01/11/2018

A Ausência de norma regulamentadora da autorização para o cultivo de drogas para fins medicinais ou científicos


      
     Nos termos do artigo 2° da LEI 11.343 /2006, diz respeito à norma penal proibitiva ou não permissiva, ao estabelecer quanto à proibição das drogas, especificamente ao plantio, a cultura, a colheita, exploração de vegetais e substratos, que possam ser extraídos ou mesmo produzidas no território nacional.

Conforme o referido artigo, a excepcionalidade somente se houver lei que permita tal produção de atos. Além disso, poderá ser estabelecido por meio de Tratado e Convenção Internacional, desde que ratificado pelo Brasil, como por exemplo, o artigo 2° da Lei de Drogas que menciona a Convenção de Viena sobre Substâncias Psicotrópicas, das Nações Unidas, de 1971, no qual foi ratificado pelo Estado Brasileiro em 1977 pelo Decreto n. 79.388.

          Outra ressalva reveste-se sob o manto da soberania nacional, quando estabelece que, a União poderá autorizar o plantio, cultura e colheita de vegetais, desde que seja com a finalidade medicinal ou cientifico, de acordo com prazo, local e por ato fiscalizatório. Entendemos que o artigo 2°, parágrafo único da Lei de Drogas ser uma norma programática, exigindo-se de uma norma posterior para que se consiga uma melhor efetividade prática.

          Logo surge uma indagação: não havendo uma norma especifica que trate da autorização do Poder Público para o cultivo de drogas para fins medicinais ou mesmo científico, pode o interessado ingressar com uma medida judicial? A resposta para a referida indagação está em nossa Constituição Federal de 1988.

          No artigo 23, V, da CF/88, trata como competência comum da União, dos Estados, DF e Munícipios proporcionar os meios de acesso à cultura, à educação, à ciência, à tecnologia, à pesquisa e à inovação. Haverá também a concorrência de todos os ententes federativos, para legislar sobre a matéria, conforme o artigo 24, da CF, no entanto, a promoção e ao incentivo é do Estado Maior, a União Federal (art. 218, CF).

          Por não haver norma especifica tratando sobre a autorização para fins medicinais e científicos, não significa dizer que o particular, como no caso de uma associação, fundação ou mesmo empresas privadas de pesquisarem estejam impedidas de pesquisarem sobre tais drogas, pois estaríamos a enfrentar num grande engessamento de pesquisas. Existe uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 5708) em tramite no Supremo Tribunal Federal, com o objetivo de descriminalização da Cannabis para fins medicinais.

          Sobre o critério interpretativo, de modo algum podemos fazer algo que a lei estabelece como crime, entretanto, se o Poder Judiciário, ao enfrentar sobre o tema, deverá ter a devida cautela, pois, se de um lado, a inexistência de uma norma regulamentadora; de outra, temos outros princípios, como a dignidade da pessoa humana, não podendo o Poder Público motivar ainda mais nas pesquisas, ao passo que, se agir de modo contrário, seguramente estaríamos num caótico problema, jamais evoluir no que pertine ao conhecimento humano.

          Na senda processual, nada impediria que o interessado ingressasse com uma Ação de Mandado de Injunção (artigo 5º, inciso LXXI, da CF/1988), normalmente utilizada usada, seja na forma individual ou coletivamente, com o objetivo de o Poder Judiciário dar ciência ao Poder Legislativo sobre a ausência de norma regulamentadora, o que torna inviável o exercício dos direitos e garantias constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, soberania e cidadania.

          É sabido, sobre a temática, que a ausência de norma regulamentadora acaba por engessar ou obstaculizar as pesquisas. Na prática, cumpre ao julgador saber dosar o limite da decisão fundamentada para que se evite o ativismo judicial[1].

          Com base na aplicação e efetividade dos Direitos Humanos Fundamentais, os tribunais tem se manifestado pela autorização de medicamentos com derivados da maconha, desde que para fins medicinais para tratamento uma menina de 5 anos de idade que tinha quadros de epilepsia [2].
          Fato interessante que, A Associação para Pesquisa e Desenvolvimento da Cannabis Medicinal no Brasil (Cannab) entrou com um pedido de liminar na Justiça da Bahia pelo direito de pesquisar, cultivar e produzir o óleo de maconha para fins medicinais. A substância, o canabidiol, já é utilizada em diversos tratamentos neurológicos pelo mundo, mas, no Brasil, o acesso ao medicamento ainda esbarra em questões burocráticas e, principalmente, financeiras[3]. Na ação judicial houve pedido de liminar, no qual foi indeferido pela 6° Vara Federal, pois, entendeu a magistrada que qualquer tipo de decisão implicaria diretamente na “intervenção judicial direta em políticas públicas de saúde e planejamento de controle de substâncias psicoativas[4]”.

          Afora em casos mais reservados ao direito individual do que individual homogêneo[5], recentemente, a Justiça Federal já autorizou uma família a importar sementes de maconha e cultivar 16 pés da planta para que possa fazer a extração artesanal de óleo medicinal de cannabis, que será utilizado no tratamento de uma criança com epilepsia grave e transtorno do espectro autista[6]. No caso, a magistrada concedeu a liminar de Habeas Corpus, ao manifestar: “No eventual conflito entre a proteção aos bens jurídicos tutelados pelos delitos previstos nos artigos 28 e 33 da Lei de Drogas e os direitos à saúde e à vida do filho da paciente, devem prevalecer estes últimos[7]". Obviamente a decisão foi fundamentada por bases técnicas, seguindo por base pareceres e laudos.

Ainda que hajam discussões e pontos de vistas diversos para ambos os lados, no tocante a autorização ou não  pela via judicial, quando ao uso de drogas exclusivamente para fins medicinais e científicos, seguramente, só iremos ter um resultado justificável mediante uma Lei Federal, porém, a questão de utilização para fins medicinais tem sido muito mais fácil para o julgador no enfrentamento do caso concreto, pois, à luz do  princípio da dignidade da pessoa humana é possível resguardar melhor um bem juridicamente relevante, a vida.




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