Delinearemos a
regra-matriz de incidência tributária (na linha do mestre Paulo de Barros
Carvalho) do Imposto Territorial Rural e seus critérios, primeiramente
deveremos fazer breves considerações acerca deste imposto. A função deste
imposto é a extrafiscalidade, pois serve como um instrumento auxiliador, de
forma a combater aos latifúndios improdutivos, como bem afirma Hugo de Brito
Machado. Ademais, é de competência da União o ITR, conforme o art. 153, VI, da
Constituição Federal. A Lei n° 9.393/12/1966 é a que disciplina o ITR e, com
base nesta lei, passaremos a definir a regra-matriz deste imposto, analisando o
critério antecedente.
Aspecto
material: Para que tenhamos uma maior compreensão em relação ao aspecto
material, podemos afirmar que em qualquer espécie tributária haverá um fato,
desde que seja licito genérico e que descreva sua hipótese de incidência
sediada em seu tempo e espaço. Fazendo uma leitura na norma que disciplina o
ITR, podemos dizer que o aspecto material está atrelado à propriedade para que
haja a incidência tributária. Para tanto, entende-se como aspecto material o
“ser proprietário, domínio útil ou a posse de imóvel rural”
Aspecto
espacial: tem por critério a localização do imóvel rural, ou seja, que não seja
em zona urbana do município.
Aspecto
temporal: a partir do momento em que se adquire a propriedade imóvel localizada
fora da zona urbana, independente de titulo translativo imobiliário.
Agora, passemos a analisar o
critério consequente, como o aspecto o subjetivo e o quantitativo.
Aspecto
pessoal: Ao sujeito passivo (devedor) enquadra-se como contribuinte o
proprietário do imóvel rural, por domínio útil ou a posse do imovel. Quanto ao
sujeito ativo (credor), conforme o art. 153, VI, da Lei Maior/88, a União tem
competência para instituir o ITR, bem como também estabelece o Código
Tributário Nacional, em seu art. 29. Cabe ressaltar que, a Emenda
Constitucional n° 42/03 permitiu delegar a capacidade tributária ativa do ITR
para os Municípios, portanto, deve-se distinguir da transferência da
competência tributária, pois na delegação, haverá apenas a permissão para a
cobrança e fiscalização.
Aspecto
quantitativo: Na base de cálculo, deverá observar o art. 30 do CTN, juntamente
com o art. 8° da Lei n° 9.393/96, ao passo que direciona ao valor da terra nua.
Por terra nua, define a Lei n° 4382/2002, em seu art. 32 que é o valor de
mercado do imóvel, sendo excluídos, assim a elenca taxativamente, as
construções, instalações e benfeitorias; culturas permanentes e temporárias;
pastagens cultivadas e melhorias; florestas plantadas. O art. 33 da referida
Lei, logo trata que: “O Valor da Terra
Nua Tributável - VTNT é obtido mediante a multiplicação do VTN pelo
quociente entre a área tributável, definida no art. 10, e a área total do
imóvel”.
Em relação às
alíquotas, serão estas proporcionais e progressivas, de acordo com o grau da
utilização da área rural. A Lei n° 4382/2002, em seu art. 34 traz uma tabela
que deverá ser observada, que assim transcrevo:
ÁREA TOTAL
DO IMÓVEL
(em hectares)
|
GRAU DE UTILIZAÇÃO (em %)
|
||||
Maior que 80
|
Maior que 65
até 80
|
Maior que 50
até 65
|
Maior que 30
até 50
|
Até 30
|
|
Até 50
|
0,03
|
0,20
|
0,40
|
0,70
|
1,00
|
Maior que 50 até 200
|
0,07
|
0,40
|
0,80
|
1,40
|
2,00
|
Maior que 200 até 500
|
0,10
|
0,60
|
1,30
|
2,30
|
3,30
|
Maior que 500 até 1.000
|
0,15
|
0,85
|
1,90
|
3,30
|
4,70
|
Maior que 1.000 até 5.000
|
0,30
|
1,60
|
3,40
|
6,00
|
8,60
|
Acima de 5.000
|
0,45
|
3,00
|
6,40
|
12,00
|
20,00
|
Essa variável
na alíquota entre 0,03 até 20% em função da área do imóvel e da extensão
territorial é sucinta de críticas doutrinarias. Hugo de Brito Machado, no qual
nos declinaremos seu posicionamento, é que a carga elevada deste imposto tem um
incontestável efeito de confisco, sendo sujeito ao vicio de
inconstitucionalidade (art. 150, IV, da CF), pois é vedada a União, aos Estados
e aos Municípios utilizar tais tributos para este efeito tão devastador para o
contribuinte.
Passando mais
adiante, é importante destacar que a principal diferença entre o ITR e IPTU,
está para que este último o critério material é bem imóvel por natureza ou por
acessão física, diferentemente no ITR, que não há fato gerador ao imóvel rural
por acessão física, mas sim, ao imóvel por natureza, como o solo, sua
superfície, os acessórios e adjacências naturas, árvores e frutos pendentes, o
espaço aéreo e o subsolo, conforme dispõe o Código Civil, art. 79.
Conceitos da propriedade urbana e propriedade rural: distinções
Antes de
iniciarmos sobre o conceito de propriedade urbana e a rural, primeiramente,
deveremos extrair da seara do direito civil, o que é a propriedade, partindo-se
da premissa de que o direito é uno e indivisível, por bem lecionado por Noberto
Bobbio (Teoria Geral da Norma Jurídica). Na verdade, o Código Civil de 2002 não
define exatamente o que é propriedade, mas sim as prerrogativas de
proprietário, que tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito
de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha (art.
1.228, CC).
Pois bem,
tanto na propriedade urbana como na propriedade rural, proprietário pode usar,
gozar e dispor de seu bem imóvel, mas ambos são distintos, eis que ao IPTU, o
bem imóvel pode ser por natureza ou por acessão física, já ao ITR, inexiste
fato gerador quanto ao imóvel por acessão física, somente em relação a sua
natureza, como o solo e sua superfície, os acessórios, adjacências naturais,
arvores e frutos pendentes, o espaço aéreo e o subsolo (art. 79, do CC).
Podemos trazer
uma indagação a respeito: Como não incidir no IPTU mesmo que o imóvel esteja em
área urbana? Foi o que ocorreu, fugindo-se da regra sobre o aspecto espacial do
bem imóvel, ou seja, aplicando-se o critério da destinação do imóvel pelo proprietário, conforme o art. 15 do
Decreto-Lei 57/1966. O confronto quanto
a hipótese de incidência sobre ao aspecto espacial, em relação de qual imposto
incidirá (IPTU x ITR), afinal, é a destinação ou localização do imóvel? O art. 32 do CTN, logo diz que a localidade
do imóvel é fator preponderante quanto a incidência do imposto, vejamos:
“O imposto, de
competência dos Municípios, sobre a propriedade predial e territorial urbana
tem como fato gerador a propriedade, o domínio útil ou a posse de bem imóvel
por natureza ou por acessão física, como definido na lei civil, localizado
na zona urbana do Município (grifo
nosso)”
Para tanto,
não há dúvidas que o próprio Código Tributário Nacional cumpriu o seu papel
pujante de tratar o aspecto espacial da hipótese de incidência do IPTU.
Quanto à
destinação do imóvel para critério de incidência tributária, a aplicação do
art. 15 do DL/1966 é válida? O Decreto-lei em tela não fora recepcionado pela
Constituição Federal, porém por força da Resolução do Senado Federal nº 09, de
07 de junho de 2005, suspendeu a execução do art. 12 da Lei Federal nº 5.868/72,
no ponto em que revogou o art. 15 do Decreto-lei nº 57/66. O ato do Senado está
lastreado na decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal, nos autos do
Recurso Extraordinário nº 140.773-5/210 – SP. Por derradeiro, pode-se afirmar
ser válida aplicação do art. 15 do DL/1996, portanto, incidindo o ITR quando o
imóvel for utilizado em exploração extrativa vegetal, agrícola, pecuária ou
agro-industrial ou quando preencher apenas um ou nenhum dos requisitos do art.
32 do CTN. Cumpre ressaltar ainda que, a regra da destinação do imóvel apenas
se aplica para o ITR e não para o IPTU, já que a norma optou por eleger a
regra-matriz antecedente a localidade do imóvel, o que se pode dizer, para não
haver dúvidas, estando em zona urbana incide o IPTU, desde que atendidas no
mínimo tais circunstâncias:
a. meio-fio ou
calçamento, com canalização de águas pluviais;
b. abastecimento de
água;
c. sistema de
esgotos sanitários;
d. rede de
iluminação pública, com ou sem posteamento para distribuição domiciliar;
e. escola primária
ou posto de saúde a uma distância máxima de 3 (três) quilômetros do
imóvel.
O problema
principal está na competência quanto qual ente tributante pode definir o que é
zona urbana e o que é zona rural. Acreditamos que, cada um é competente, só que
na falta de definição legal da União, no ITR, pode o Município definir sua zona
urbana que, por critérios lógicos, o que não é zona urbana será zona rural,
ademais, tal competência é supletiva e que o art. 182, da CF, pois logo, a Lei
Maior retrata que “A propriedade atenderá a sua função social” (art. 5º, XXIII
da CF).
Ora, se o ITR
tem sua finalidade extrafiscal (entendimento doutrinário de Hugo de Brito
Machado), bem como ao IPTU, visa então somente cumprir sua função social, de
modo, a estimular o seu proveito, quanto ao seu imóvel, seja urbano ou rural.
Ademais,
parece-me que se a União definir zona rural e zona urbana, não lhes exorbitará
de sua competência, porém, se um município legislar sobre ambas haverá um sério
vicio de constitucionalidade, já que estenderá os seus próprios interesses,
beneficiando a si próprio ente tributante do IPTU, portanto, deverá o município
definir os seus próprios critérios. Por derradeiro, para infirmar ainda mais
nosso entendimento, basta a leitura da Lei Ordinária n° 9.393/96, em seu art.
1°, que em seu corpo nos leva a entender que cabe ao município definir o que é
zona urbana e o que for fora dela, será zona rural, daí ser incindível o ITR.
Observância ao Princípio da Progressividade
Ao princípio
da progressividade, em homenagem ao mestre constitucionalista José Afonso da
Silva (pp. 719): “é aquele cuja alíquota
aumenta à medida que aumenta o ingresso ou a base imponível”. Alfredo
Augusto Becker leciona (pp.309) que: “a
medida da proporção e o ritmo da progressividade do tributo são problemas
pré-jurídicos de Política Fiscal cuja solução fica entregue exclusivamente ao
arbítrio do legislador”, deixando claro objetivo da progressividade, tanto
dos impostos como também das taxas, que neste átimo observa-se também a capacidade
contributiva em sua proporcionalidade para que não surtam efeitos contrários à
Constituição Federal. A progressividade dos impostos está atrelada ao critério
quantitativo das alíquotas.
O princípio
ora exposto acima, é aplicável ao ITR servindo como referencial de acordo com a
área do imóvel e do grau de sua utilização. Para a Lei n. 9.393/1996, uma área
de até 50 hectares ,
sendo utilizada em mais de oitenta percentuais, a alíquota será 0,03 %. O
grande problema neste referencial é a progressão destes percentuais chegarem a
um patamar incidente de 20% sobre determinado imóvel rural durante cinco anos
consecutivos, culminará, por conseguinte, na absorção plena e total do valor
desta propriedade, criando um vicio contrário ao que constitucionalizado, ou
seja, contrário a outro principio, o não-confisco, em que afrontado tal
princípio, o lesado deverá instaurar uma pretensão resistida para reparar tal
dano.
Em relação à
progressividade do IPTU, tem por referencial a majoração conforme for a
alíquota incidente na medida em que o contribuinte demonstrar sua a pujança de
sua capacidade contributiva, previsão expressão no art. 145,§ 1º
da CRFB/88. A função social da propriedade também é aplicável neste imposto
devido sua natureza ser extrafiscal.
Além disso, o
art. 33 do CTN, que a base de cálculo será de acordo ao valor venal do imóvel
e, em seu parágrafo único, logo diz que na determinação da base de cálculo, não
se considera o valor dos bens móveis mantidos, em caráter permanente ou
temporário, no imóvel, para efeito de sua utilização, exploração,
aformoseamento ou comodidade.
Quanto a
constitucionalidade da nova redação do §1º do artigo 156 da Constituição de
1988, conferida pela EC nº 29/2000, a Suprema Corte Constitucional já tratou da
temática no Recurso Extraordinário nº 153.771-0-MG, vejamos:
"EMENTA: - IPTU. Progressividade. – No
sistema tributário nacional, o IPTU inequivocamente é um imposto real.
– Sob o império da atual Constituição, não é
admitida a progressividade fiscal do IPTU, quer com base exclusivamente no seu
artigo 145, § 1º, porque esse imposto tem caráter real, que é incompatível com
a progressividade decorrente da capacidade econômica do contribuinte, quer com
arrimo na conjugação desse dispositivo constitucional (genérico) com arrimo no
art. 156, § 1º (específico).
– A interpretação sistemática da
Constituição conduz inequivocamente à conclusão de que o IPTU com finalidade
extrafiscal a que alude o inciso II do § 4º do artigo 182 é a explicitação
especificada, inclusive com limitação temporal, do IPTU com finalidade
extrafiscal aludido no artigo 156, I, § 1º.
– Portanto, é inconstitucional qualquer
progressividade, em se tratando de IPTU, que não atenda exclusivamente ao
disposto no artigo 156, § 1º, aplicado com as limitações expressamente
constantes dos §§ 2º e 4º do artigo 182, ambos da Constituição Federal.
Recurso extraordinário conhecido e provido,
declarando-se inconstitucional o subitem 2.2.3. do setor II da Tabela III da
Lei nº 5.641, de 22.12.1989, no Município de Belo Horizonte."
Conforme a
ementa acima transcrita, o STF julgou constitucional a modificação normativa,
sendo classificada como norma de eficácia limitada, sob nosso ângulo, pois a
norma diz menos do que deveria, deixando margem para implementação legislativa.
A alteração
redacional §1º do artigo 156 da Constituição, fez com que houvesse a natureza
do IPTU, passando a ser de natureza fiscal, sendo progressivo ao valor do
imóvel e não quanto à obrigatoriedade do cumprimento de sua funcionalidade
social.
Tratar a progressividade
no tempo do IPTU é uma reprimenda sancionatória imposta ao Município, como meio
de reforçar e implantar a sua política, conforme o plano diretor, além, tem
cunho protecionista na medida em que modela a função social da propriedade.
Afirmamos ter caráter sancionatória a progressividade no tempo do IPTU e,
podemos ir além que está sanção não seguirá em contrariedade ao art.3° do CTN,
eis que não provem de ato ilícito, aloja-se na lei e está observada conforme
atividade administrativa plenamente vinculada, como plano diretor municipal.