Historicamente, o cheque tinha uma
utilidade interessante. Surgiu na Idade Média, no qual depositavam o ouro numa
oficina do ouvires, que tinha certa segurança, sendo que artesãos emitiram
papéis que representavam ouro que guardavam, obrigando seu cambio pelo valor em
metal precioso.
Após esta fase da história da
humanidade, já no século XIV, o comércio foi utilizando-se destes papéis como
representando valores fixos, surgindo também outras espécies de título de
crédito.
Em meados de 1605, cria-se o Banco da
Inglaterra, local que tinha por função guardar todo ouro do reino e
disponibilizar papeis que o representavam, sendo que eram emitidos pelo Estado.
Atualmente, quase não se muda muito a
finalidade do cheque, a diferença que as instituições financeiras detêm a
disponibilização para seus clientes este título de crédito. É menos usual do
que de costume, pois se utiliza mais o cartão de crédito com forma de
pagamento, parcelando determinados valores.
Atendo-se numa conceituação mais
simples possível, o Cheque é uma ordem de pagamento à vista, expedida contra
banco sobre fundo depositado na conta de seu emitente para pagamento ao seu
beneficiário.
Leciona o professor Gladston Mamede
(2009: 380):
“O cheque é
um título de crédito por meio do qual uma pessoal (chamada emitente ou sacador)
dá uma ordem a uma instituição financeira (sacado), no qual mantém conta
bancária, para que pague, a vista, certa quantia a alguém (beneficiário ou
tomador). É um título abstrato que não tem causa obrigatória, abstraindo-se por
completo do negócio base, no moldes já estudados. Embora se tenha uma relação
jurídica triangular, o cheque não admite a figura do aceite: a compensação para
que, havendo fundos, a ordem seja cumprida”
Precisamente, há situações específicas
para o seu não pagamento, como insuficiência de fundos, prescrição ou sustação.
A Lei do Cheque reporta suas situações referentes à sustação:
a) Revogação ou contra-ordem (art. 35): será realizada
pelo emitente do cheque por meio de contra-ordem dada por carta dirigida ao
banco sacado, podendo ser também pela via judicial ou extrajudicial, desde que
expostas tais razões.
b) Oposição ou sustação (art. 36): será realizada pelo
emitente ou credor, ainda que durante o prazo de apresentação, pela sustação do
pagamento do cheque manifesta-se por escrito por carta dirigida ao banco sacado
e tendo motivo para tanto.
Em relação ao protesto pelo não pagamento do cheque,
podemos elencar algumas situações relevantes:
a)
Como ordem de
pagamento à vista, quando constatado a insuficiência de fundo, o cheque terá
seu prazo previsto na Lei do Cheque para sua apresentação de pagamento, como
trinta dias, se na mesma praça e sessenta dias em praça distinta;
b)
Tendo o protesto
sua finalidade na conservação de direito, os coobrigados também serão
protestados;
Feitas tais considerações breves a
respeito deste instituto, passa-se a adentrar sobre o direito de cobrança do
cheque.
Qualquer cidadão ao seu exercício de
direito pode cobrar um cheque. E para isto, não haverá limitações quanto ao seu
sujeito, podendo ser pessoa física ou jurídica.
Entretanto, há limites temporais estabelecidos em
nossa legislação nacional, tanto na Lei n. 7.357 de 2 de setembro de 1985,
denominada como “Lei do Cheque”, bem como Código Civil de 2002. Passamos a
análise de tais instrumentos legislativos.
Na “Lei do Cheque” o prazo de prescrição do direito de cobrança é de
6 (seis) meses e o prazo legal para o protesto é de 30 (trinta dias) quando
emitido no lugar onde deverá ocorrer o pagamento e, de 60 (sessenta) dias,
quando emitido em outro lugar do País ou no exterior e o protesto deve ser
feito no lugar de pagamento ou do domicílio do emitente.
Tratando-se de cheque pós-datado, deve ser contada a
data da efetiva apresentação do cheque do banco sacado, se esta for anterior à
data constante no cheque e sua emissão.
Fundado o prazo previsto no artigo da lei acima
referida, resta ao credor a possibilidade de propositura de demanda cambiária
fundada no enriquecimento sem causa do devedor, cuja pretensão prescreve em
dois anos, conforme artigo 61 da Lei n. 7.357/1985. Escoado o prazo de dois
anos, o cheque perde sua força cambiária.
Já no Código Civil de 2002, o cheque está subordinado
ao prazo prescricional de 5 (cinco) anos, como dispõe o artigo 206, § 5°, I.
Neste caso, se dentro deste prazo, pode o credor propor demanda condenatória
fundada na relação jurídica subjacente ao título.
Em resumo: o prazo para o direito de cobrança do
cheque é de seis meses e para o protesto o prazo é de trinta dias, mas para sua
efetiva cobrança, o prazo prescricional é de cinco anos.
Um ponto que precisa ser indagado, afinal, para que
serve o protesto no cheque?
Respondendo tal indagação, o protesto neste caso,
serve como prova de inadimplência e o descumprimento de obrigação originada de
títulos e outros documentos de dívidas, conforme o artigo 1° da Lei n.
9.492/97.
Mas nada impede que possa cobrar os valores do cheque
diretamente na Justiça.
Depois de observados os prazos acima, além destes
prazos nada pode ser feito para efetuar sua cobrança, nem mesmo o seu protesto.
É preciso alertar aqueles que detêm o cheque e cumprir
os exatos prazos estabelecidos pela legislação em vigência, pois podem causar
transtornos (inclusive financeiros), eis que contextualiza bem esta frase
latina: “Dormientibus non sucurrit jus[1]”
Mas que transtornos podem
ocorrer se, ultrapassado o prazo legal estabelecido para cobrança, der continuidade
do mesmo modo?
Sabe-se que, ninguém se
escusa de cumprir a lei, alegando que não a conhece como prevê o artigo 3° da
Lei de Introdução as Normas do Direito Brasileiro.
Assim, o extrapolado o
limite temporal queda por configurar em abuso de direito, como o trata o artigo
187 do Código Civil de 2002, “in verbis”:
“Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo,
excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social,
pela boa-fé ou pelos bons costumes”
Neste
ponto, haverá um elo configurador de responsabilização civil no ato de cobrar o
cheque fora do tempo. Para que sejamos didáticos, há três critérios que podemos
expor:
a)
Intenção de lesar
outrem, no exercício de um direito com o intuito exclusivo de prejudicar, que
deverá ser provado quem o alega;
b)
Ausência de
interesse sério e legítimo;
c)
Exercício fora da
finalidade econômica e social.
Por certo, agindo desta forma, quem detém o cheque e
além do prazo legal e ainda cobra, seja por protesto ou mesmo judicialmente,
vê-se a ausência de seu interesse sério e legítimo fora de sua finalidade
econômica e social.
Além disso, haverá lesão do titular da conta corrente
no que deve o valor do cheque, já que ultrapassou o limite para a cobrança tem
o seu direito a indenização. Na precisão legislativa, o artigo 186, do Código
Civil, “in verbis”:
“Aquele que,
por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e
causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”
Cumpre afirmar que, houve lesão no ato do credor em
querer receber os valores pecuniários descritos no cheque fora do lapso
temporal, pois nada pode ficar ad eterno.
Houve violação de direito, pois a lei o quis que fosse assim, estipulando
prazos para serem cumpridos. E se violou direito, consequentemente, causou
dano, daí que terá o direito à indenização.
Para ter o seu direito reparado, resta apenas à
promoção de uma demanda judicial, ação de indenização por danos morais. Alias,
o Poder Judiciário já analisou e julgou casos práticos neste sentido, afirmando
que assiste com razão na promoção de uma indenização por danos morais. Vejamos:
Data de
publicação: 08/06/2012
Ementa: AGRAVO DE
INSTRUMENTO. AÇÃO ORDINÁRIA. TUTELA ANTECIPADA. SUSTAÇÃO DOS EFEITOS DO PROTESTO. CHEQUE PRESCRITO. Aponte
a protesto de cheque prescrito. Expirado
o lapso temporal para a apresentação previsto na lei de regência, com a
caracterização da prescrição do cheque, o aponte da cártula
reveste-se de ilegalidade e abusividade.
Precedentes jurisprudenciais. Agravo provido. (Agravo de Instrumento Nº
70047900014, Décima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator:
Bayard Ney de Freitas Barcellos, Julgado em 30/05/2012)”
Data de
publicação: 23/11/2012
Ementa: APELAÇÃO
CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. INDENIZATÓRIA POR DANOS MORAIS C/C CANCELAMENTO
DE PROTESTO DE CHEQUE PRESCRITO. ABUSO
DE DIREITO CONFIGURADO. DANOS MORAIS. QUANTUM INDENIZATÓRIO. MAJORAÇÃO. CONSECTÁRIOS.
1. O protesto de cheque prescrito constitui
ato ilícito, caracterizando-se tal ato
como abuso de direito. O credor possui outros métodos (tais como ação
monitória e de cobrança) para satisfazer o seu crédito. 2. Caracterizado o ato
ilícito, procede o dever de indenizar, eis que o presente caso trata-se de dano
in re ipsa.
Outra caso semelhante pode ser reproduzido pelo
Superior Tribunal de Justiça:
“0021076-93.2010.8.19.0206
- APELACAO - 2ª Ementa
DES. NAGIB
SLAIBI - Julgamento: 07/11/2012 - SEXTA CAMARA CIVEL
Direito
Bancário. Protesto de cheque prescrito.
Abuso de direito. Dano moral "in re ipsa".
Reforma da sentença para condenar a apelada ao pagamento de indenização por
danos morais arbitrada em R$ 8.000,00 (oito mil reais). Um dos efeitos do
protesto é interromper a prescrição, tornando-se o título exigível. Se quando o
protesto foi realizado até a ação pessoal para a cobrança do crédito
consubstanciado no título já havia sido fulminada pela prescrição, não há como
deixar de reconhecer o seu caráter abusivo. Embargos de Declaração. Pretensão
de se atribuir efeitos infringentes. Descabimento. "[.] A atribuição de
efeitos infringentes é possível apenas em situações excepcionais, em que sanada
a omissão, contradição ou obscuridade, a alteração da decisão surja como
consequência necessária. [.]."
EDcl no Ag
1296400/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em
12/06/2012, DJe 20/06/2012) Rejeição.
Por fim, evidentemente, pode traçar
pontos cruciais no que pertine ao direito de cobrar e os seus exatos limites
legais relacionado ao cheque, assim, extrapolando tais limitativos temporais
previstos nas legislações pátrias, não resta alternativa em pedir a tutela do
Estado para reparar aquele que causou dano, como no caso, abusou o seu direito
de cobrar.
O pensamento mecânico é falho, e isso
precisa ser sanado. Pensar antes de agir é a melhor solução.
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