A Carta Política de 1988 se
encontra promovendo o instituto instrumental como direito fundamental, em seu
artigo 5°, LXIX, in verbis:
“Conceder-se-á mandado de segurança para
proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas
data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade
pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder
Público”
Para a melhor doutrina[1], o
Mandado de Segurança é uma espécie de remédio
constitucional, pois está atrelado por meios postos à disponibilidade de
indivíduos e cidadãos com o intuito de provocar a intervenção das autoridades
competentes, visando sanar, corrigir, ato ilegal e abusivo de poder que lhe
seja prejudicial dos direitos e interesses individuais e coletivos, daí podemos
afirmar que está ação é típica constitucional.
Ainda, nota-se que, pelo texto
constitucional acima, é possível ter uma resposta clara do objetivo deste
instituto, mas, para termos exatamente uma noção quanto a sua existência particionaremos
cada detalhe de forma didática:
1)
direito
líquido e certo: trata-se de demonstração de plano por prova
pré-constituída e de direito manifesto em seu aspecto existencial (fato), de
modo delimitado em sua extensão e aptidão no momento de sua impetração.
Importante registrar que, tal requisito material deve aparecer de modo muito
claro, muito palmar, ao entendimento do magistrado, considerado por duas
facetas, como condição da ação e devido ao requisito de admissibilidade,
conforme leciona Lúcia Valle Figueiredo (2004/20:21).
2)
ilegalidade ou abuso de poder: são aqueles promovidos por autoridade pública
ou agente de pessoa jurídica no
exercício de atribuições do Poder Público, tanto atos vinculados como
discricionários, eis que, do primeiro, estamos nos referindo a ilegalidade, já
o segundo o abuso de poder, pois a autoridade ou agente de pessoa jurídica
extrapolou os requisitos da conveniência e oportunidade, visto que, por vezes
pode o ato ser inconveniente ou inoportuno.
Para que tenhamos uma ação e seus
elementos, as partes devem ser identificáveis. Assim, o legitimado ativo,
sujeito ativo ou impetrante é aquele detentor de ‘direito líquido e certo’ não
aparado por outras ações constitucionais, como habeas corpus ou habeas data,
são elas: pessoas físicas, brasileiras, residentes, domiciliadas, ou nenhuma
destas; pessoas jurídicas; órgãos públicos despersonalizados desde que tenham
capacidade processual, como Chefias dos Executivos, Mesas do Legislativo
Nacional; universalidade de bens e direito, como espólio, massa falida,
condomínio; agentes políticos, como governadores e parlamentares; Ministério
Público, entre outros. Note-se, que apresentei os legitimados ativos de modo
genérico, mas podendo serem aplicados também na seara tributária, pois não há
nenhum impedimento legal para tanto, bastando demonstrar o pedido e a causa de
pedir, além das condições da ação.
Em relação à parte passiva,
legitimados passivos ou impetrado, é a autoridade coatora, considerado
responsável por meio de prova pré-constituída a ilegalidade (ato vinculado) ou
abuso de poder (ato discricionário), autoridade pública ou agente de pessoa
jurídica no exercício de atribuições do Poder Público. A Lei n. 12.016 de 2009
(Lei do Mandado de Segurança) em seu artigo 6°, § 3°, dispõe que, considera-se
autoridade coatora aquela que tenha praticado o ato impugnado ou da qual emane
a ordem para a sua prática, ainda, na referida lei, no artigo 1°, § 1°,
equiparam-se às autoridades, os representantes ou órgãos de partidos políticos
e administradores de entidades autárquicas, bem como dirigentes de pessoas
jurídicas ou pessoas naturais no exercício de atribuições do poder público,
quando lhe disser a respeito a tais atribuições, especificamente.
Para não deixarmos na obscuridade
em relação ao sujeito passivo em matéria tributária, a autoridade coatora, nos
tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil, comumente,
será o Delegado da Receita Federal do Brasil ou, em se tratando de comércio
exterior e às atividades de administração de mercadorias estrangeiras
apreendidas, será apontado como autoridade coatora o Inspetor da Alfândega ou
Inspetor da Receita Federal do Brasil. Havendo débito já inscrito em dívida
ativa pela Procuradoria da Fazenda Nacional, a autoridade será o Procurador
Regional. Se houver estrutura complexa dos órgãos administrativos, cumpre
ressaltar que, o Superior Tribunal de Justiça pacificou entendimento de que, se
a autoridade tida com coatora não se limitar a arguir sua ilegitimidade
passiva, aplica-se a teoria da encampação, ou seja, a autoridade torna-se
legitima para ad causam, não podendo
apontar a violação do artigo 267, VI, do Código de Processo Civil[2]
O juízo competente para o
processamento da ação de mandado de segurança, afirma-se, dependerão da
categoria da autoridade coatora e sua sede funcional, sendo promovida pela Lei
n. 12.106/09, em seu artigo 2°, in verbis:
“Considerar-se-á federal a autoridade coatora
se as conseqüências de ordem patrimonial do ato contra o qual se requer o
mandado houverem de ser suportadas pela União ou entidades por ela controlada”
Trata-se, portanto, de um
critério objetivo devido um elemento da lide, a qualidade da pessoa que
suportará as conseqüências de ordem patrimonial, como a União. Ainda que não
haja previsão legal, aplicam-se as regras gerais de competência, quais sejam: Quando
de competência originária dos tribunais atenta-se os delineios constitucionais;
Se por Justiças especiais, deverá seguir conforme a sua legislação própria.
Em relação da teoria da encampação, o Superior
Tribunal de Justiça[3] traçou os requisitos mínimos
que somente incide se:
(a) houver vínculo hierárquico
entre a autoridade erroneamente apontada e aquela que efetivamente praticou o
ato ilegal;
(b) a extensão da legitimidade
não modificar regra constitucional de competência; (c) for razoável a dúvida
quanto à legitimação passiva na impetração;
(d) houver a autoridade impetrada
defendido a legalidade do ato impugnado, ingressando no mérito da ação de segurança.
São nestes requisitos podemos
concluir que, a aplicação desta teoria
haja hierarquia imediata entre a autoridade indicada pelo impetrante e aquela
que deveria ter figurado no feito, entretanto, pode ser considerada como modalidade
de legitimação superveniente em que a autoridade, que antes ilegítima, torna-se
legitima por tais requisitos jurisprudenciais acima expostos, ainda que não
lhes caiba de modo absoluto.
Ato coator está atrelado do agir
da autoridade ou agente público, no exercício de suas atribuições, em
contrariedade a lei ou a comando constitucional. Para efeitos práticos temos, o
contribuinte impetra o mandamus com a
finalidade de assegurar o direito de compensação dos créditos tributários[4]. Em sede de comentários à respeito, acordando
com o nosso pensar, Hugo de Brito Machado Segundo (2008:343), afirma:
“Não raro, porém, as autoridades fazendárias
impõem óbices absolutamente ilegais à compensação. Em algumas vezes, não
reconhecem a existência de crédito; noutras, reconhecem o crédito, mas entendem
inviável o encontro de contas diante de disposições restritivas de normas
infralegais. Coloca-se, então, a questão de saber se o mandado de segurança
pode ser utilizado para afastar tais óbices. É evidente que sim, desde que a
demonstração de ilegalidade dos tais óbices não dependa da solução de
controvérsia quanto à ocorrência de fatos”
Por certo, na seara tributária
podem ocorrem diversas ocasiões para a impetração deste instrumento remediário
constitucional, eis que o descumprimento da lei ou mesmo da constituição são
repetitivos, fazendo com que o contribuinte fique materialmente vulnerável, é
por isto a existência deste, como tutela da propriedade confiscatória, por
exemplo, nos deixa perplexos diante de uma reta que faz “curva para dentro”,
daí que o Poder Judiciário deve fazer um “fix”,
conserto e, até mesmo este pode ser sujeito do mandamus, tudo conforme o caso concreto.
Além disso, é importante observar
a classificação empregada pelo Direito Administrativo, quanto aos atos, visto
que o Direito é um todo e indivisível, conforme Bobbio. Assim temos:
1) Ato colegiado: emanado do
órgão colegiado por várias vontades individuais não autônomas que se integram
para a formação da vontade do órgão. P. ex. atos de comissões, conselhos, etc.
O MS será impetrado contra o órgão representado por seu presidente;
2) Ato complexo: é interferente
das vontades de vários órgãos na formação do ato que vem a ser lesivo. Será
impetrado o writ contra a última
autoridade que agiu;
3) Ato composto: proveniente de
uma autoridade que elabora e concretiza sob o referendo da autoridade superior,
como uma simples conferência. Nesta circunstância, é a autoridade superior que
deverá assumir a responsabilidade de
seus atos.
Recapitulando o que foi dito
acima, direito líquido e certo é a demonstração
de plano por prova pré-constituída e de direito manifesto em seu aspecto
existencial (fato), de modo delimitado em sua extensão e aptidão no momento de
sua impetração.
O “direito liquido e certo” no Mandado de
Segurança constitui como uma das condições da ação, estando adentro do
interesse de agir, de modo a preservar a uma materialidade incontestável, ou
seja, de demonstração de prova pré-constituída e de direito manifesto delimitando
a extensão e aptidão da legitimidade ad
causam.
É necesária verificação da presença do direito
líquido e certo. De acordo com o magistério de Pontes de Miranda[5]:
“Líquidos são os direitos quando a sua existência é atestada sem
incertezas ou sem dúvidas, quando o paciente mostra que a sua posição legal é
evidente sem precisar para mostrar, de diligências, de delongas probatórias. Direito
certo e líquido é aquele que não precisa ser aclarado com exame de provas em
dilações, que é, de si mesmo, concludente e inconcusso”.
Entendo que, o direito liquido e certo é também
elemento de convicção do mérito também, pois a prova incontestável da
materialidade do ocorrido segue em continuidade procesualística, portanto,
comporta não somente o mérito em si, como também o elemento condicional
existente nesta ação. In fine, extinguirá
ação tanto nas especificações previstas nos artigos 267 como também no 269, do
Código de Processo Civil, desde que fundamentado o magistrado quanto a
aplicação destes ao caso concreto devendo ter a ciência da existência da junção
material e processual prout casus.
Ultrapassado
o prazo do Mandado de Segurança preventivo, incabível está promover novamente a
mesma ação, da mesma forma, não pode também promover a ação de caráter
repressivo. Entretanto, se não promovida pelo impetrante o MS preventivo,
caberá o repressivo, por que este se utiliza após o prazo previsto em lei. Se
já constituída a inscrição de dívida ativa, há dois caminhos que o
contribuinte, via ação antiexacional, promover a ação anulatória de debito
fiscal ou embargos à execução, tudo irá depender do caso concreto e do ato do
fisco.
A impetração
do mandamus para evitar, de forma exclusiva, a inscrição
do débito tributário na dívida ativa, desde que o ato atacado seja originado
por agente ou autoridade coatora agindo por ilegalidade, como por exemplo,
ofensa a legislação complementar, ou, por abuso de poder, inscrever o debito em
dívida ativa sem o respaldo nenhum.
[1] V. José Afonso da Silva, in Curso de Direito Constitucional Positivo, pp. 433.
[2] V. STJ, Primeira Turma, Rel. Ministro Luiz
Fux, REsp 625.363, 2004; STJ, Segunda Turma, Rel, Ministro João Otávio de
Noronha, AgRgAr 538.820,2004.
[3] V. Primeira Seção, ao apreciar o MS n.º 10.484/DF
[4] É vital não nos olvidar da
Súmula 213, do STJ: “O mandado de segurança constitui ação adequada para a
declaração de direito à compensação”.
[5] PONTES DE MIRANDA,
Francisco Cavalcanti. Comentários à Constituição de 1967, RT 5/338.
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