabilidade por culpa.

         A Imprudência médica se caracteriza quando o profissional age sem cautela necessária, não se preocupando com as futuras consequências de seu ato.

         Por exemplo:

·        Médico que realiza um determinado procedimento cirúrgico sem o acompanhamento de uma equipe profissional, pode culminar em sua responsabilidade.

 

·        Médico que dá alta médica sem as devidas cautelas necessárias, ocorrendo o óbito logo após a alta[2].

A Negligência médica é o ato de descuido, desatenção profissional, com descaso, inclusive, de seus deveres éticos.

Podemos citar alguns exemplos práticos, dentre tantos:

·        Médico que esquece material cirúrgico dentro do corpo do paciente. Trata-se de um erro comum, mas que poderia muito bem ser evitado durante o procedimento.

 

·        Médica plantonista que não identificou a fratura no fêmur do autor e deu alta médica. Requerente que, após alguns dias da alta, compareceu ao consultório de um médico especialista que identificou a fratura e realizou cirurgia. Prova pericial que atestou que a médica não solicitou os exames necessários para o diagnóstico da fratura do autor. Negligência. Responsabilidade das requeridas configurada[3].

 

·        Médica que não se dignou examinar pessoalmente o bebê, a despeito das inúmeras advertências da equipe de enfermagem[4].

 

·        Demora no diagnóstico do médico de apendicite aguda que culminou em cirurgia invasiva com a responsabilidade parcial de outros órgãos, gera indenização[5].

 

A Justiça tem entendido que, deve estar presente o nexo causal entre o serviço prestado e o dano para que se caracterize a responsabilidade civil do médico decorrente de sua conduta negligente.

Podemos citar o caso do paciente que perdeu parte do dedo em razão de negligência médica, por falta de solicitação de exames para verificação do diabetes.

Nesta situação, o Tribunal de Justiça de São Paulo entendeu que, constatada a diabetes pelo hospital, foi ofertado tratamento ao paciente e remédios para a infecção no dedo, inclusive, com a evolução da infecção que resultou em amputação e desta forma, é ausente de prova de negligência médica ou de falta de prestação de assistência médica pelo ente público[6].

É interessante observarmos que, o caso apresentado é característico de Iatrogenia[7], pois, a amputação do dedo do paciente é a consequência do seu estado de saúde, não havendo direito à indenização.

Portanto, em todos os casos de culpa médica (negligência, imprudência ou imperícia) acima tratados, deve haver o liame causal entre a conduta da equipe médica profissional (negligência), e as lesões físicas do paciente, que implicam o reconhecimento do dano e o dever de indenizar[8], caso contrário, não pode ter cunho indenizatório.

Em relação ao dano proveniente de erro médico, (aplicável em todos os casos) podemos classifica-los em:

·        Dano material: também denominado como dano patrimonial, é o prejuízo que ocorre no patrimônio da pessoa, ou seja, perda de bens ou coisas que tenham valor econômico, podendo ter: Lesão permanente/Temporária (art. 402, CC/02).

·        Existe a possibilidade do pagamento de salário mínimo decorrente da perda patrimonial à vítima ou a seus familiares (art. 951, CC).

 

·        Dano estético: configura-se por lesão à saúde ou integridade física de alguém, que resulte em constrangimento. São lesões que deixam marcas permanentes no corpo ou que diminuam sua funcionalidade como: cicatrizes, sequelas, deformidades ou outros problemas que causem mal estar ou insatisfação (base legal: art. 186, CC/02).

 

·        Dano moral: é a violação da honra ou imagem de alguém. Resulta de ofensa aos direitos da personalidade (intimidade, privacidade, honra e imagem).art. 1°, II, CF, art. 186, CC, art. 12 e 14, CDC.

Frisa-se, haja indenização, tanto o erro de diagnóstico, quanto o erro de prognóstico devem gerar dano ao paciente.

Assim, em toda e qualquer situação decorrente de erro médico, a prova pericial é essencial para constatar se houve ou não a conduta culposa do médico e não somente imputar tal responsabilidade, cabendo também ao profissional da saúde o direito ao contraditório e a ampla defesa, independentemente se for processo civil, penal ou administrativo (ético).

Cumpre ao paciente estar atento quanto à mesma lógica, pois, conforme trazido aqui, deverá provar que houve erro médico, também por meio de laudo e demais documentos.

Podemos elencar algumas provas essenciais do erro médico para eventual ação ou defesa judicial, como:

a) Prontuário médico: são informações registradas a respeito de um paciente.

b) Termo de consentimento informado (TCI): documento assinado pelo paciente quando vai receber uma cirurgia ou tratamento.

c) Termo de Consentimento Esclarecido: (TCLE): participante de pesquisa científica (Resp. 466/12, CNS)

d) Relatório/anotação da enfermagem.

Importante frisar que, cabe ao médico  ter atenção redobrada quanto aos documentos acima descritos, pois tais provas também podem ser úteis para a sua defesa em um eventual processo, seja de qualquer natureza for.

Além disso, é preciso ter atenção não somente as provas em si, como também o prazo para ingressar com ação judicial por erro médico.

O Superior Tribunal de Justiça entende que a ação proposta para cobrança de indenização por erro médico está submetida ao prazo prescricional de cinco anos, conforme estabelecido no art. 27 do Código de Defesa do Consumidor[9].

Assim temos uma dupla visão:

1)   Cabe ao paciente lesado ou seus familiares promover ação por erro médico em até 05 (cinco) anos, a contar do fato ocorrido;

 

2)   No aspecto técnico, se o paciente promove ação por erro médico além do prazo previsto em lei (05 cinco anos), o médico não terá mais o dever de indeniza-lo.

 



[1] Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul TJ-MS - Apelação Civel: AC 621 MS 2008.000621-9;

[2] TJ-PR - processo cível e do trabalho recursos apelação apl 00083710720138160056 pr 0008371-07.2013.8.16.0056 (acórdão) (tj-pr).

[3] TJPR - 10ª C.Cível - AC - 1639188-7 - Ponta Grossa - Rel.: - Unânime - J. 11.05.2017 .

[4] TJ-SP - Apelação APL 40033701420138260114 SP 4003370-14.2013.8.26.0114 (TJ-SP)

[5] TJ-SP - Apelação Cível AC 10310899420178260562 SP 1031089-94.2017.8.26.0562 (TJ-SP)

[6] TJ-SP - Apelação Cível AC 10145015120148260001 SP 1014501-51.2014.8.26.0001 (TJ-SP).

[7] O termo iatrogenia deriva do grego (iatros = médico / gignesthai = nascer, que deriva da palavra genesis = produzir) e significa qualquer alteração patológica provocada no paciente pela má prática médica 1,2. O termo doença cardíaca iatrogênica é usualmente definido como doença do coração induzida pelo médico.

[8] TJ-SP - Apelação Cível AC 00067710820118260002 SP 0006771-08.2011.8.26.0002 (TJ-SP)

[9] STJ, AgRg no AREsp n. 626.816/SP.

26/10/2022

DIREITO AO AUXÍLIO MORADIA NA RESIDÊNCIA MÉDICA



Um dos direitos desconhecido por muito médicos residentes, sem sombra de dúvidas, é o auxílio moradia.

         Antes mesmo de adentrarmos ao tema proposto, é importante mencionar que, no geral, as pessoas acabam criando certos “pré-conceitos”, sem mesmo saber mais detalhadamente o sentido e o alcance de uma lei, ao afirmar que absurdamente: “médico não precisa de auxílio moradia”. Ora, nem todos vivem a mesma realidade! É o que explicaremos a seguir.

         O direito ao auxílio moradia possui previsão legal e será concedido aos médicos, durante ou após a conclusão da residência, vinculados de suas respectivas instituições, sejam estas federais, estaduais ou municipais.

         É preciso esclarecer que, a lei trouxe com primor a questão econômica do profissional ligada à formação de um médico em nosso País, pois a residência médica tem por finalidade o aperfeiçoamento teórico e prático, dentro de um conhecimento específico da Medicina, acompanhado de um tutor para tais atividades.

Nos termos do art. 1° da Lei 6.932/1981 estabelece que:

Art. 1º - A Residência Médica constitui modalidade de ensino de pós-graduação, destinada a médicos, sob a forma de cursos de especialização, caracterizada por treinamento em serviço, funcionando sob a responsabilidade de instituições de saúde, universitárias ou não, sob a orientação de profissionais médicos de elevada qualificação ética e profissional.

O art. 6° da referida lei, trata sobre a importância da residência médica, pois habilitarão os profissionais com o título de especialistas em determinada área da medicina[1].

         Há que se afirmar, a bolsa que o médico recém-formado recebe nem sempre cobrirá as suas despesas necessárias.

Podemos citar, por exemplo, um médico aprovado em residência na cidade de São Paulo, porém, natural de outro Estado. Este médico terá que morar na cidade em que foi aprovado, mas, ciente de que o custo de vida é maior do que imaginava.

         Claramente, o médico residente não precisa ser de outra Cidade ou Estado para ter o direito ao auxílio moradia, basta ser residente, pois a lei não trata sobre esta restrição.’’

         E qual lei disciplinou sobre o direito ao auxílio moradia?

A moradia ao médico residente possui previsão na Lei 6.932/1981 e Lei 12.514/2011, podendo ser regulamentado por atos normativos das instituições de saúde.

O art. 4º, § 5º da Lei Federal nº 6.932/81, com redação dada pela Lei nº 12.514/2011, dispõe que:

§ 5º A instituição de saúde responsável por programas de residência médica oferecerá ao médico-residente, durante todo o período de residência:

I - condições adequadas para repouso e higiene pessoal durante os plantões;

II - alimentação; e

III - moradia, conforme estabelecido em regulamento.

         Salienta-se que, muitas instituições de saúde não complementaram adequadamente as leis vigentes, ignorando por completo este direito previsto em lei. Desta forma, cabe ao médico residente ingressar com ação judicial.

         Existem duas situações específicas:

1.   Médico (a) que ainda não concluiu a residência médica:

Faz jus ao pagamento de indenização relativa ao auxílio-moradia correspondente a 30% do valor da bolsa que recebe mensalmente.

2.   Médico (a) que já concluiu a residência médica

Nesta situação o médico que já concluiu a residência médica terá que entrar com uma ação judicial com o objetivo de receber os valores que deixou de receber durante a residência, correspondente a 30% do valor da bolsa que recebeu.

         Lembrando que o auxílio moradia poderá ser pago de forma retroativa, contando-se 5 (cinco) anos do término da residência, sendo exigido apenas as parcelas não pagas neste período.

Em ambos os casos, não é necessário comprovar os gastos com moradia para ter direito à indenização.

 

         A instituição recusa a pagar alegando que é lei federal não se aplica para os Estados e Municípios.

         Um dos grandes equívocos de interpretação é afirmar que, por se tratar de uma lei federal não deve ser aplicada para Estados e Municípios.

         Ao contrário desta interpretação, a lei que concede ao direito ao auxílio moradia é federal, devendo abranger todos os entes da federação (Estados, Municípios, autarquias e fundações), mesmo que ausente de lei específica.

         Portanto, se o médico é residente (ou já foi), em qualquer instituição governamental, terá o mesmo direito ao auxílio moradia.



[1] Art. 6º - Os programas de Residência Médica credenciados na forma desta Lei conferirão títulos de especialistas em favor dos médicos residentes neles habilitados, os quais constituirão comprovante hábil para fins legais junto ao sistema federal de ensino e ao Conselho Federal de Medicina.


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08/09/2022

COMPREENSÕES SOBRE A REMOÇÃO DO SERVIDOR PÚBLICO, CONFORME JURISPRUDÊNCIA DOS TRIBUNAIS SUPERIORES


 

          Inicialmente, podemos afirmar que a remoção do servidor público é um meio que se dá quando o funcionário busca obter outra destinação  para o exercício de suas atribuições passando a trabalhar em outra localidade, porém, permanecendo no mesmo quadro pessoal, conforme motivos especificados em lei.

         Cada entidade ou órgão público vinculado possui regras próprias de remoção de servidor público, de acordo com seu respectivo estatuto.

A Lei n. 8.112/1990 (Estatuto dos Servidores Públicos Federais), podendo Estados e Municípios também tratarem sobre a temática.

Surge uma breve indagação com viés interpretativo, afinal, é possível aplicar a Lei n. 8.112/1990 na ausência de lei local disciplinando sobre a remoção do servidor público?

Com base no princípio da legalidade, cada ente federativo possui autonomia para poder disciplinar por meio de lei própria o seu regime jurídico dos servidores públicos.

Regra geral, não é possível um ente federativo usar por analogia as normas de outro órgão, por violar o princípio da legalidade estrita, bem como, o princípio do pacto federativo e autonomia.

Entretanto, se o Estatuto Estadual ou Municipal dos Servidores Públicos for omisso, somente será possível aplicar a legislação federal se estiver relacionada a direito constitucional, cabendo ser avaliada caso a caso, segundo jurisprudência pacifica do Superior Tribunal de Justiça[1].

         Em se tratando de remoção de servidores públicos, entendemos como possível aplicar por analogia a Lei 8.112/1990, com o escopo de suprir a legislação estadual ou municipal, pois, a finalidade de remoção dos servidores está presente na promoção de direitos fundamentais, como a hipótese de remoção do servidor para acompanhar cônjuge o,u companheiro, também servidor, que foi deslocado no interesse da Administração ou, quando se tratar de saúde do servidor, cônjuge ou companheiro.

         É preciso observar que, ainda que seja possível aplicar a referida lei federal por analogia, é preciso deixar claro que será fundamental a análise de cada caso concreto, visto que seria impossível remover o servidor público estadual para municipal ou qualquer outro órgão público sem vinculo algum, sendo exigível que se transfira no mesmo órgão em que o servidor público atue. Por exemplo, remoção do servidor da Secretária da Educação Estatual para a Secretaria da Cultura.

 

         A remoção dos servidores públicos federais

         Nos termos do art. 36, da Lei n. 8.112/1990, a remoção pode ocorrer a pedido do próprio servidor ou de ofício, independente da vontade do funcionário público e desde que seja do mesmo quadro da sede que o servidor público possua vinculo. Vejamos o referido artigo:

Art. 36. Remoção é o deslocamento do servidor, a pedido ou de ofício, no âmbito do mesmo quadro, com ou sem mudança de sede.

Parágrafo único. Para fins do disposto neste artigo, entende-se por modalidades de remoção:

I – de ofício, no interesse da Administração;

II – a pedido, a critério da Administração;

III – a pedido, para outra localidade, independentemente do interesse da Administração:

 

a) para acompanhar cônjuge ou companheiro, também servidor público civil ou militar, de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, que foi deslocado no interesse da Administração;

b) por motivo de saúde do servidor, cônjuge, companheiro ou dependente que viva às suas expensas e conste do seu assentamento funcional, condicionada à comprovação por junta médica oficial;

c) em virtude de processo seletivo promovido, na hipótese em que o número de interessados for superior ao número de vagas, de acordo com normas preestabelecidas pelo órgão ou entidade em que aqueles estejam lotados.

 

Teceremos breves comentários de cada situação:

1.   Remoção de ofício:

É a hipótese em que a Administração Pública determina a remoção de seu servidor, de acordo com o interesse do órgão integrado. Por exemplo: Universidade Federal designa a remoção de seu professor público federal para outro órgão da federação em decorrência de pouco profissionais para atuação.

 

2.   Remoção a pedido, a critério da Administração:

Decorre quando for solicitada pelo próprio servidor público que pede administrativamente a remoção por meio de um requerimento administrativo.

Não se trata de um direito subjetivo do servidor público, pois somente será aceito conforme interesse da Administração Pública para que o servidor possa ser removido, segundo conveniência e oportunidade, assim como por meio de decisão fundamentada.

 

3.   Remoção a pedido, para outra localidade, independentemente do interesse da Administração:

Nesta hipótese, o servidor público solicita perante ao órgão público vinculado, porém, gera um direito subjetivo em decorrência de circunstâncias previstas em lei. Portanto, é um direito liquido e certo.

Conforme já transcrevemos, o art. 36 da Lei 8.112/1990 dispõe sobre três hipóteses em que o servidor público poderá requerer administrativamente sua remoção, sem que o órgão público vinculado intervira no seu direito.

Vejamos cada uma delas com breves comentários:

a) Para acompanhar cônjuge ou companheiro, também servidor público civil ou militar, de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, que foi deslocado no interesse da Administração;

A Lei Federal não dá margem de dúvidas que o servidor público poderá solicitar sua remoção independentemente do interesse da Administração Pública, para acompanhar cônjuge ou companheiro que foi deslocado no interesse do órgão vinculado.

O cônjuge é aquela pessoa que vive casada maritalmente e companheiro (a) são os que vivem numa união pública, continua e duradoura com o escopo de constituir família.

No que diz respeito às provas documentais, a certidão de casamento e a declaração de união estável são documentos indispensáveis para que o servidor público possa requerer a sua remoção, além de provar que o cônjuge ou companheiro foi descolado de sua residência conforme o interesse do órgão vinculado, devendo ter um documento oficial deste deslocamento.

A Administração Pública não goza de discricionariedade na concessão da licença para acompanhar cônjuge prevista no art. 84 da Lei 8.112/1990, tratando-se, em verdade, de direito subjetivo do servidor público, uma vez preenchidos os requisitos legais pertinentes[2]

Recentemente, o Superior Tribunal de Justiça vem interpretando a licença remunerada prevista no art. 84, § 2º, da Lei n. 8.112/1990 como direito subjetivo do servidor, bastando para a lotação provisória a comprovação do deslocamento do cônjuge-servidor, não importando se a mudança de exercício do cargo público tenha se realizado a pedido ou de ofício pela Administração, excetuando-se os casos decorrentes da aprovação em concurso público (provimento originário)[3].

 

b) por motivo de saúde do servidor, cônjuge, companheiro ou dependente que viva às suas expensas e conste do seu assentamento funcional, condicionada à comprovação por junta médica oficial;

 

É um direito subjetivo a remoção do servidor público do próprio motivo de saúde ou do seu cônjuge, companheiro (a) ou dependente, desde que esta necessidade seja atestada por junta médica oficial.

 

O Superior Tribunal de Justiça já se manifestou pela possibilidade de remoção de Servidores Públicos Federais (Professores) para outra Autarquia (Universidade Federal diversa), considerando ser possível a interpretação, ainda que unicamente para fins de aplicação do art. 36 da Lei nº 8.112/90 (remoção por motivo de saúde), de que o cargo de docentes de Autarquias Federais pertence a um mesmo quadro de Professores Federais vinculado ao Ministério da Educação[4].

c) em virtude de processo seletivo promovido, na hipótese em que o número de interessados for superior ao número de vagas, de acordo com normas preestabelecidas pelo órgão ou entidade em que aqueles estejam lotados.

Esta espécie de remoção é decorrente do ato da Administração Pública ao promover processo seletivo para o preenchimento de vagas por meio concurso interno, ao passo que, se o servidor for aprovado no processo seletivo terá o direito subjetivo de ser removido.

Pode a Administração revogar a remoção de servidores neste caso?

Pode, a critério do interesse da Administração Pública.

Entretanto, não pode modificar ou alterar requisitos que a Administração Pública fixou para si e para os servidores no curso do processo de remoção.

 Essa é a orientação do Superior Tribunal de Justiça quando afirma que: “Estatui o brocardo jurídico: 'o edital é a lei do concurso'. Desta forma, estabelece-se um vínculo entre a Administração e os candidatos, igualmente ao descrito na Lei de Licitações Públicas, já que o escopo principal do certame é propiciar a toda coletividade igualdade de condições no serviço público. Pactuam-se, assim, normas preexistentes entre os dois sujeitos da relação editalícia[5].

Portanto, se não houve previsão no edital do processo seletivo interno disciplinando sobre o ato de revogação da remoção a Administração Pública não poderá revogar por contrariar ao princípio da vinculação ao edital e da legalidade.

Atuação do advogado no processo de remoção do servidor público

Num primeiro momento, cabe ao interessado (servidor público) requerer a administrativamente a sua remoção. O pedido administrativo não necessita ser elaborado por advogado, porém, deve ser devidamente fundamentado para que seja possível ser concedido o direito em favor do servidor público.

Em se tratando de indeferimento da administração pública quanto a postulação de remoção do servidor público, existem dois caminhos juridicamente importantes:

1)   Promover ação de mandado de segurança, desde que a data do indeferimento administrativo esteja no prazo de até 120 dias, assim como, que tenham provas suficientes do pedido a ser postulado;

 

2)   Quando ultrapassado o período previsto em lei para ingressar com ação de mandado de segurança, poderá promover uma ação anulatória do ato administrativo que indeferiu o pedido de remoção do servidor público.



[1] RMS 46.438-MG, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 16/12/2014, DJe 19/12/2014.

[2] AREsp 1.634.823/RS, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 25/6/2020.

[3] STJ - REsp: 1972608 CE 2021/0351677-5, Relator: Ministro BENEDITO GONÇALVES, Data de Publicação: DJ 20/04/2022.

 

[4] AgInt no REsp 1.563.661/SP, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, julgado em 10/04/2018, DJe 23/04/2018). Precedentes desta Corte Regional no mesmo sentido: (Processo 0801872-33.2019.4.05.8000, Apelação Cível, Rel. Desembargador Federal Rogério Fialho Moreira, 3ª Turma, Julgamento: 26/06/2020; Processo 0800004-81.2019.4.05.8303, Apelação/Remessa Necessária, Rel. Desembargador Federal Leonardo Augusto Nunes Coutinho (Convocado), 3ª Turma, Julgamento: 27/08/2020; e Processo 0808448-45.2015.4.05.8400, Apelação Cível, Rel. Desembargador Federal Fernando Braga Damasceno, 3ª Turma, Julgamento: 17/12/2020).

 

[5] MS 9253/DF, Rel. Min. GILSON DIPP, DJ/I de 08.06.2005.

25/08/2022

Notícia jurídica: "Concedida aposentadoria por incapacidade permanente a diarista com enfermidades crônicas"




O Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) determinou a concessão de aposentadoria por incapacidade permanente a uma diarista de 56 anos de Lauro Muller (SC) com insuficiência renal, hipertensão e dor lombar. Conforme decisão unânime da 9ª Turma, proferida em 19 de agosto, embora a perícia tenha concluído pela capacidade laboral, a idade e a limitada habilitação profissional indicam incapacidade definitiva, podendo o colegiado discordar do laudo com base em outros aspectos apresentados pelo segurado.


A ação foi ajuizada pela segurada enquanto ela recebia auxílio-doença por estar impossibilitada de realizar esforço físico devido a piora das doenças. Em 2015, o INSS cessou o pagamento do benefício após a perícia concluir que havia condições para o retorno ao trabalho. Ela pediu o restabelecimento do auxílio, contudo, a Vara da Comarca de Lauro Muller julgou improcedente o pedido e a autora recorreu ao TRF4.

O desembargador Paulo Afonso Brum Vaz deu provimento para implantação do benefício, com pagamento retroativo desde a data do requerimento administrativo, em fevereiro de 2015. Em seu voto, o relator salientou que "o juízo não está adstrito às conclusões do laudo médico pericial, nos termos do artigo 479 do NCPC, podendo discordar, fundamentadamente, das conclusões do perito em razão dos demais elementos probatórios coligidos aos autos". "Ainda que o laudo pericial realizado tenha concluído pela aptidão laboral da parte autora, a confirmação da existência da moléstia incapacitante referida na petição inicial, corroborada pela documentação clínica, associada às condições pessoais - habilitação profissional e idade atual - demonstra a efetiva incapacidade definitiva para o exercício da atividade profissional, o que enseja, indubitavelmente, a concessão de auxílio por aposentadoria por incapacidade permanente", concluiu Brum Vaz. O INSS tem 20 dias para implantar o benefício. As parcelas anteriores deverão ser pagas com juros e correção monetária.

Fonte: Tribunal Regional Federal da 4ª Região

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