Antes de
adentrarmos ao tema, interessante tecermos breves considerações sobre Direito Positivo,
Ciência do Direito, Norma jurídica
Inicialmente, fazendo-se o substrato
empírico sobre o tema, podemos afirmar que o Direito Positivo é caracterizado
pela vontade do legislador, no qual se dirige à região de condutas
intersubjetivas com o objetivo em discipliná-las. Tem por funcionalidade
prescritiva, ou seja, a vontade maneja aquele que produz e regula o
comportamento de outrem.
No Direito Positivo, encontra-se devidamente
alojado em seu interior o dever-ser, plasmado pelo modal deôntico (permitido
proibido ou obrigatório), adjacente da lógica jurídica como espécie (Hipótese
condicional – H>C), no qual representam valores da linguagem prescritiva.
Distintamente, a Ciência do Direito tem
um a função descritiva, pois a vontade de seu emitente é relatar, informar o
receptor da mensagem como é o Direito Positivo. Nesta situação cumpre ao
jurista de estabelecer esta tarefa, enquanto no Direito Positivo, a tarefa do
legislador é a sua promoção.
Que é Norma
jurídica?
Adentrando-se ao estudo, norma jurídica
e regramento do Direito são sinônimos, segundo o mestre Paulo de Barros
Carvalho (2012:42). Partiremos num ponto acerca dos ensinamentos de Hans Kelsen
em que este mestre declinava o conceito de norma jurídica como representativo
de uma categoria lógica fundamental, erigindo em unidade do Direito positivo e
em objeto da Ciência do Direito.
Assim, atenta-se um dever ser, expressão
de uma norma que traduz a conduta que individuo deve assumir em determinadas
circunstancias, haja vista que a tarefa do legislador exige também a cognição
prévia do Direito.
Por certo, quando estamos a expor sobre
as normas jurídicas, há que mencionar uma linha dúplice entre as “lato sensu” das “stricto sensu”.
As normas jurídicas “lato sensu” são as promovidas por
critérios denotativos cuja mensagem deôntica é inacabada ou incompleta.
Conforme nos ensina Paulo de Barros Carvalho, são frases, enquanto suporte
físico do Direito posto, ou texto de lei quanto aos conteúdos significativos
isolados.
Em relação as normas jurídicas “stricto sensu”, distintamente da outra
tratada linhas acima, expressam uma mensagem deôntica completa no qual são
construídas e estruturadas na forma hipotético-condicional.
Sobre os enunciados prescritivos, é
possível constatarmos sua funcionalidade pragmática, ou seja, tem uma natureza
objetiva por simplesmente prescrever condutas.
Por fim, os textos de lei, se quando
estruturados e construídos de acordo com os juízos condicionais, são compostos
por dois ou mais proposições prescritivas.
É preciso identificar adequadamente o suporte
físico, o significado e a significação, nos planos da linguagem do Direito
Positivo e da Ciência do Direito.
Ao traçarmos uma linha divisória
imaginária, podemos fazer a seguinte distinção entre Direito Positivo e Ciência
do Direito.
Direito Positivo:
a)
Suporte físico:
enunciados prescritivos. Materiais, como artigos, incisos, parágrafos;
b)
Significado:
condutas humanas, relações intersubjetivas;
c)
Significação:
interpretação das normas jurídicas.
Ciência do Direito:
a)
Suporte físico:
descritivo. Materiais, como livro doutrinário;
b)
Significado:
enunciados que reportam o Direito Positivo;
c)
Significação:
Construção de seu interprete, o jurista.
Analise criticamente o art. 3º do Código
Tributário Nacional e
Para que façamos uma análise inicial,
vejamos o artigo 3° do CTN, “in verbis”:
“Tributo é toda prestação pecuniária compulsória,
em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato
ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa
plenamente vinculada”
Preconizamos o mesmo entendimento do
Professor Paulo de Barros Carvalho e do saudoso Geraldo Ataliba, quando afirmam
que, encontra-se implicitamente na Constituição Federal o conceito de tributo,
visto que se reconhece por um feixe de princípios e normas reguladores em sua
unicidade proveniente por um fato jurídico, posteriormente, vige de forma
autônoma sob este prospecto fático.
Deixando “nas mãos” da Ciência do
Direito, passa-se ao dado descritivo da norma, por sua lógica de estrutura
alética ou clássica podemos embutir valores modais, com necessário, possível ou
ambos, conforme o caso.
Neste ponto, tributo é uma obrigação, no
qual seus sujeitos (ativo e passivo) são atores principais, diante de uma norma prescritiva ao pagamento de
valores pecuniários remetidos e arrecadados aos cofres públicos, sejam tais
valores destinados ou não.
Ainda, não pode seu sujeito ativo
recolher tributo de forma ilícita, ou seja, em contrariedade com o ordenamento
jurídico vigente, portanto, fora dos patamares estabelecidos em lei.
A obrigatoriedade é fator pujante de uma
constatação da norma prescritiva, daí que, numa situação fática, o sujeito
passivo descumpre a norma no dever jurídico do pagamento, importará sanções
(normas secundárias) para o seu cumprimento.
A Atividade administrativa plenamente vinculada é uma
situação de presunção de legalidade dos atos administrativos, conforme o
princípio da legalidade em sentido estrito.
Feitas as considerações sobre o conceito de tributo,
passamos a aplicação destes conceitos as questões interessantes distintivas
acerca do tema:
a) Seguro obrigatório de veículo: trata-se de tributo por
ser prestação pecuniária compulsória instituída em lei, cobrada mediante
atividade administrativa plenamente vinculada e decorrente de ato não ilícito,
conforme o artigo 3° do CTN.
b) Multa decorrente do atraso de tributo: entendo não ser
um tributo por ser proveniente de ato ilícito.
c) FGTS: é um tributo, conforme delineia o art. 3° do
CTN.
d) Estadia e passagem de veículos em terminal
alfandegário: se houver previsão normativa tratando a respeito, podemos afirmar
ser um tributo, conforme o CTN, entretanto, inocorrendo neste sentido não
poderia se pensar como tributo sem precisão legal.
e) Locação de imóvel público: quando proveniente de
natureza contratual o direito tributário não pode adentrar a respeito, por ser
entre as partes. Portanto, não podemos dizer que trata se de um tributo por não
ser obrigatória.
f) Locação de espaço público (estacionamento rotativo
"zona azul"): é reconhecido
como tributo. Alias, o Supremo Tribunal Federal reconheceu-o desta forma
conforme o RE 492816 SP, sob relatoria de Joaquim Barborsa, transcreveremos
abaixo:
Trata-se
de recurso extraordinário (art. 102, III, b da Constituição) interposto de
acórdão prolatado pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo que
considerou inconstitucional a Lei 12.635/1998 do Município de São Paulo.
Referida lei isentava os auditores fiscais do Tesouro Nacional, os Agentes
Fiscais do Estado, os Inspetores Fiscais, os Agentes de Apoio e os Agentes
Vistores do Município de São Paulo do pagamento da exação destinada a fomentar
a rotatividade dos veículos estacionados em vias públicas (“Zona Azul”). Em
síntese, sustenta-se violação dos arts. 2º, 145, II da Constituição, na medida em que
a exação se caracteriza como tributo e, portanto, sujeita à iniciativa
compartilhada entre o chefe do Executivo e o Legislativo. É o relatório.
Decido. Sem razão os recorrentes. A iniciativa para legislar sobre matéria
tributária é compartilhada pelo chefe do Executivo e pelo Legislativo, porquanto
a restrição posta pelo art. 61, § 1º, II, b da Constituição é aplicável
apenas aos Territórios. Porém, no caso em exame, por se tratar de matéria
examinada em controle concentrado de constitucionalidade, a causa de pedir é
aberta (RE 298.694, rel. min. Sepúlveda Pertence, Pleno, DJ de 23.04.2004). Por
partirem da caracterização da Zona Azul” como tributo, era imprescindível aos
recorrentes demonstrar a observância ao princípio da isonomia e à gestão fiscal
responsável (arts. 150, II, 163, I, 165, § 9º, II da Constituição e art. 14 da LC 101/2000). A norma exonerativa local estabelece
benefício sem apontar nem justificar o critério utilizado para a distinção. Sem
a justificativa, é impossível reconhecer a necessidade e a adequação da medida
aos dispositivos constitucionais indicados. Esse exame é imprescindível, na
medida em que a jurisprudência dessa Suprema Corte constantemente reafirma a
incompatibilidade dos chamados privilégios odiosos”, concedidos tão-somente em
função da origem, classe social , profissão, raça ou credo do cidadão (cf., e.g., a ADI
1.655, rel. min. Maurício Corrêa, DJ de 02.04.2004; o RE 236.881, rel. min.
Maurício Corrêa, Segunda Turma, DJ de 26.04.2002, a RTJ 136/444-445, e a RDA
55/114). Ante o exposto, nego seguimento ao recurso extraordinário.
g) Custas judiciais: são tributos, de acordo com o art.3°
do CTN.
h) Prestação de serviço eleitoral: não se caracteriza
como tributo por não preencher o requisito do pagamento pecuniário, apesar de
ser uma prestação compulsória, exceto para conscritos e analfabetos, como prevê
a Constituição Federal.
i) Imposto sobre a renda de atividade ilícita: Trata-se
de tributo, conforme o artigo 3° do CTN juntamente com o Princípio do “non olet”. Neste ponto, a vista de
colaborar com nosso argumento, faz-se a leitura da ementa do RECURSO ESPECIAL Nº 1.208.583 - ES
(2010/0162642-0), sob relatoria da Ministra Laurita Vaz, do Superior Tribunal
de Justiça:
RECURSO
ESPECIAL. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. SONEGAÇAO FISCAL. VIOLAÇAO AO
PRINCÍPIO DA NAO AUTO-INCRIMINAÇAO. NAO OCORRÊNCIA. RECURSO ESPECIAL
DESPROVIDO.
1. O
princípio nemo tenetur se
detegere refere-se à garantia da não auto-incriminação,
segundo o qual ninguém pode ser forçado, por qualquer autoridade ou
particular, a fornecer involuntariamente qualquer tipo de informação ou
declaração que o incrimine, direta ou indiretamente. Trata-se de princípio
de caráter processual penal, já queintimamente ligado à produção de provas
incriminadoras. Já o princípio pecunia
non olet carrega consigo a idéia de igualdade de
tratamento entre as pessoas que tenham capacidade contributiva semelhante, independentemente
da maneira utilizada para alcançar essa disponibilidade econômica, isto é,
não importa se o rendimentos tributáveis tenham ou não fonte lícita. Cuida-se
de princípio de direito tributário. Tais princípios não se contrapõem,
seja pela questão topográfica em que se encontram no direito, seja porque
um não limita ou impossibilita a aplicação do outro, até mesmo porque o
princípio pecunia non olet despreza
a origem da fonte econômica tributável - se lícita ou ilícita.
2. A
necessidade de se recolher impostos surge com o fato de se auferir renda,
pouco importando se essa renda é lícita ou ilícita, não ensejando, por
isso mesmo, qualquer ingerência no princípio da não auto-incriminação, do
contrário dificilmente se vislumbraria a prática de crimes contra a ordem
tributária, que geralmente estão ligados ao cometimento de outros delitos,
como por exemplo, contra o sistemafinanceiro nacional.
3. Recurso
especial desprovido.
ACÓRDAO
Vistos,
relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da QUINTA TURMA
do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer do recurso, mas lhe
negar provimento. Os Srs. Ministros Jorge Mussi, Março Aurélio Bellizze,
Campos Marques (Desembargador convocado do TJ/PR) e Marilza Maynard
(Desembargadora convocada do TJ/SE) votaram com a Sra. Ministra Relatora.
Brasília
(DF), 04 de dezembro de 2012 (Data do Julgamento)
j)
Taxa de ocupação em terreno de marinha: entendo não ser tributo, pois trata-se
de receita de patrimônio decorrente de utilização de bem cuja a propriedade é
da União, portanto, é preço público. Para argumentar neste sentido vejamos a
ementa do julgado do TRF 4° Região, na AC 3465 SC 2007.72.08.003465-3, relator
Sérgio Renato Tejada Garcia:
ADMINISTRATIVO. TERRENO DE MARINHA. TAXA DE OCUPAÇÃO. MAJORAÇÃO.
PROCESSO ADMINISTRATIVO. NATUREZA NÃO-TRIBUTÁRIA.
1.
Embora não seja necessário intimar previamente os ocupantes dos terrenos de
marinha para a correção monetária da avaliação do imóvel havida por ocasião da
inscrição da ocupação, nos termos do Decreto-Lei nº 2.398/87, outra é a situação decorrente de
reavaliação do imóvel, para adequação ao valor de mercado.
2.
Ao promover a revisão do valor do domínio pleno do imóvel, que serve de base
para o cálculo da taxa de ocupação, a União deve cientificar prévia e
pessoalmente o ocupante ou adquirente acerca dos critérios de avaliação a serem
utilizados no procedimento administrativo.
3.
A taxa de ocupação exigida pela União constitui verdadeiro preço público,
objeto de relação de direito privado, cuja natureza é não tributária.
Precedente da 4ª turma.
Acórdão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as
acima indicadas, decide a Egrégia 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª
Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação da União e negar
provimento ao recurso dos autores, nos termos do relatório, votos e notas
taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Há que levar em consideração que, o tributo
cobrado de forma indevida é tributo ilegal, pois a Administração Pública deve
pautar-se aos estritos limites estabelecidos em lei, no qual faz-nos recordar o
princípio da legalidade, como também não pode o sujeito ativo ferir o principio
da vedação do confisco, como dispõe o art. 150, IV, da CF:
“Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao
contribuinte, é vedado a União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos
Municípios (...) IV – utilizar tributo com efeito de confisco” (grifo
nosso).
Entende-se que o Estado, de modo geral, está
proibido de instituir tributo que ultrapasse o patrimônio pessoal do
contribuinte, promovendo uma expropriação indireta. Sobre a temática, bem
afirma o mestre Hugo de Brito Machado que:
“A vedação do confisco é atinente ao tributo. Não à
penalidade pecuniária, vale dizer, à multa. O regime jurídico do tributo não se
aplica à multa, porque o tributo e multa são essencialmente distintos. O licito
é pressuposto essencial desta, e não daquele”.