06/10/2021

DIREITO DE REMOÇÃO DO SERVIDOR POR MOTIVO DE SAÚDE


Para assistir ao vídeo sobre o tema clique aqui ou na imagem acima

Para iniciarmos sobre a temática, podemos citar um breve exemplo: um servidor público federal em estágio probatório atua em determinada repartição, porém, por motivos de saúde deseja deslocar-se para outra localidade para fazer um tratamento de saúde específico.


         Diante de uma situação como esta, apresentaremos algumas indagações iniciais:

1. O servidor público tem o direito à remoção por motivo de saúde?

2. O fato de o servidor público estar em estágio probatório dará este direito à remoção?

3. Sendo possível a remoção, depende de cargo vago para que seja realizada?

 

A remoção do servidor público federal é um direito que possui previsão legal no art. 36 da Lei n. 8.112/1990:

Art. 36. Remoção é o deslocamento do servidor, a pedido ou de ofício, no âmbito do mesmo quadro, com ou sem mudança da sede.

 

O parágrafo único do referido artigo, prevê sobre as modalidades de remoção, como:

I - de ofício, no interesse da Administração;

II - a pedido, a critério da Administração;

III - a pedido, para outra localidade, independentemente do interesse da Administração:

a) para acompanhar cônjuge ou companheiro, também servidor público civil ou militar, de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, que foi deslocado no interesse da Administração;

b) por motivo de saúde do servidor, cônjuge, companheiro ou dependente que viva às suas expensas e conste do seu assentamento funcional, condicionada à comprovação por junta médica oficial;

c) em virtude de processo seletivo promovido, na hipótese em que o número de interessados for superior ao número de vagas, de acordo com normas preestabelecidas pelo órgão ou entidade em que aqueles estejam lotados.

 

Nos termos da legislação acima, a remoção do servidor por motivo de saúde é um direito subjetivo, no qual pode ser concedido o pedido independente do interesse da Administração.

Desta forma, a remoção de ofício ou a pedido (a critério da Administração), o deslocamento poderá se efetivar com ou sem a mudança da sede, como por exemplo, mudar apenas mudar de região.

Salienta-se que, o pedido a interesse da Administração será sempre com mudança de sede.

Em relação ao procedimento, o pedido de remoção somente será deferido (aceito) pelo órgão em que atua, se o servidor ou se cônjuge, companheiro ou dependente, seja submetido à junta médica oficial do órgão, que avaliará sobre a saúde, assim como sobre a real necessidade de remoção do servidor em decorrência deste motivo (aplicação da teoria dos motivos determinantes).

Ocorre que, na prática existem situações de urgência, como por exemplo, de cônjuge ou dependente já enfermo, que resida em outra localidade, sendo impossível que seja realizada a avaliação do órgão público.

Nestes casos, o servidor público interessado poderá juntar um laudo médico e os exames para demonstrar a real dimensão sobre o estado de saúde do paciente enfermo. Na prática, a junta médica do órgão verificará todos os documentos apresentados, expedindo parecer favorável ou não, em relação à solicitação de remoção do servidor público.

Por outro lado, pode ocorrer que o laudo médico realizado pelo órgão entenda que o problema de saúde do servidor ou de seu familiar não seja motivo para a remoção do servidor.

Nesta hipótese, o caberá o servidor público provar por meio de laudos médicos particulares e, posteriormente, promover uma ação judicial com o escopo de aplicar a lei.

Há quem entenda que o ato de avaliação do órgão público seja um ato discricionário (por conveniência e oportunidade) para remoção do servidor público, porém, a legislação evidencia o oposto, ou seja, é ato vinculado, pois é o único comportamento possível a ser tomado pela Administração Pública diante de casos concretos, sem nenhuma liberdade para juízo de conveniência e oportunidade. 

Em julgado recente, posicionou-se o Tribunal Regional Federal da 3° Região, que é um direito subjetivo do servidor, desde que preenchidos os requisitos em lei, dando azo ao Direito Constitucional a proteção familiar. Vejamos, ipsis litteris:

 

E M E N T A APELAÇÃO. MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. LICENÇA PARA ACOMPANHAMENTO DO CÔNJUGE. ARTIGO 84 DA LEI 8.112/90. RECURSO DESPROVIDO. 1 - A lide tem causa de pedir em ato administrativo que indeferiu pedido de licença para acompanhamento de cônjuge, na forma do art. 84, § 1º, da Lei n.º 8.112/90. 2 - No tocante à concessão desta modalidade de licença, a jurisprudência tem se posicionado no sentido de tratar-se de “direito subjetivo do servidor”, dependente apenas do preenchimento do requisito de deslocamento de seu cônjuge. 3 - Assim, apesar de a norma do artigo 84 da Lei nº 8.112/90 valer-se da expressão "Poderá ser concedida licença ao servidor", dando a impressão de se tratar de faculdade da Administração, presentes os requisitos legais, a hipótese é de cogência, pois se trata, de fato, de direito subjetivo do servidor interessado, com escopo de proteção à família, nos termos do art. 226 da CF. 4 - O fato de que o cônjuge da requerente teve seu deslocamento em virtude de aceitar vínculo empregatício no exterior não descaracteriza o direito à licença, posto que a lei não faz qualquer ressalva desta natureza. Precedentes. V - Apelação a que se nega provimento.

(TRF-3 – Apel Rem Nec: 50028282820194036100 SP, Relator: Desembargador Federal VALDECI DOS SANTOS, Data de Julgamento: 09/03/2021, 1ª Turma, Data de Publicação: Intimação via sistema DATA: 11/03/2021)

No que diz respeito ao servidor público em  estágio probatório, é importante compreender que se trata de um período de tempo no qual o servidor público é avaliado pelos seus superiores, que se inicia após a posse do cargo.

Sobre o questionamento acima (item 2), podemos responder que, pelo simples fato de estar em estágio probatório, terá os mesmos direitos que os demais servidores públicos federais, portanto, poderá solicitar a remoção, seja por problema de saúde ou de seus familiares, além de outras hipóteses previstas em lei, conforme o Tribunal já se manifestou[1], inclusive o Superior Tribunal de Justiça, servindo como precedente:

AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 666.641 - PI (2015/0015259-3) RELATOR: MINISTRO NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO AGRAVANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL AGRAVADO: VALERIA MARIA LAVES LOPES ADVOGADO: LUÍS SOARES DE AMORIM E OUTRO (S) - PI002433 DECISÃO ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL. REMOÇÃO A PEDIDO PARA ACOMPANHAMENTO DOS GENITORES DA SERVIDORA. DECISÃO DO TRIBUNAL DE ORIGEM COM FUNDAMENTO DE ÍNDOLE CONSTITUCIONAL E INFRACONSTITUCIONAL. NÃO INTERPOSIÇÃO DE RECURSO EXTRAORDINÁRIO. APLICAÇÃO DA SÚMULA 126/STJ. MEDIDA QUE VISA À PROTEÇÃO DA FAMÍLIA, OU SEJA, RESGUARDA O PRINCÍPIO DA SOLIDARIEDADE FAMILIAR. IMPOSSIBILIDADE DE REVOLVIMENTO DE PROVAS. AGRAVO DO INSS A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. Trata-se de Agravo contra decisão que inadmitiu o Recurso Especial interposto pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, fundado na alínea a e c do art. 105, III da Constituição da República, em face de acórdão do TRF da 1a Região, assim ementado: ADMINISTRATIVO. CONSTITUCIONAL. SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL. ESTÁGIO PROBATÓRIO. PEDIDO DE REMOÇÃO POR MOTIVO DE SAÚDE PARA LOCALIDADE ONDE SE ENCONTRA A FAMÍLIA. LEI. 8.112/1990. PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DE PROTEÇÃO DA FAMÍLIA (ART. 226 DA CF/1988)-. CUSTAS E HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. 1. O fato de a servidora estar em estágio probatório não pode constituir óbice, por si só, para o ato de remoção, pois se trata de exigência não prevista em lei, mas em ato normativo infralegal (edital), ao qual é defeso inovar na ordem jurídica. 2. Nas situações, de impossibilidade de conciliação entre o interesse da Administração e a do servidor, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal aponta no sentido da prevalência do princípio constitucional de proteção da família (art. 226 da CF/1988). 3. Comprovada a necessidade de tutela do filho de forma mais assídua e efetiva, com o intuito de possibilitar o enfrentamento de crise familiar, no tocante à superação de problemas de saúde enfrentados pelos ascendentes (idosos), é de se permitir o retorno ao convívio próximo aos entes familiares. 4. Apelação a que se dá provimento. 5. Deverá o INSS reembolsar custas e pagar honorários advocatícios no valor de R$ 500,00 (quinhentos reais) (fls. 233). 2. Embargos de Declaração rejeitados (fls. 243-248). 3. Nas razões do Apelo Especial, o recorrente sustenta, além da divergência jurisprudencial, violação do art. 36 inciso III, alínea b da Lei 8.112/90, aos seguintes argumentos: (i) o acórdão não indica os elementos comprobatórios que justifiquem a remoção da recorrida e (ii) não consta dos autos manifestação daquela Corte acerca da necessidade de comprovação por junta médica oficial. 4. Não houve contrarrazões, sobreveio juízo de admissibilidade negativo (fls. 262/263). 5. A irresignação não merece prosperar. 6. Inicialmente, cumpre-me o dever de sanar um erro material identificado. Em cotejo entre a petição inicial, a sentença e o acórdão recorrido, percebe-se que o eminente Desembargador Federal, equivocou-se quanto à motivação do pedido da servidora. Portanto, fica registrado que a motivação do pedido de remoção é o estado de saúde dos genitores da servidora, e não de seu filho (a). 7. Saneado o aludido erro material, passemos ao mérito. 8. Na essência, o entendimento esposado no acórdão recorrido encontra-se fundamentado no seguinte trecho: Noutro giro, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tem sinalizado para que se dê, na interpretação do art. 36, parágrafo único, da Lei 8.112/1990, preponderância ao princípio constitucional de proteção da família (art. 226 da CF/1988) nas situações de impossibilidade de conciliação entre o interesse da Administração e o particular, para permitir a manutenção da unidade familiar (fls. 230). 9. Com efeito, como bem delineado pela decisão agravada, o Tribunal a quo adotou fundamento constitucional suficiente à manutenção do aresto. A parte, ora recorrente, não interpôs Recurso Extraordinário a fim de impugnar tal motivação, assim, pertinente à incidência da Súmula 126 do STJ, que dispõe: É inadmissível Recurso Especial, quando o acórdão recorrido assenta em fundamentos constitucional e infraconstitucional, qualquer deles suficiente, por si só, para mantê-lo, e a parte vencida não manifesta Recurso Extraordinário. 10. Ademais, o acolhimento das alegações deduzidas no Especial demandaria a incursão no acervo fático-probatório da causa, o que encontra óbice nesta Corte, segundo a qual a pretensão de simples reexame de prova não enseja Recurso Especial. 11. Diante do exposto, nega-se provimento ao Agravo em Recurso Especial do INSS. 12. Publique-se. Intimações necessárias. Brasília (DF), 24 de maio de 2017. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO MINISTRO RELATOR

(STJ - AREsp: 666641 PI 2015/0015259-3, Relator: Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, Data de Publicação: DJ 05/06/2017)

Ademais, a resposta afirmava também repercute no aspecto interpretativo, visto que a própria Lei n. 8.112/1990 não dispõe sobre este ponto especial, quando se tratar de estágio probatório, podendo ser aplicadas as regras a todos os servidores públicos federais.

A remoção do servidor público não depende de cargo vago por se tratar de um direito subjetivo previsto em lei.

         Por derradeiro, conclui-se que, existem argumentos jurídicos suficientes para se afirmar que a remoção do servidor público federal por motivo de saúde é um direito subjetivo, devendo apresentar provas suficientemente adequadas (ex. laudos médicos), independentemente se o servidor estiver em estágio probatório.

 

 



[1] AC 0006842-20.2004.4.01.4000 / PI, Rel. JUÍZA FEDERAL ADVERCI RATES MENDES DE ABREU, 2ª TURMA SUPLEMENTAR, e-DJF1 p.243 de 31/05/2012.



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29/07/2021

Crimes em Licitações Públicas – Lei 14.133/2021 Análise ao art. 337-J do CP

 

VÍDEO EXPLICATIVO SOBRE O TEMA ACIMA

Violação de Sigilo em Licitação

Art. 337-J. Devassar o sigilo de proposta apresentada em processo licitatório ou proporcionar a terceiro o ensejo de devassá-lo:

Pena – detenção, de 2 (dois) anos a 3 (três) anos, e multa.


A Tutela Jurídica e o Plano de Existência

Assim como os crimes anteriormente previstos na Lei de Licitações, com alterações legislativas tais crimes estão em plena vigência, no qual foram alocados ao Código Penal.

A ideia central deste crime, bem como dos demais previstos atualmente no Código Penal, tem por finalidade trazer uma maior lisura no processo licitatório, evitando-se que viole o interesse público e, da mesma forma, os interesses dos particulares para que sejam contratados pela Administração Pública.

O ato considerado relativamente importante para a norma penal resume-se na conduta de devassar, que significa como ato de corromper ou perscrutar, assim como de dar a oportunidade para que um terceiro corrompa com o sistema de sigilo das propostas apresentadas em processo licitatório.

Oportuno salientar que, não houve alteração substancial neste crime, tendo em vista que o art. 94 da Lei n. 8.666/1993, já mencionava como ato de devassar ou propiciar a terceiro o sigilo do procedimento licitatório, sendo que o atual art. 337-J do Código Penal estabelece alteração para processo licitatório, apresentando-se como uma forma mais abrangente do que apenas procedimento, a nosso ver.

O sujeito ativo do crime pode ser servidor público, como também o particular.

É importante observarmos que, todos os atos praticados no processo licitatório são públicos, sendo que em casos excepcionais previstos em lei, quando, por exemplo, houver a necessidade de sigilo com crucial para a mantença à segurança da sociedade e do Estado (art. 13 da lei 14.133/2021).

Na prática dos processos licitatórios, a Nova Lei de Licitações Públicas e Contratos Administrativos ainda manteve o sigilo do conteúdo das propostas entre licitantes com o objetivo de manter o caráter competitivo, ao passo que, haverá o sigilo se a disputa entre os licitantes for fechada, assim, permanecerão até a data e hora de sua divulgação, conforme dispõe o art. 56, II da Lei 14.133/2021.

Denote-se que, neste último caso, o sigilo é temporário, pois todos os participantes e o ente licitante terão ciência do conteúdo das propostas apresentadas em tempo oportuno, distintamente, quando a licitação já se inicia sigilosa com o objetivo de proteger a segurança da sociedade e do Estado, todavia, não se trata de um sigilo totalmente absoluto.

Em relação ao sujeito passivo do crime será a Administração pública em sentido amplo (União estados, DF e Municípios e suas entidades controladas), os fundos especiais, as autarquias, as fundações públicas, as empresas públicas, as sociedades de economia mista (art. 1°, da Lei 14.133/2021, correspondente ao parágrafo único, da Lei n. 8.666/1993).

Elemento Subjetivo (dolo e culpa)

A presença do dolo, proveniente pela vontade proveniente do sujeito ativo do crime precisa ser de forma livre, consciente e atual de praticar quaisquer condutas previstas no art. 337-J, do Código Penal.

Inexiste a modalidade culposa para este crime.

Consumação e tentativa

 O crime se consuma no ato de devassar o sigilo de proposta apresentada em processo licitatório ou proporcionar a terceiro o ensejo de devassá-lo. A tentativa é possível.

O ato de devassar é crime material.

E será crime formal proporcionar a terceiro o ensejo de devassá-lo o sigilo da proposta apresentada em processo licitatório.

Pena (norma secundária)

A pena para o delito será de detenção, de dois a três anos, além da multa. Anteriormente, o art. 94, da Lei 8.666/93 estabelecia detenção de seis meses a dois anos e multa.

A questão do conflito aparente de normas penais entre o art. 337-J do CP e o art. 327 do Código Penal Militar

Objetivamente, a existência de conflito entre normas revela-se como o ponto central quanto a sua aplicação, devendo eleger esta ou aquela norma penal inserida em nosso ordenamento jurídico.

Cumpre salientar, que não é nenhuma novidade este conflito aparente de normas, ou seja, entre aplicar a regra geral (art. 337-J) e o especial (art. 327 do CPM), tendo em vista que a legislação anterior possuía quase a mesma redação, conforme já mencionado.

Ação Penal e Competência para processar e julgar

A ação penal será pública incondicionada, devendo o Ministério Público promove-la, sendo admitida ação penal subsidiária da pública, quando não for ajuizada ação no prazo previamente estabelecido em, conforme estabelece o art. 29 e 30 do Código de Processo Penal.

         Antes da alteração legislativa, a competência para processar e julgar seria dos Juizados Especiais Criminais (Lei n. 9.099/1995), visto que se tratava de crime de menor potencial ofensivo, assim como, pena não superior a dois anos.

         Ocorre que, houve o aumento de pena com detenção de dois a três anos e multa, no qual ultrapassa quanto aos requisitos de competência dos Juizados Especiais Criminais, sendo competente a Justiça comum, aplicando-se o rito estabelecido no Código de Processo Penal.

         Neste ponto, a competência sendo da Justiça Comum, será possível a promoção de medida de caráter despenalizador, podendo ser aplicável o Acordo de Não Persecução Penal[1] - ANPP, desde que preenchidos todos os requisitos estabelecidos no art. 28-A do Código de Processo Penal, inserido pelo Pacote Anticrime.

 



[1]Recomendo ao leitor uma breve leitura deste instituto jurídico importante para familiarização do termo, inclusive de ordem prática no processo penal brasileiro, diante da vigência do Pacote Anticrime:  https://drluizfernandopereira.blogspot.com/2020/02/analise-critica-sobre-o-acordo-de-nao.html

20/07/2021

O CANDIDATO PODE SER ELIMINADO POR TER BOLETINS DE OCORRÊNCIA?


                     Assista ao vídeo sobre o tema acima.


         Na prática, os concursos públicos exigem que se investigue a vida pregressa do candidato, visto que em determinados cargos a exigência de um futuro servidor público ter um passado exemplar perante a sociedade.

Dentre uma das etapas do concurso público, a investigação social, tem por objetivo saber sobre a conduta social e profissional  do candidato, devendo apresentar as informações de sua vida, não podendo omitir qualquer informação que seja solicitada.

Além disso, para complementar o ciclo investigativo de sua vida pregressa, as certidões de antecedentes criminais também são solicitadas visando avaliar a idoneidade moral, inclusive os concursos públicos exigem nos editais que o candidato não pode ter sido condenado por sentença judicial transitado em julgado, ou seja, sem que a possibilidade de recorrer, por se tratar de decisão final, independentemente do crime cometido.

É possível afirmar, portanto, que na fase de investigação social, como ocorre nos cargos para a área policial, a realização de análise pela autoridade administrativa não se resume apenas na constatação de condenações penais transitadas em julgado, podendo englobar também, a aferição de outros elementos relacionados à conduta moral e social do candidato (exame psicológico é um deles), com o objetivo de verificar sua adequação ao cargo pretendido.

Por outro lado, o STF já sedimentou seu entendimento que, Candidato não pode ser excluído de concurso público sem trânsito em julgado de condenação viola o princípio constitucional da presunção de inocência (art. 5º, inciso LVII, da CF/88)[1]. Portanto, sem uma decisão condenatória definitiva o candidato não pode ser eliminado do certame.

Além disso, há situações que durante a investigação social pode gerar efeitos negativos ao candidato, tendo por resultado a sua injusta eliminação no concurso público desejado.

No entanto, isto não significar dizer que a eliminação não seja revista ou alterada por meio de controle judicial, visto se tratar de ato discricionário da autoridade administrativa, bem como as consequências da decisão de eliminação do candidato em um concurso público, devendo obediência de atributos do ato administrativo, como competência, forma, finalidade, inclusive, devendo respeitar aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade.

Apresentados tais pontos, podemos adentrar ao tema com o objetivo de responder a indagação, afinal, o candidato pode mesmo ser eliminado por ter boletins de ocorrência?

Conforme já frisado, por se tratar de ato administrativo eliminar candidato de concurso público pode ser revisto por meio do judiciário, desde que provada à ofensa dos princípios constitucionais e infraconstitucionais.

Resta evidente que, seria injusto o candidato ser eliminado por ter boletins de ocorrência, sendo muito comum qualquer cidadão registrá-lo ou ter sido mencionada por qualquer motivo, como por exemplo, um acidente de veículo, a pessoa ter sido autora de calunia, ou mesmo, ter registrado o boletim de ocorrência em desfavor de seu ex-companheiro que perseguia, solicitando a medida protetiva, prevista em lei[2]. Percebe-se que são diversas situações que será  possível a existência do boletim de ocorrências, seja em favor ou contra o candidato.

Quanto a existência do boletim de ocorrência, a favor ou contra o candidato, por vezes, não se tratando de questões de extrema gravidade não poderia (em tese) culminar uma eliminação do candidato, até mesmo, existem situações que não geram efeitos negativos, como um prosseguimento de uma ação penal em desfavor do candidato e ainda que houvesse, também não seria motivo para a sua eliminação, pois se exige o transito em julgado de sentença condenatória, conforme já mencionado.

Portanto, sobre tais posicionamentos sedimentados dos Tribunais Superiores, podemos concluir que, o candidato não pode ser eliminado por ter boletins de ocorrência, por ofensa ao princípio da razoabilidade, proporcionalidade, em especial, ao princípio da presunção de inocência. Vejamos alguns julgados recentes:

"AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONCURSO PARA SOLDADO DA POLÍCIA MILITAR E SOLDADO BOMBEIRO DA POLÍCIA MILITAR. RECORRENTE EXCLUÍDO DO CERTAME NO EXAME DE PESQUISA SOCIAL E DOCUMENTAL. OMISSÃO DE INFORMAÇÕES. Todavia, boletins de ocorrência de fatos de somenos importância, os quais, mesmo que fossem declarados pelo candidato, não teriam força a ensejar sua eliminação do concurso público. Princípio da razoabilidade. Situação peculiar. Decisão denegatória da liminar reformada. Recurso provido."

(TJPR - 5ª C.Cível - AI - 1497201-1 - Curitiba - Rel.: Luiz Mateus de Lima - Rel.Desig. p/ o Acórdão: Rogério Ribas - Por maioria - - J. 14.06.2016).

Em julgado mais recente:

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. JUÍZO DE RETRATAÇÃO. ARTIGO 1.030, II, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO. CARGO DE INVESTIGADOR DE POLÍCIA. INVESTIGAÇÃO SOCIAL. ATO ADMINISTRATIVO DE CONTRAINDICAÇÃO DE CANDIDATO. OBSERVÂNCIA DAS REGRAS PREVISTAS NO EDITAL. LEGALIDADE DO ATO ADMINISTRATIVO. RECURSO NÃO PROVIDO. - O ato que considerou o candidato contraindicado na fase de investigação social não pode ser considerado ilegal, de modo a caracterizar violação ao direito líquido e certo, pelo fato de ter se baseado em condutas colhidas por meio de Boletins de Ocorrência lavrados em seu desfavor (do candidato), ainda que não tenha havido condenação penal - O procedimento de Investigação Social não se confunde com simples análise de antecedentes criminais, circunstância objetiva que, se assim fosse, dispensaria, inclusive, instituição de comissão própria. Trata-se de verdadeira análise "interna corporis" que visa apurar a aptidão do candidato para o exercício das funções inerentes ao cargo que pretende ocupar, levando-se em consideração, notadamente, sua vida pregressa, como forma de evitar que sejam admitidos aqueles que não detenham a necessária inclinação à atividade tão importante e complexa para a manutenção da segurança e da ordem pública.

(TJ-MG - AC: 10000150660413007 MG, Relator: Moacyr Lobato, Data de Julgamento: 01/07/2021, Câmaras Cíveis / 5ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 02/07/2021)

 

APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO ANULATÓRIA DE ATO ADMINISTRATIVO – CONCURSO PÚBLICO PARA INGRESSO NA POLÍCIA MILITAR DO ESTADO DE SÃO PAULO – CANDIDATO REPROVADO NA FASE DE INVESTIGAÇÃO SOCIAL – ELIMINAÇÃO SEM CAUSA RAZOÁVELAs condutas que motivaram a exclusão do certame não permitem chegar à conclusão de que se trata de pessoa que ostenta perfil incompatível com o cargo em disputa – Precedentes desta Corte – Sentença reformada – Recurso parcialmente provido.

(TJ-SP - AC: 10186643920198260053 SP 1018664-39.2019.8.26.0053, Relator: Marrey Uint, Data de Julgamento: 29/06/2021, 3ª Câmara de Direito Público, Data de Publicação: 01/07/2021)

 

Além disso, se num caso concreto o candidato for eliminado por este fato na fase de investigação social, poderá socorrer do Poder Judiciário e ingressar com uma medida judicial adequada, com o objetivo de aplicar os efeitos de nulidade do ato administrativo eivado de vício, sendo muito comum ação de mandado de segurança ou uma ação de obrigação de fazer, exigindo que retome ao concurso público.

Por derradeiro, quanto ingressa com ação judicial para esta finalidade, o problema se esbarra ao fator tempo, pois, mesmo que apresentados todos os argumentos ora expostos, bem como a posição consolidada dos Tribunais Superiores, vivenciamos tais situações, que compartilharemos em tópicos:

1. Muitos bons candidatos eliminados injustamente pela via administrativa, comumente, nos concursos para carreira policial;

 2. A morosidade das ações judiciais, ao passo que o Poder Público, a outra parte da demanda, recorre de todas as decisões utilizando o reexame necessário, levando a entender quanto a resistência das decisões dos consolidadas dos Tribunais, conforme frisado;

3. Ainda que trazidos os dois pontos, tidos como fatores negativos, não pode servir como desestímulos ao candidato, que almeja um cargo público de sua vida, devendo contratar um profissional para o ingresso da ação judicial.

 



[1] STF, RE 634224

[2] Processo n. 501472-36.2020.8.24.0081/SC.

19/05/2021

É NECESSÁRIA A AUTORIZAÇÃO JUDICIAL PARA VENDA DE IMÓVEL DE CURATELADO?

Vídeo sobre o tema
 
 Inicialmente, a curatela representa uma obrigação imposta por lei e destina-se a proteção de pessoas incapazes, no qual podemos distinguir:

·        Enfermos com discernimento reduzido: viciados em tóxicos, ébrios habituais, os que não puderem exprimir sua vontade por causa transitória ou permanente e os pródigos.

 

·        Portadores de deficiência: aqueles que por deficiência física ou mental exija a proteção de curador para ato específico de natureza patrimonial, que é disciplinado por regime jurídico próprio, conforme a Lei. 13.146/2015.

 

Nos termos do art. 1.767 do Código Civil de 2002, estão sujeitos à curatela apenas os que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir sua vontade; os ébrios habituais, os viciados em tóxicos e os pródigos, consideradas como relativamente incapazes, em consonância ao art. 4° do Código Civil.

É preciso esclarecer que as pessoas com deficiência, seja qual for a sua categoria, regra geral são consideradas pessoas capazes, sendo que excepcionalmente, só poderá ser curatelada se houver a causa de sua incapacidade, ou seja, que impeça a sua livre escolha de vida, de exprimir sua vontade.

De acordo com o Estatuto da Pessoa com Deficiência, será necessário que a pessoa com deficiência seja submetida à curatela, sendo medida protetiva extraordinária, proporcional às necessidades e às circunstâncias de cada caso, e durará o menor tempo possível (art. 84 e seguintes da Lei n. 13.146/2015).

Ademais, o referido Estatuto estabelece limites da curatela do deficiente para os atos relacionados aos direitos de natureza patrimonial e negocial, não alcançando aos direitos tidos como existenciais, como o próprio corpo, à sexualidade, ao matrimônio, à privacidade, à educação, à saúde, ao trabalho e ao voto (art. 85 e seguintes da Lei n. 13.146/2015).

Em regra, o curador será pessoa que tenha vínculo de natureza familiar, afetiva ou comunitária com o deficiente, sendo medida excepcional o juiz, ouvido o Ministério Público, de ofício ou a requerimento do interessado, nomear curador provisório.

É importante afirmar também que a incapacidade de natureza subjetiva pode ser em decorrência de condições físicas ou patológicas da pessoa.

Neste ponto, a curatela é necessária para proteger também aos enfermos quando não possuírem o discernimento da vida civil, inclusive em determinadas situações para proteção específica para atos de ordem patrimonial.

Diante de tais proposições iniciais acerca da curatela, podemos trazer a indagação: é possível realizar a venda de propriedade imobiliária de uma pessoa interditada?

A resposta é de grande importância tanto para compradores, aqueles que investem em imóveis, ou mesmo aos que realmente necessitam vender um imóvel de um curatelado, no qual é possível realizar a venda do bem, desde que tenha autorização judicial, ou seja, deverá passar pelo controle de tal ato por meio do Poder Judiciário.

Salienta-se que mesmas regras para os tutelados (menores de idade), serão também para a curatela, conforme o art. 1.781. Código Civil de 2002.

A fundamentação jurídica para a resposta positiva está relacionado ao fator econômico do interditado (a), que a venda da propriedade seja manifestamente vantajosa, evitando-se qualquer abuso ou erro na gestão por parte do curador e a consequente penúria do interditado, pois há situações que não será necessário realizar a venda sem uma justificativa plausível, ao não ser, em busca de melhores condições de vida do interditado.

 

Podemos citar um breve exemplo: uma pessoa interditada que possui dois imóveis, no qual o curador deseja vender um deles com o objetivo de livrar-se de dívidas futuras (como IPTU, despesas condominiais, etc.), assim como tais valores da venda do imóvel poderá auxiliar para o custeio da saúde da interditada, gerando uma gestão patrimonial mais adequada.

No exemplo citado, entendemos que nada impede que a pessoa possua apenas um imóvel, seja para moradia ou para custeio de sua saúde, mas será menos custoso vende-lo e comprar outro com melhor qualidade ou inerente ao custo benefício da transação mais próximo da realidade, conforme os índices de mercado.

Assim, havendo a manifesta vantagem ao interditado, será necessária a autorização judicial para a venda do bem, ao passo que, se houver a venda sem a referida autorização judicial não poderá repercutir efeitos jurídicos negativos que será nula devido à ausência de capacidade do interditado.

É neste ponto que a manifesta vantagem ao interditado, pois se o juiz verificar que não possua o referido requisito previsto no art. 1.750, do CC/02, logo, será indeferido o pedido. Interessante pontuarmos que manutenção do bem também pode ser considerada como uma vantagem ao interditado, desde que observado, caso a caso.

No que diz respeito ao processo de autorização judicial, o Ministério Público será ouvido e dará seu parecer e posteriormente, se aceitas as argumentações conforme as provas apresentadas no processo, o juiz expedirá o alvará de venda do imóvel, em valor não inferior ao da avaliação que será realizada por perito judicial.

Desta forma, podemos trazer os breves aspectos para a concessão de autorização judicial:

1)   Manifesta vantagem ao interditado/incapaz

2)   Avaliação do imóvel por perito nomeado pelo juiz.

3)   Expedição de alvará de venda do imóvel em valor não inferior ao da avaliação.

Para além dos aspectos acima referidos, podemos observar que, a concessão de alvará judicial para a venda do imóvel, deverá se efetivar após a negociação com o comprador, no qual será mais segura à decisão da liberação, se houver o depósito judicial da importância correspondente do imóvel.

         É evidente que não se pode exigir que o comprador efetue o pagamento do imóvel ou qualquer outro tipo de caução, para que posteriormente fosse autorizada a venda via alvará judicial, pois, poderá gerar insegurança ao comprador, assim como, não estando prescrito em lei.

Em relação à negociação com o comprador, é fundamental que todas as propostas estejam documentadas, inclusive, o pré-contrato ou contrato preliminar precisa ser firmado entre as partes, trazendo segurança jurídica na transação. 


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06/05/2021

Notícia: Trabalhador aviarista consegue reconhecimento de aposentadoria rural

 


A 1ª turma recursal dos Juizados Especiais Federais de Pernambuco/PE, atendeu pedido de trabalhador que exerceu atividade de aviarista, e reconheceu sua aposentadoria por idade rural.

Para os magistrados, a função desempenhada é equivalente ao trabalho rural. 


O caso tratou de recurso inominado interposto por um trabalhador, contra sentença que julgou improcedente seu pedido de aposentadoria por idade de trabalhador rural.

O homem pleiteou a reforma da decisão de 1º grau, sob o argumento de que sua atividade como aviarista o enquadra como empregado rural. Assim, alegou o preenchimento dos requisitos para a aposentadoria por idade rural, uma vez que a sentença já reconheceu o preenchimento do requisito etário e da carência de 180 meses, conforme planilha anexada à decisão.

A relatora considerou que o trabalhador anexou CTPS que revelou que em diversos períodos ele laborou num estabelecimento rural, exercendo a função de aviarista, atividade que consistia em fazer limpeza dos locais destinados à criação dos frangos, carregar ração, carregar e descarregar o caminhão com as aves, entre outras.

"Dessa forma, resta demonstrada a qualidade de trabalhador rural do autor. Assim, tendo em vista que o autor já cumpriu os requisitos de idade e de carência, entendo que o autor faz jus ao benefício requestrado."

Por fim, a turma deu provimento ao recurso do trabalhador, e reformou a sentença concedendo-lhe a aposentadoria por idade rural.

AÇÃO DE REGISTRO DE CASAMENTO TARDIO



 A Ação de Registro Tardio ou Suprimento de Casamento tem por finalidade suprir, restaurar ou reconstruir um registro de casamento que, diante de determinada circunstância teve seu extravio, danificado ou não foi lavrado no momento adequado, conforme previsão legal.

A Lei de Registros Públicos estabelece que, será possível a retificação de dados constantes de certidões dos registros civis de seus ancestrais. Ademais, a ancestralidade, ou seja, o direito de conhecer sobre os antepassados é um direito fundamental e único de todo e qualquer cidadão, inclusive o estrangeiro. Podemos citar, por exemplo, um argentino que busca a origem de sua família descobre que seu avô casou-se no Brasil.

Certamente a pretensão ao registro civil de casamento de ascendentes falecidos, geralmente tem por finalidade a obtenção de cidadania estrangeira, como a italiana, francesa, alemã, espanhola, etc.

Interessante pontuarmos que, historicamente a celebração do casamento na esfera religiosa antes da entrada em vigor do Decreto n. 181 de 1890 e da Constituição da República de 1891, era realizado pela Igreja Católica.

Na prática, o Tribunal de Justiça de São Paulo já se manifestou em diversos julgados que a comprovação do casamento religioso celebrado em 1899, é considerada com época de transição entre os registros paroquiais e a exigência de registro civil perante o cartório e desta forma, o reconhecimento do registro tardio de casamento não viola direito público, nem causará prejuízos a terceiros ou lesão a interesse alheio[1].

 Em relação as provas documentais para a propositura da ação de registro tardio de casamento, geralmente a certidão de óbito apresenta a informação se a pessoa era casada ou não.

Além disso, cumpre ao interessado realizar a pesquisa nos prováveis cartórios da região do casamento, cabendo ao cartório emitir uma certidão negativa.

Evidentemente, o interessado também deverá comprovar o grau de parentesco demonstrando seu interesse processual para a propositura da ação.

A ação será proposta por advogado, que pedirá ao juiz que emita o cartório competente para registro, supressão ou restauração do casamento que não foi devidamente registrado, bem como, poderá proceder as retificações que se fizerem necessárias, como erros de grafia em nomes e sobrenomes, por exemplo.

Para fins de compreensão, compartilharemos recentes decisão do E. Tribunal de Justiça de São Paulo acerca da temática:

REGISTRO CIVIL. ATRIBUIÇÃO DE EFEITO CIVIL A CASAMENTO RELIGIOSO. PEDIDO FORMULADO POR TERCEIRO. MATRIMÔNIO RELIGIOSO CONTRAÍDO PELOS BISAVÓS DO AUTOR. ILEGITIMIDADE. Casamento que constitui ato personalíssimo. Consentimento mútuo dos nubentes que configura pressuposto de existência do ato. Matrimônio religioso contraído em 1924. Casamento que, a partir do período republicano, passou a condição de laico e civil. constituição da república de 1937 que retomou a possibilidade de atribuição de efeito civil ao matrimônio celebrado por representante religioso (artigo 146). Lei nº 379/1937 que, ao regulamentar o preceito constitucional, deferiu aos nubentes a faculdade de postular a atribuição de efeito civil, mediante registro, ao casamento realizado perante autoridade religiosa (artigo 1º). Constituição da república de 1988 que também reconhece efeito civil ao casamento religioso, desde que atendidos os requisitos legais (artigo 226, § 2º). atual lei de registros públicos (lei nº 6.015/1973) que estabelece o rito de registro do casamento religioso, sem prévia habilitação, para efeitos civis que atribui aos nubentes a legitimidade para formular o requerimento (artigo 74). Sistema jurídico brasileiro que não confere a terceiros a legitimidade para pleitear o registro de casamento religioso para obtenção de efeito na esfera civil. Ato personalíssimo, considerando a modificação no estado das pessoas envolvidas. União estável. Impossibilidade de reconhecimento. Convivência iniciada e extinta preteritamente à magna carta de 1988 e à lei nº 9.278/96. Convivência de concubinos que, à míngua de respaldo normativo, era equiparada à sociedade fato, nos termos da súmula nº 380, do supremo tribunal federal. sentença mantida. recurso desprovido.

 

(TJ-SP - AC: 10063857920198260066 SP 1006385-79.2019.8.26.0066, Relator: Vito Guglielmi, Data de Julgamento: 04/10/2013, 6ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 24/01/2020)



[1] Apelação Cível nº 1073406-04.2018.8.26.0100; Rel. Rômolo Russo, 7ª Câmara de Direito Privado, j. 22/02/2019; Apelação Cível nº 1127476-68.2018.8.26.0100, Rel. Luis Mario Galbetti, 7ª Câmara de Direito Privado, j. 01/06/2019).


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AÇÃO DE REGISTRO TARDIO DE NASCIMENTO E ÓBITO

       

*vídeo sobre o tema acima.


 
A  Ação de Registro Tardio ou Ação de Suprimento de Registro Tardio tem por finalidade de suprir a inexistência de registro civil de pessoa falecida pela via judicial.

         Geralmente, a Ação de Registro Tardio é promovida por aqueles que buscam o direito dos descendentes de imigrantes que deseja obter a cidadania estrangeira, provando-se documentalmente o vinculo sanguíneo e a árvore genealógica.

         Salienta-se que, a ação não somente serve para cidadania estrangeira, como também para pessoas vivas promoverem o registro tardio de nascimento, como ocorreu recentemente quando um idoso precisava vacinar-se contra a Covid-19, porém não teria nenhum documento pessoal para participar da vacinação, no qual o juiz determinou a lavratura de registro tardio de nascimento[1].

         O fundamento jurídico para a promoção da Ação de Registro Tardio está contido no art. 109, da Lei de Registros Públicos:

Quem pretender que se restaure, supra ou retifique assentamento no Registro Civil, requererá, em petição fundamentada e instruída com documentos ou com indicação de testemunhas, que o Juiz o ordene, ouvido o órgão do Ministério Público e os interessados, no prazo de cinco dias, que correrá em cartório.

         Conforme a leitura do artigo acima referido, somente será cabível a ação, quando apresentada em juízo todas as provas documentais ou mesmo poderão ser ouvidas as testemunhas em juízo.

         Assim, cabe ao interessado, autor da ação, realizar as buscas nos cartórios antes da promoção da ação e, não existindo qualquer registro civil, o cartório expedirá uma certidão negativa. Assim, comprova-se a sua inexistência documental.

Podemos citar exemplos de provas mais comuns, como:

a)   Certidão negativa de nascimento da cidade que a pessoa falecida residiu emitida pelo Cartório de Registo de Pessoas Naturais.

 

b)    Certidão de casamento civil e/ou religioso;

 

c)   Certidão de óbito para atestar a existência da pessoa falecida;

 

d)   Certidão de batismo da Igreja;

 

e)   Documentos oficiais, como Registro Geral, Reservista do Serviço Militar, Carteira de Trabalho ou qualquer outro documento equivalente.

         Aos aspectos processuais, o Ministério Público cumpre seu papel institucional zelando fiel aplicação das leis, no qual opinará em relação aos pedidos formulados pelo autor da ação.

         Havendo qualquer impugnação de qualquer interessado ou mesmo do Ministério Público, o juiz determinará a produção da prova no prazo de dez dias e posteriormente, em três dias, os interessados e o MP. Posteriormente ao referido prazo, o juiz decidirá em cinco dias (art. 109,§ 1°, da Lei de Registros Públicos).

         Não havendo qualquer impugnação ou a necessidade de produção de mais provas, o juiz decidirá no prazo de cinco dias, ao passo que, julgando procedente ou improcedente, caberá recurso de Apelação com efeito suspensivo e devolutivo (art. 109,§ 2° e 3°, da Lei de Registros Públicos).

         No tocante aos efeitos da decisão, se julgado procedente o pedido, o juiz ordenará que se expeça mandado para que seja lavrado, restaurado e retificado o assentamento, indicando com precisão, os fatos e as circunstâncias que devam ser retificados, e em que sentido, ou os que devam ser objeto do novo assentamento (art. 109,§ 4°, da Lei de Registros Públicos). Explica-se, o juiz encaminhará ao Cartório para que seja emitida a certidão de nascimento, que será válida no Brasil e no exterior.

         Apresentadas todas as questões processuais, podemos afirmar que não se trata de mera ação, visto que passará ao crivo de controle do Ministério Público e até mesmo do juiz e caso não existir fundamento fático e documental a ação não terá êxito.

         Importantíssimo observarmos como os Tribunais tem se manifestado a respeito da ação de registro tardio de nascimento, especialmente quanto às provas apresentadas no processo.

         A primeira observação é que as provas testemunhais são relativas e insuficientes, cabendo ao autor da ação trazer outros elementos de provas além de oitiva de pessoas em juízo. Vejamos um interessante julgado:      

APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE REGISTRO TARDIO DE NASCIMENTO - PEDIDO DE PROCEDÊNCIA EM FACE DA PROVA TESTEMUNHAL - PROVAS INSUFICIENTES - AUTORA SEM INFORMAÇÕES DE FAMILIARES E PARENTES - DEPOIMENTOS FRÁGEIS - SOTAQUE ESTRANGEIRO VERIFICADO PELO MAGISTRADO A QUO QUANDO DA AUDIÊNCIA - GRANDES POSSIBILIDADES DE A APELANTE NÃO SER BRASILEIRA - RECURSO NÃO PROVIDO. Resta não provida a apelação quando verificado que inexiste nos autos provas suficientes para a procedência do pedido de lavratura do registro de nascimento da apelante com os dados constantes na petição inicial, inclusive quando a autora-apelante admite que não tem informações de parentes ou familiares e, ainda, quando ninguém nada sabe de sua vida antes de vinte anos atrás. Ademais, em seu depoimento o magistrado fez constar a grande possibilidade de a apelante não ser brasileira, situação que o artigo 50 da Lei dos Registros Públicos desautoriza o registro civil.

(TJ-MS - AC: 9849 MS 2005.009849-5, Relator: Des. Luiz Carlos Santini, Data de Julgamento: 20/09/2005, 2ª Turma Cível, Data de Publicação: 01/11/2005);

Em outro julgado recentíssimo, o Tribunal de Justiça de São Paulo entendeu que o foro competente para a propositura da ação é o da residência do requerente[2].

É por este motivo que se deve ter toda a cautela necessária para a promoção da Ação de Registro Tardio, evitando-se gastos (de tempo, esforço e dinheiro).

Para promoção da ação será necessário o interessado estar representado por advogado.



[1] A título de curiosidade, para leitura da decisão do juiz da 2ª Vara Cível da comarca de Goiás: https://www.tjgo.jus.br/images/docs/CCS/nascimentoregistrotardio.pdf

 

[2] TJ-SP - AC: 10173455120208260554 SP 1017345-51.2020.8.26.0554, Relator: Alexandre Coelho, Data de Julgamento: 29/04/2021, 8ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 29/04/2021.


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